Em seminário promovido pelo Cofecon sobre o novo arcabouço fiscal, economista criticou a taxa de juro absurda do BC e o limite aos investimentos públicos
O economista Eduardo Moreira afirmou que a proposta do arcabouço fiscal que tramita no Congresso Nacional, por iniciativa do governo federal, é um avanço em relação ao teto de gasto mas “um limitador de crescimento”. “O arcabouço fiscal condena a gente a não poder crescer muito”, afirmou o fundador do Instituto Conhecimento Liberta, no seminário “Novo Arcabouço Fiscal: Possibilidades e Limites para o Desenvolvimento Sustentável”, realizado no dia 25 de abril, pelo Conselho Federal de Economia (Cofecon).
“O teto de gastos era uma excrescência que não existe em nenhum outro lugar, mas também nos condenava à impossibilidade de crescer. Num país como o nosso, onde o número de pessoas que não têm emprego, o numero de pessoas que passam fome, não para de crescer, isso aconteceu de forma vertiginosa durante a pandemia, ser condenado a impossibilidade de crescer é algo muito sério”, criticou.
De acordo com o Cofecon, um dos temas tratados nos diversos painéis do seminário que reuniu especialistas e representantes do governo, foi “o limite de 2,5% do aumento anual de despesas como algo que também limita o crescimento público e os conceitos de responsabilidade fiscal. Não como o assunto normalmente é tratado, mas sim em relação ao cumprimento da função do governo em relação às parcelas mais vulneráveis da população e que mais dependem das políticas públicas”.
Eduardo Moreira questionou sobre quem se beneficia deste limite de 2,5%. “Alguém tem que estar se beneficiando para justificar esta nova regra que nos joga no mesmo problema de não poder crescer muito”, argumentou. “Suponhamos que a taxa de juros caia e consigamos uma economia de 250 bilhões de reais em relação ao que temos hoje. Nada disso poderá ser usado para fazer a economia crescer, nada disso poderá virar investimentos”, afirmou.
“Mesmo que as receitas cresçam muito, deveria ter esse limitador?, questionou o economista. Para quem que a gente está dando esse limitador? Dado que já tem ali o 70% em relação a variação das receitas para os gastos . Quem é que está precisando desse 2,5%? É o mercado que está pedindo? É a Faria Lima que está pedindo? Alguém tem que estar exigindo, alguém tem que estar pleiteando, alguém tem que estar se beneficiando desses 2,5% para que a gente esteja condenado a não poder crescer muito”, destacou.
O economista avaliou que mais uma vez os investimentos do Estado estão sendo limitados para dar garantias ao mercado.
“Essa lógica de que a gente vai fazer isso, ancorando as expectativas do Banco Central de que pode cair os juros, caindo juros facilita o crédito, além de facilitar o crédito diminui a percepção de risco no país, isso atrai investimento de fora, isso aumenta a oferta de emprego, aumenta a massa salarial e isso vai poder fazer, enfim, a economia se retro alimentar e a gente entra no ciclo virtuoso… Essa é a história que eu ouço desde 1997, quando eu entrei no Banco Pactual, e é uma aposta que você faz muito grande no setor privado. Ou seja, o Estado ali, como aquele que diminui a percepção de risco, e que cria as condições para o mercado privado poder prosperar, mas uma aposta que quando a gente resolveu levar ao extremo e criar um teto que daria todas as garantias que o mercado queria, a gente viu que ela serviu como um freio enorme para nossa economia”, alertou o economista.
TAXA DE JURO É ABSURDA
Eduardo Moreira criticou as elevadas taxas de juros impostas pelo Banco Central. “Eu acho engraçado a gente estar fazendo todo este questionamento sobre a questão do arcabouço fiscal que preocupa tanto, que vai garantir que não se gaste tanto, enfim, que não vão explodir os gastos públicos, e a gente não tem seminário para discutir a nossa taxa de juros. Não faltam opiniões qualificadas falando que a nossa taxa de juros é um absurda. Ela é uma excrescência, é um ponto fora da curva em relação aos nossos pares, em relação aos ‘peers’ que o Brasil tem no resto do mundo”, disse lembrando o seminário organizado pelo BNDES que trouxe ao Brasil, entre outros, o Nobel de Economia Joseph Stiglitz. Na oportunidade ele declarou que a taxa “Selic a 13,75% é pena de morte”.
Ironizando, Eduardo Moreira, disse que mesmo que se faça a “lição de casa”, não está garantido que a arrecadação acima do esperado seja destinada a investimentos.
“Vamos supor que a gente faça a ‘lição de casa’ que o Banco Central outorgou como responsabilidade para gente fazer: rever a desoneração dos combustíveis, o arcabouço fiscal, a gente fazer isto e aquilo… e o Banco Central caia os juros em 4%, 5% nesse ciclo. Estamos falando de R$ 200, R$ 250 bilhões de dinheiro a menos que nós vamos gastar e ninguém questiona se isso vai poder virar investimentos, porque a gente só fala em superávit primário – uma regra que se criou que também existe em poucos lugares do mundo”, frisou Moreira. “Se criou no Brasil o seguinte: o dinheiro que a gente tem que pagar para os investidores dos nossos títulos públicos, que eu gosto de repetir mesmo, para Faria Lima, ele é mais importante do que o resto, vamos resolver o primário porque nosso objetivo é pagar juros”, criticou o economista.
“A dúvida é o seguinte: se a gente crescer mais do que o esperado, se a gente tiver uma arrecadação muito acima do esperado, a gente está aqui conseguindo um espacinho para poder crescer mais do que 2,5%, aqui o nosso gasto real, o nosso teto de gasto real. E se a gente cair 5% da taxa de juros, se a gente tiver uma economia de R$ 250 bilhões por ano em relação ao que a gente tem hoje, nada disso pode ser usado para a gente crescer? Nada disso pode ser usado para investimento?, questionou Eduardo Moreira.
“Eu acho que a gente tem um problema. Eu não sei com todas essas amarras, com todas essas limitações, e vejam que aqui, não tem ingenuidade de imaginar que seja fácil.. ‘ah, então bota de dois e meio para cinco’. Tem que combinar com todo mundo. Tem que combinar com o Congresso, tem que combinar com a Frente Ampla, tem que combinar com os empresários. Então, ninguém aqui está falando que é fácil, mas o ponto é que com este arcabouço o que a gente tem hoje, eu acho que é muito difícil a gente imaginar um crescimento de quatro, cinco; isso fica parecendo que a gente está falando de uma maluquice, mas a média de crescimento nos governos Lula foi essa, acima de 4%, um pouco acima de 4%. E isso me parece uma impossibilidade com esse arcabouço”.
“A pergunta que eu me faço é a seguinte, com esse país da forma como está, será que politicamente isso é viável? Se a gente crescer 1,5%, 2% nos próximos anos a gente deixa todo mundo tranquilo? A situação de risco parece controlada? Na verdade não está, porque se politicamente não está, o risco não está controlado. Será que isso é viável? Será que é viável a gente imaginar um projeto de país, um projeto de poder que dure décadas começando, assim, num país que está dividido meio a meio e sem poder aproveitar algum soluço de crescimento que a gente venha ter, e se a gente tiver soluço de crescimento grande a gente vai ter que puxar o freio, porque essa regra coloca algum freio”, alertou o economista Eduardo Moreira.
“Condenados a não poder crescer muito, não só a gente coloca em risco pessoas que não podem esperar, mas coloca principalmente em risco a possibilidade de poder viver longe desses fascistas e desse representante da extrema direita”, afirmou.