Dois grupos, um árabe e outro americano, estão de olho na empresa brasileira. Petrobrás, dona de 47% das ações da empresa, resiste a mais essa torra criminosa do patrimônio nacional
O Brasil está diante da ameaça de desnacionalização de sua maior empresa petroquímica e uma das maiores do mundo no setor, a Braskem. A empresa é símbolo da consolidação do processo de industrialização do país. A Petrobrás é dona de 47% do capital votante da empresa e de 36,1% de seu capital social. A Novonor, grupo privado nacional, possui 50,1% do capital votante e 38,3% do capital social da empresa.
GIGANTE PETROQUÍMICA
Criada em 2002, a partir da integração das empresas Copene, OPP, Trikem, Proppet, Nitrocarbono e Polialden, a companhia se transformou em uma das maiores petroquímicas do mundo. A Braskem conta com unidades industriais no Brasil (petroquímicos básicos – uso de nafta ou gás como matéria-prima de produção de eteno e co-produtos; poliolefinas – uso de eteno e propeno para produção de PE e PP; e vinílicos – uso de cloro-soda e eteno para produção de PVC), EUA, Alemanha e México.
A empresa brasileira é uma associação entre a estatal de petróleo do país, a Petrobrás, hoje grande produtora de petróleo e o grupo privado nacional de engenharia fundado por Norberto Odebrecht. Ela é líder em produção de resinas termoplásticas (PE [polietileno], PP [prolipopileno] e PVC) e biopolímeros de PE a partir de matéria-prima renovável. A companhia também é a maior produtora de PP na América do Norte e lidera a produção de PE no México.
A Braskem confirmou ter recebido a oferta da gestora do fundo Apollo, dos EUA, e da Empresa Nacional de Petróleo de Abu Dhabi, a ADNOC, por 100% das ações. A possível negociação, envolvendo a desnacionalização da empresa brasileira e sua entrega para um grupo árabe e outro americano (Adnoc e Apollo, respectivamente), vai contra o que vem defendendo o presidente Lula, que disse recentemente que o Brasil não estava interessado em vender suas empresas e, sim, atrair investimentos para novas empresas e novas plantas industriais.
DESNACIONALIZAÇÃO
Além da desnacionalização, o negócio, avaliado em R$ 37 bilhões, envolve o prosseguimento do processo de desinvestimento e enfraquecimento da Petrobrás, processo também bastante criticado pelo presidente Lula.
O grupo árabe que pretende se apoderar da Braskem é o mesmo que comprou a refinaria Landulpho Alves (RLAN), da Bahia, e que, além de vender combustíveis com os preços mais caros do país, está agora exigindo, junto ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), que a Petrobrás lhe venda petróleo a preços subsidiados. É também o mesmo grupo que presenteou Jair Bolsonaro e o seu entorno com joias milionárias, provocando mais um grande escândalo político no Brasil.
O presidente Lula se reuniu recentemente em Adu Dhabi, com representantes de fundos soberanos, incluindo o Mubadala, e também de outras empresas árabes. Esta foi uma das ocasiões em que o presidente destacou que o país não estava mais interessado em transferir seus ativos prontos para grupos estrangeiros.
Ele defendeu que os investidores seriam muito bem vindos ao Brasil para abrir coisas novas e não para adquirir empresas prontas. Ao que parece, com a oferta do Mubadala para a compra da Braskem, uma empresa já em pleno funcionamento e altamente lucrativa, as ponderações do presidente Lula não foram levadas em consideração pelos “investidores” árabes.
LULA NÃO QUER MAIS VENDA DE EMPRESAS
A negociação, hora em curso, com os grupos árabe e americano não tem a menor sintonia com as novas propostas do governo Lula de interromper a queima da ativos da Petrobrás e de promover o fortalecimento da indústria brasileira, que vem sendo fortemente destruída nos últimos anos.
Tanto isso é verdade que a direção da petroleira nacional está resistindo a se desfazer de sua participação na empresa petroquímica. A Petrobrás estuda até, em caso do negócio prosseguir, em trocar suas ações da Braskem por ações na refinaria da Bahia, que foi vendida por Bolsonaro aos árabes.
A proposta de troca de ações é uma forma da Petrobrás resistir a seguir se desfazendo de seus ativos. Essa posição segue a avaliação do atual presidente da companhia, Jean Paul Prates, que desde que assumiu o cargo afirma que não faz sentido vender ativos, chegando a dizer que poderia comprar mais participação na Braskem.
De olho em ganhos fáceis, especuladores já pressionam as ações da Braskem. Desde o anúncio do pedido de registro da oferta de ações, em 14 de janeiro, os papéis da petroquímica caíram mais de 10%. No mesmo período, o Ibovespa acumulou uma valorização de 7%. Se confirmada a venda da Braskem, seria a quarta maior fusão e aquisição (M&A, em inglês) no mundo este ano.
MAIOR NEGOCIATA EM CURSO
A proposta feita pelos grupos estrangeiros pelo controle da Braskem seria de R$ 47 por ação, sendo:
1) R$ 20 por ação pagos em dinheiro;
2) R$ 20 por ação pagos com debêntures perpétuas emitidas pelos veículos adquirentes, com taxa de 4% ao ano;
3) R$ 7 por ação com o pagamento diferido na forma de “warrant” (título de garantia emitido pelo vendedor de uma commodity).
A Novonor – sócia da Petrobrás – reitera que a oferta encontra-se sob sua avaliação e ressalta que não há qualquer decisão, mesmo que preliminar, tomada a seu respeito”, em resposta à Braskem, que recebeu questionamentos da CVM sobre a falta de informações sobre o processo.
Segundo a Novonor, a proposta não vinculante depende de avaliação e negociação com a Petrobrás e sua efetivação está sujeita ao cumprimento de determinadas condições usuais para este tipo de operação – como um processo de due diligence. “Por fim, a Braskem reforça que não conduz eventuais negociações de seus Acionistas Novonor e Petrobras sobre a venda de suas participações acionárias”.
PETROBRÁS NO CONTROLE
As saídas possíveis, segundo analistas seriam, primeiro, a compra do controle da Braskem pela Petrobrás. Ao comprar a participação da Novonor, a Petrobrás controlaria integralmente a Braskem, evitando vender o controle da empresa para um player financeiro internacional. A estatal poderia traçar seus planos para a petroquímica, que provavelmente envolveria mais investimentos do que dividendos.
Ou, uma segunda possibilidade aventada, a associação da Petrobras com grupos interessados. A Petrobrás tem se mostrado disposta a formar parcerias com players internacionais em diversos setores, como eólica offshore e hidrogênio. Com a parceria com a ADNOC e a Apollo, a empresa pode ganhar muita experiência de players que sabem operar crackers à base de gás e ajudar a desenvolver o mercado de gás natural do Brasil, aumentando a demanda.
SÉRGIO CRUZ