(HP 09/09/2003)
A “Operação Northwoods” foi um plano feito pela NSA (National Security Agency), sob pedido da Junta de Chefes de Estado Maior dos EUA, aprovado pelo Conselho de Segurança Nacional e pelo então Secretário da Defesa, Robert Mcnamara, um funcionário do grupo Rockefeller. Como escreveu James Bamford, que em 2.001, depois de vasculhar documentos do Pentágono que, devido à lei, tinham deixado de ser secretos, revelou o plano em seu livro “Body of Secrets” – um minucioso estudo de 750 páginas sobre as atividades da NSA desde a sua fundação, em 1952 – a “Operação Northwoods” incluía “o afundamento de navios norte-americanos, a queda de aviões em cima de cidades, incluindo Miami, Atlanta e Washington, com a morte de civis, e, inclusive, a destruição, depois do lançamento, do foguete que levaria o astronauta John Glenn, com o horror de sua explosão e a morte do astronauta imputadas, como um ato de terror de Estado, a Cuba. Não eram os delirantes sonhos de um marginal. Eram planos de Estado minuciosamente preparados, aprovados pelas mais altas autoridades militares e de inteligência, e apresentados como uma reivindicação ao secretário da Defesa, Robert McNamara, e ao presidente Kennedy”.
JOHN GLENN
John Glenn foi o primeiro americano que entrou em órbita em torno da Terra. Nessa época, a URSS já tinha lançado ao espaço, em voos orbitais, uns três ou quatro cosmonautas. Glenn, além disso, tinha sido um dos poucos pilotos de aviões de caça que conseguira algum sucesso durante a agressão à Coreia, em confronto com os pilotos coreanos e chineses que pilotavam os primeiros jatos MIG – aviões soviéticos que eram incomparáveis em relação aos americanos. Glenn, era, também, como até hoje, senador, republicano. Em suma, o tipo do homem que a direita americana adorava promover – e promoveu – como “herói americano”.
Pois, para agredir Cuba, a canalha que dominava – e domina – as agências de terrorismo, o aparato bélico e, sobretudo, político-econômico (Mcnamara era indicação de Nelson Rockefeller para o ministério de Kennedy) aprovou um plano para matar o seu herói. Segundo os documentos, a explosão do foguete de Glenn e sua morte teriam “o objetivo de fornecer prova irretorquível de que a falha foi devida aos comunistas e a toda [sic] Cuba”.
Em suma, em 1962, após o fracasso da invasão de Cuba organizada pela CIA, o Conselho de Segurança Nacional dos EUA, a Junta de Chefes de Estado Maior e a NSA (National Security Agency), prepararam uma operação com o codinome “Northwoods”. O plano foi entregue ao Secretário da Defesa, Robert McNamara, em 13 de março de 1962 (ver fac-símile acima).
O patrono do plano de assassinatos foi o chefe da Junta de Chefes de Estado Maior, Lyman Lemnitzer, segundo o qual, “a conclusão de que uma revolta interna verossímil é impossível de acontecer durante os próximos 9-10 meses requererá uma decisão por parte dos EUA de desenvolver uma ‘provocação’ cubana como justificação de uma positiva ação militar dos EUA” (Memorando interno de 7 de março de 1962). Outro colega de Lemnitzer, George Anderson Jr., forneceu subsídios para o crime, em outro memorando, “Casos com o objetivo de provocar ações militares em Cuba”.
VETO DE KENNEDY
Resumidamente, é uma coisa de canalhas, de assassinos. De psicopatas. Aliás, durante décadas, a casta ianque e seus porta-vozes sempre repetiram que as denúncias de provocação eram coisa de comunistas. Mas é precisamente essa palavra, com todas as letras, a que eles usam, em seus documentos secretos, para suas ações. Assim como as palavras “terrorismo” e “terror”. A “Operação Northwoods” só não foi realizada porque Kennedy se opôs, pediu “cenários alternativos” e, alguns meses depois, transferiu Lemnitzer (nomeado por Eisenhower) para outra função. No entanto, ressalta Bamford, o plano continuou em cogitação até o fim de 1963. Kennedy, que chegara a um acordo com a URSS em torno de não invadir Cuba, foi assassinado em novembro de 1963 – depois disso, começou a agressão ao Vietnã.
“… a Junta de Chefes de Estado Maior indica uma breve mas precisa descrição dos pretextos que eles consideram que forneceriam uma justificação para a intervenção militar dos EUA em Cuba”, assim começa o plano (página 5 do memorando ao Secretário da Defesa, que tem o título de “Justificação para Intervenção Militar dos EUA em Cuba”). “As ações são baseadas na premissa de que a intervenção militar dos EUA resultará de (….) que os EUA estejam na posição de nutrir justificáveis ressentimentos. A opinião mundial, e o forum da ONU, devem ser favoravelmente afetados pelo desenvolvimento da imagem internacional do governo cubano como impulsivo e irresponsável, e como uma alarmante e imprevisível ameaça à paz do Hemisfério Ocidental”.
PROVOCAÇÃO E EMBUSTE
Para mostrar que o governo cubano era irracional, a Operação Northwoods preconizava assassinatos e outros atos de terrorismo: “uma vez que pareceria desejável usar legítima provocação como base para a intervenção militar em Cuba”, era preciso realizar “um plano encoberto e de embuste [deception]” (página 10, Apêndice ao Anexo A – os grifos são nossos).
A lista das ações incluía: “explodir munição dentro da base [de Guantánamo]”; “sabotagem de navios [americanos]”, e “afundar navio perto da entrada da baía de Guantánamo”, com a recomendação de que o funeral das vítimas deveria contar com não menos que 10 delas (página 11, item 1-a/subitem 11).
Não se contentando com uma lista sumária dos crimes a serem perpetrados, o plano faz algumas sugestões responsáveis e serenas:
“Nós poderíamos explodir um navio dos EUA e culpar Cuba. (….) A lista de vítimas nos jornais americanos deveria causar uma útil onda de indignação nacional (item 3-a e 3-b).
“Nós poderíamos desenvolver uma campanha de terror Comunista Cubano na área de Miami, em outras cidades da Flórida e mesmo em Washington. A campanha de terror deve ser dirigida contra os cubanos refugiados que moram nos EUA. Nós poderíamos afundar um barco lotado de cubanos em rota para Miami (real ou simulado). Nós poderíamos fomentar atentados contra vidas de cubanos refugiados nos EUA para apresentar a extensão dos ferimentos para ser intensamente divulgados. Explodir umas poucas bombas plásticas em alvos cuidadosamente escolhidos, prender agentes cubanos e vazar documentos preparados para envolver Cuba, também deveriam ser úteis em projetar a ideia de um governo irresponsável” (item 4).
“Um ato de pirataria ‘baseado em Cuba, apoiado por Castro’ deve ser simulado contra uma vizinha nação do Caribe. Estes esforços podem ser amplificados e outros inventados para exibição” (item 5).
“O uso de aviões tipo MIG por pilotos dos EUA deve fornecer uma provocação adicional. O assédio da aviação civil, ataques contra navios de superfície e destruição de aviões militares dos EUA por MIGs, devem ser usados como ações complementares” (item 6).
“Tentativas de sequestro contra a aviação civil e barcos devem parecer como continuação das medidas de assédio coordenadas pelo governo de Cuba” (item 7).
“É possível criar um incidente que demonstrará convincentemente que uma aeronave cubana atacou e derrubou um avião de turismo em rota dos EUA para a Jamaica, Guatemala, Panamá ou Venezuela. Os passageiros podem ser um grupo de universitários em férias ou um grupo de pessoas com um comum interesse de alugar um voo charter” (item 8). Em seguida, o plano se estende sobre a forma de como fazer isso… sem matar ninguém. As medidas cheiram à camuflagem do crime, talvez tendo em vista o leitor final ao qual o plano estava destinado – o presidente Kennedy. Pelo que está no plano, isso requereria que todos os estudantes que lotariam o avião, e que passariam por mortos, teriam que estar mancomunados com os terroristas. Mesmo que isso fosse fácil, como garantir que um deles não seria localizado, ou não contasse a história? E seus familiares e amigos, que saberiam que eles não estavam mortos? Para evitar o inconveniente, só haveria uma solução: estarem eles realmente mortos.
MIGS CONTRA ALVOS DOS EUA
“É possível criar um incidente que fará acreditar que os MIGs comunistas cubanos destruíram uma aeronave da Força Aérea dos EUA”. (item 9). Segue outra longa explicação sobre como ninguém morreria. Aqui, o que é suspeito é que, para isso, não seria preciso em nada o rocambolesco roteiro que consta do plano.
O plano, elaborado pela NSA, foi assinado por cada um dos membros da Junta de Chefes de Estado Maior, levado ao Conselho de Segurança Nacional, que o aprovou e, depois, a McNamara, que também o aprovou. Somente Kennedy, da forma que pôde, o barrou.
CARLOS LOPES