Um grupo de intelectuais, cientistas e ex-ministros de Estado, sindicalistas e lideranças da sociedade civil brasileira enviou uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para pedir que ele conceda, “da forma a mais ágil possível”, asilo político a Julian Assange. O jornalista australiano, fundador do WikiLeaks, está atualmente preso no Reino Unido.
“Concretamente, propomos que Vossa Excelência promova um esforço internacional junto a outros países – a começar pelos do Brics e do G20 – com vistas a obter a aceitação deste asilo político por parte do governo inglês”, diz trecho do documento. Os signatários do manifesto enfatizaram que o presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador intercedeu por Assange junto ao governo americano no ano passado.
Eles ressaltam que, se for extraditado para os EUA, Assange pode ser condenado a até 175 anos de prisão “por relevar fatos verdadeiros a respeito daquele país”.
“O governo brasileiro o faria diretamente ao Reino Unido, apoiado por personalidades mundialmente reconhecidas como o Papa Francisco, o ator Leonardo Di Caprio, a cantora Anitta, o Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel, o compositor e escritor Chico Buarque de Holanda, jornalistas ganhadores do Prêmio Pulitzer como Seymour Hersh e outros”, prossegue o texto.
Os proponentes defendem que interceder por Assange reforça a posição “humanitária do governo brasileiro”. “Acreditamos que, independente do resultado, este esforço vigoroso em defesa de Assange contribuirá para marcar ainda mais a posição humanitária e progressista do governo brasileiro no mundo, como tem sido a nossa marca desde 1º de janeiro de 2023”, continua o documento.
O manifesto é assinado por 2.897 pessoas. Entre elas, o filósofo e ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro, também presidente da Sociedade Brasileira para o Progreso da Ciência (SBPC), o músico Jaques Morelenbaum, o neurocientista Sidarta Ribeiro e a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ). As centrais sindicais CUT, Força Sindical, CTB, UGT, NCST e CSB também endossam o documento.
Também assinam o texto, o fotógrafo Sebastião Salgado, o jornalista Juca Kfouri, os ex-ministros José Gomes Temporão (Saúde), Sérgio Machado Rezende (Ciência e Tecnologia) e Ana de Hollanda (Cultura). Hildegard Angel, do Instituto Zuzu Angel e Rosana Onocko Campos, presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) também são signatárias do manifesto.
LIBERDADE DE IMPRENSA
Em entrevista coletiva na quinta-feira (22), em Roma, durante visita às principais lideranças do Vaticano, o presidente Lula criticou pretensos defensores da liberdade de imprensa no mundo.
“Eu ando um pouco indignado com os defensores da liberdade de imprensa no mundo”, afirmou o presidente. “A gente tem o (Julian) Assange preso na Inglaterra porque denunciou ao mundo a espionagem americana. Agora vai ser mandado de volta aos Estados Unidos para quem sabe pegar prisão perpétua”.
[…] não vejo nenhuma manifestação da imprensa para defender a liberdade de imprensa. O nome disso é covardia, porque o que o Assange fez merece respeito de qualquer jornalista na face da Terra. Ele teve coragem de denunciar que os EUA faziam espionagem. Denunciou o que todo jornalista gostaria de denunciar se tivesse recebido a notícia como ele recebeu”, reiterou o presidente.
CORROSÃO DA DEMOCRACIA
Na última sexta-feira (23), a SBPC publicou uma seção especial no boletim informativo da entidade dedicada ao caso Julian Assange e a defesa da liberdade de imprensa nas democracias. “Longe de Assange merecer o tratamento que vilmente lhe tem sido imposto, é um herói de nosso tempo”, afirma a publicação.
O texto defende ainda que a liberdade de imprensa deve ser “um elemento não negociável de qualquer sociedade democrática”. “O fundamental deste debate, e deste embate, é que, independentemente de nossas opiniões pessoais sobre Julian Assange, a liberdade de imprensa deve ser um elemento não negociável de qualquer sociedade democrática”, prossegue o editorial.
Segundo a SBPC, incriminar jornalistas por divulgar assuntos de relevância pública é “condenar à corrosão os pilares da democracia”.
“Os jornalistas desempenham um papel crucial ao investigar e relatar informações de interesse público, mesmo quando isso pode ser desconfortável ou controverso para aqueles no poder. Criminalizar jornalistas ou veículos de imprensa por divulgar informações de interesse público sobre as ações políticas dos governos é condenar à corrosão os pilares da democracia”, completa o texto.
VEJA A ÍNTEGRA DO MANIFESTO:
Excelentíssimo Senhor Presidente Luiz Inácio Lula da Silva
Nós, abaixo assinados, cientistas, jornalistas, professores, sindicalistas, lideranças da sociedade civil e entidades, vimos solicitar, respeitosamente, seu apoio, providências legais e diplomáticas no sentido do Brasil conceder, da forma a mais ágil possível, asilo político ao jornalista Julian Assange, hoje preso no Reino Unido.
Diante dos fatos recentes envolvendo a extradição para os EUA – onde Assange poderá ser condenado a até 175 anos de prisão por revelar fatos verdadeiros a respeito daquele país – um conjunto de profissionais, lideranças da sociedade civil e entidades iniciaram um movimento via redes sociais visando construir uma saída humanitária para o caso, hoje acompanhado de perto por toda a comunidade internacional. Vale ressaltar que Assange ficou exilado na Embaixada do Equador em Londres por sete anos e depois de preso está há outros quatro numa penitenciária, totalizando 11 anos sem liberdade.
Concretamente, propomos que Vossa Excelência promova um esforço internacional junto a outros países – a começar pelos do Brics e do G20 – com vistas a obter a aceitação deste asilo político por parte do governo inglês. Na mesma linha da iniciativa do Presidente Obrador, do México, em 2022, que fez pedido semelhante ao governo estadunidense, o governo brasileiro o faria diretamente ao Reino Unido, apoiado por personalidades mundialmente reconhecidas como o Papa Francisco, o ator Leonardo Di Caprio, a cantora Anita, o Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel, o compositor e escritor Chico Buarque de Holanda, jornalistas ganhadores do Prêmio Pulitzer como Seymour Hersh e outros.
Acreditamos que, independente do resultado, este esforço vigoroso em defesa de Assange contribuirá para marcar ainda mais a posição humanitária e progressista do governo brasileiro no mundo, como tem sido a nossa marca desde 1º de janeiro de 2023.
Certos de que a sensibilidade política, o senso de Justiça e o humanismo que sempre marcaram sua atuação irá influenciar na sua decisão em relação a assunto de tamanha gravidade, nos despedimos atenciosamente.
São Paulo, 28 de junho de 2023