Flávio Dino, que destroçou os bolsonaristas em audiências nas comissões da Câmara, recentemente, é um dos depoimentos mais aguardados para denunciar os golpistas de 8 de janeiro
Deputados e senadores membros da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Golpe do dia 8 de janeiro apresentaram requerimentos para depoimentos do ministro da Justiça, Flávio Dino, de Jair Bolsonaro e de seus aliados Mauro Cid, Anderson Torres e Augusto Heleno.
Ao todo, a CPMI já conta com 467 requerimentos de diversos tipos e cerca de 50 pedidos de quebra de sigilos.
Os mais citados são Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, então secretário de Segurança Pública do DF no dia da tentativa de golpe, Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e o senador Flávio Bolsonaro, o filho ’01’.
Anderson Torres viajou para os Estados Unidos antes do ataque em Brasília e deixou a Secretaria de Segurança Pública totalmente despreparada para enfrentar uma tentativa de golpe. Ele foi preso por cooperar com os golpistas.
Em sua casa, a PF encontrou a minuta golpista de um decreto presidencial que rejeitaria o resultado das eleições para manter Jair Bolsonaro no poder. O documento estava guardado dentro de uma pasta do governo federal, em um armário.
Além disso, o bolsonarista usou a Polícia Rodoviária Federal (PRF) para realizar blitze no dia do segundo turno das eleições visando atrapalhar eleitores de Lula. Ele ordenou que fosse produzido um mapeamento com as cidades onde Lula teve mais votos no primeiro turno.
Mauro Cid, que foi ajudante de ordens de Jair durante todo o governo, foi flagrado trocando mensagens com aliados sobre planos para impedir a posse de Lula e manter Jair no poder.
O general Augusto Heleno, que chefiou o Gabinete de Segurança Institucional (CGI) de 2019 a 2022, também é alvo de alguns requerimentos. Pessoas indicadas por ele foram filmadas pelas câmeras de segurança do Palácio do Planalto conversando e até dando água para os invasores, no dia 8 de janeiro.
BOLSONARO
O ex-presidente Jair Bolsonaro é alvo de um requerimento de convite apresentado pelo deputado Rogério Correia (PT-MG), que cita diversos casos em que Jair Bolsonaro mentiu sobre o processo eleitoral para atacar a democracia brasileira.
Correia argumentou que os apoiadores de Jair, “alimentados por uma rede de fake news e pelo próprio” ex-presidente, começaram os acampamentos golpistas, em novembro de 2022, “reivindicando a intervenção militar” para não deixar Lula tomar posse.
“Bolsonaro é o principal suspeito, neste caso. É fundamental essa análise da participação do ex-presidente como autor intelectual ou mandante do processo golpista no Brasil”, disse o deputado.
Outros requerimentos podem ser apresentados com o avançar das investigações e o depoimento de pessoas próximas ao ex-presidente.
FLÁVIO DINO
O ministro da Justiça do governo Lula, Flávio Dino, aparece nos requerimentos de diversos parlamentares bolsonaristas para prestar depoimento. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) pediu até mesmo a quebra dos sigilos telefônico e telemático de Dino.
Os parlamentares da oposição estão tentando usar a Comissão para reforçar a teoria absurda da conspiração de que o governo Lula seria responsável pela invasão dos prédios públicos, tendo se omitido de defendê-los no dia 8 de janeiro.
Essa teoria surgiu como tentativa de limpar a barra de todos aqueles que organizaram e incitaram, durante anos, um levante contra a democracia – como o ex-presidente Jair Bolsonaro -, mudando o foco da investigação.
Ao mesmo tempo em que pedem seu depoimento, os bolsonaristas se arrependem de terem convidado Flávio Dino para ir a comissões no Congresso Nacional, devido à grande repercussão favorável ao ministro.
Em uma reunião da Comissão de Constituição e Justiça, diversos deputados bolsonaristas tentaram enquadrá-lo, levantando fatos desconexos sobre o dia 8 de janeiro e outros casos para acusar o ministro de diferentes crimes.
O próprio deputado Marco Feliciano (PL-SP), autor de um requerimento, admitiu que foi “um passeio” de Flávio Dino. “O Flávio Dino fez um passeio na CCJ [Comissão de Constituição e Justiça], ele engoliu uns 10 deputados lá. Foi um episódio horrível para nós que somos oposição”, disse em um podcast. Feliciano falou que eles ficaram “com vergonha”.
Nesta mesma reunião, o senador bolsonarista Marcos do Val, que se apresenta como instrutor da Swat, polícia dos Estados Unidos, mostrou um vídeo e pediu a prisão de Flávio Dino.
O ministro ironizou: “Se o senhor é da Swat, eu sou dos Vingadores. O senhor conhece o Capitão América? O Homem-Aranha?”.
CPMI VAI APURAR ATENTADOS ANTERIORES
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), quer começar a investigação pelos atentados terroristas anteriores à tentativa de golpe do dia 8 de janeiro. Ela propôs que sejam feitas duas reuniões por semana.
A senadora pretende apurar os ataques do dia 12 de dezembro, quando bolsonaristas tentaram invadir a sede da Polícia Federal e colocaram fogo em carros e ônibus, e a tentativa de explosão de um caminhão-tanque no Aeroporto de Brasília, ocorrida no dia 24 de dezembro.
O primeiro caso foi feito por bolsonaristas acampados em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, que não aceitaram a prisão de um sujeito que estava pregando um golpe de Estado nas ruas de Brasília.
No caso da tentativa de explosão, a Justiça Federal já condenou dois envolvidos. Alan Diego dos Santos Rodrigues, condenado a cinco anos e quatro meses de prisão, e George Washington de Oliveira Sousa, condenado a nove anos e quatro meses, planejaram a explosão para instaurar o “caos” a partir do qual seria dado um golpe de Estado.
O outro terrorista identificado, Wellington Macedo de Souza, que era assessor do Ministério da Mulher na gestão de Damares Alves, foi o responsável por instalar a bomba e teve seu processo desmembrado. Ele está foragido.
Os três se conheceram no acampamento em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília.
De acordo com a sentença, os bolsonaristas tinham como objetivo “cometer infrações penais que pudessem causar comoção social a fim de que houvesse intervenção militar e decretação de Estado de Sítio”.
George Washington, que morava no Pará, foi até Brasília carregando “diversas armas de fogo, os acessórios e as munições”, além de dinamites, com o objetivo de distribuir entre os que estavam no acampamento para “garantir distúrbios sociais e evitar a propagação do que ele denomina como comunismo”.
A explosão só não ocorreu porque o equipamento não foi instalado corretamente pelos terroristas. O caminhão-tanque estava carregado de sessenta e três mil litros de querosene de aviação.
O terrorista George Washington tinha escrito em seu celular uma mensagem destinada a Jair Bolsonaro, na qual reconheceu que foi o ex-presidente quem “despertou esse espírito” que o levou a planejar o atentado.
Jair Bolsonaro passou quatro anos na Presidência atacando o Supremo Tribunal Federal (STF), chegando ao ponto de dizer que não cumpriria decisões vindas de um ministro dessa Corte, e mentindo sobre o processo eleitoral e as urnas eletrônicas.
Depois que já tinha perdido as eleições, pediu para seus apoiadores agirem: “Não é eu autorizo não. É o que eu posso fazer pela minha pátria”.
“Eu autorizo” era o termo usado por seus apoiadores para indicar que apoiavam um golpe de Estado. Desta vez, Bolsonaro era que estava autorizando seus apoiadores a cometerem atentados antidemocráticos.