
Após cinco anos sem demarcações, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) homologou seis terras indígenas nesta sexta-feira (28). O presidente, junto à ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, participou do encerramento do Acampamento Terra Livre, mobilização que congrega desde 2004 representantes de todo o país dos povos originários na luta por seus direitos.
As áreas estão localizadas nos estados do Acre, Amazonas, Alagoas, Ceará, Rio Grande do Sul e Goiás. Foram homologadas as seguintes áreas:
- TI Arara do Rio Amônia (AC) – população de 434 pessoas e portaria declaratória do ano de 2009;
- TI Kariri-Xocó (AL) – população de 2.300 pessoas e portaria declaratória de 2006;
- TI Rio dos Índios (RS) – população de 143 pessoas e portaria declaratória de 2004;
- TI Tremembé da Barra do Mundaú (CE) – população de 580 pessoas e portaria declaratória de 2015;
- TI Uneiuxi (AM) – população de 249 pessoas e portaria declaratória de 2006; e
- TI Avá-Canoeiro (GO) – população de 9 pessoas e portaria declaratória do ano de 1996.
“Vamos legalizar as terras indígenas. É um processo um pouco demorado. A gente vai ter que trabalhar muito para que a gente possa fazer a demarcação do maior número de terras indígenas possível”, disse Lula durante discurso no evento. Desde 2018 o Brasil não homologava terras indígenas.
“Não só porque é um direito de vocês, mas porque se a gente quiser chegar em 2030 como o desmatamento zero na Amazônia a gente vai precisar de vocês como guardiões da floresta.” O presidente acrescentou: “Antes dos portugueses, vocês ocupavam 100% das terras brasileiras.”
Lula disse que pretende “não deixar nenhuma terra indígena que não seja demarcada” em seu mandato de quatro anos.
“O que queremos é que, ao terminar nosso mandato, os indígenas brasileiros estejam sendo respeitados e tratados com toda a dignidade que todo ser humano merece. É importante ter consciência de que os indígenas não devem favor a nenhum outro povo”, ressaltou Lula.
Na cerimônia, o presidente segurou uma faixa contra o marco temporal em terras indígenas. Na semana passada, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, disse que vai pautar para julgamento o processo sobre o assunto no primeiro semestre de 2023.
A tese, defendida por ruralistas, determina que a demarcação de uma terra indígena só pode acontecer se for comprovado que os indígenas estavam sobre o espaço requerido em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da atual Constituição.
O governo assinou, ainda, dois decretos, um que recriou o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e outro que instituiu o Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI).
Lula também fez a liberação de R$ 12,3 milhões para a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) apoiar comunidades Yanomamis.
Os recursos serão utilizados para a compra de equipamentos, ferramentas e insumos para as casas de farinha.
A ideia é recuperar a capacidade produtiva desses locais onde a mandioca é transformada em farinha.

YANOMAMIS REFÉNS DE GARIMPEIROS
As violações dos direitos humanos que geraram a crise humanitária envolvendo os Yanomami em Rondônia, denunciadas durante o primeiro mês do governo Lula, vinham ocorrendo nos dois anos anteriores.
Em fevereiro, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e seu escritório no Brasil, a Relatoria Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Redesca) cobraram providências do Estado ao criticar a omissão de autoridades do governo Jair Bolsonaro (PL) que ignoraram a “situação de violência” enfrentada pelos indígenas.
“Eu jamais imaginei que existisse um governo que deixasse crianças e pessoas adultas chegarem àquelas condições, que quase não podiam levantar de fome, por falta de comida em um país que é o terceiro maior produtor de alimentos do mundo. A verdade é que aquele povo estava no esquecimento, aquele povo estava refém de garimpeiros”, acrescentou o presidente.
O presidente ainda disse que “não podemos deixar repetir o que aconteceu com a terra, com os Yanomami, lá no estado de Roraima”, e destacou que os indígenas devem cobrar o governo federal na questão da saúde.
PLANO DE CARREIRA
Durante o evento, Lula prometeu que o governo vai trabalhar para um plano de carreira para os servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI). A ministra Sonia Guajajara tem trabalhado para a publicação de uma medida provisória sobre o assunto até agosto.
“A mais interessada no plano de carreira hoje é a presidenta da Fundação Nacional dos Indígenas (Funai), porque ela sabe de como é baixo o pagamento das pessoas. Nós queremos recuperar porque trabalhar na Funai é tão importante quanto trabalhar em qualquer outra repartição pública desse país. Nós não queremos que os trabalhadores da Funai sejam tratados como se fossem de segunda categoria”, falou Lula.
A ministra Sônia Guajajara afirmou que os povos indígenas vão escrever uma nova história. Como ela diz, a luta do bem viver em favor de toda a humanidade. “Nunca mais haverá um Brasil sem nós”, disse a ministra.
Segundo ela, nos últimos anos os povos indígenas sofreram as consequências de uma política voltada à negação dos povos indígenas e de institucionalização do genocídio, com intensificação dos ataques, perseguição, criminalização de direitos e desmantelamento de estruturas da Funai e da Sesai, inviabilizando o acesso a serviços de saúde. Segundo ela, o resultado foi o aumento do número de invasões, ameaças, mortes, doenças e violências.
“Nós representamos somente 5% da população mundial, mas protegemos 82% da biodiversidade do mundo. Então, eu quero junto com o presidente Lula reassumir e reafirmar o compromisso de avançarmos juntos nesse governo na demarcação e proteção dos povos indígenas para mudar aquela realidade de destruição’.
DECRETOS
Lula assinou também outros dois decretos para recriar o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e instituir o Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI), com objetivo de promover e garantir a proteção, recuperação, conservação e o uso sustentável dos recursos naturais nos territórios indígenas
O ministro Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome) assinou portaria liberando R$ 12,3 milhões à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) para a aquisição de insumos, ferramentas e equipamentos para as casas de farinha, recuperando a capacidade produtiva de comunidades Yanomami.
Falando em sua língua original, o cacique Raoni também enfatizou a necessidade de homologação das terras e de fortalecimento da Funai e da Sesai. Coordenador da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste de Minas Gerais e Espírito Santo, Paulo Tupiniquim avalia que o governo Lula já registrou avanços importantes.
Ele cita o cumprimento da promessa de um ministério exclusivo e a presença de indígenas na gestão do ministério e em demais órgãos importantes, como Funai e Sesai, como exemplos do comprometimento do governo Lula com os povos originários. A ação do governo logo nos primeiros dias de gestão para conter a crise humanitária pela qual passavam os yanomamis é outro sinal de novos tempos, segundo ele.
“O governo passado abriu as portas para madeireiros e garimpeiros e colocou os Yanomami em uma crise humanitária. O compromisso desse governo começa a se desenhar a partir daí, com o reconhecimento da situação e com as ações para retirada de madeireiros e garimpeiros das terras Yanomami. Já estamos começando a avançar. Acredito que possamos avançar muito mais”.
Tupiniquim afirma ser preciso criar um plano fazer regularização fundiária com demarcação de mais terras indígenas como forma de conter a criminalização e a violência. “Só vai parar quando tiver território demarcado, homologado e protegidos”.
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