Responsabilizou, covardemente, subordinados por mapeamento de eleitores e ação da PRF no 2º turno da eleição presidencial, em depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CNDF)
O ex-ministro e ex-secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, alegou à CPI do DF que o intuito do boletim sobre os votos era ‘relacionar crimes eleitorais’
“Não fui eu [quem determinou o levantamento]. A inteligência [do Ministério da Justiça] tem como uma das funções fomentar discussão. Ali, naquele momento, nossa intenção era reprimir os crimes eleitorais, independente[mente] do partido”, disse Torres.
Mesmo diante de todos os fatos, evidências e provas, o ex-ministro e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Anderson Torres, repetiu na CPI dos Atos Antidemocráticos da CLDF (Câmara Legislativa do Distrito Federal) o que dissera na CPMI do Golpe do Congresso Nacional.
Na CPI do Congresso, Torres insistiu na ladainha que ninguém acredita, a de que os subordinados fizeram o que fizeram à revelia dos chefes. Como deu tudo errado e Lula foi eleito, então os responsáveis estão em processo de negação das responsabilidades e expiação velada para tentar se livrar das consequências dos crimes cometidos.
Torres, então, em depoimento na CPI do Golpe, responsabilizou pessoas subordinadas a ele pelo mapeamento de eleitores e pela atuação da PRF (Polícia Rodoviária Federal) no segundo turno da eleição de 2022.
A íntegra do depoimento do bolsonarista à PF (Polícia Federal), prestado na última terça-feira (8), foi revelada pela imprensa, nesta quinta-feira (10).
QUEM MANDA E QUEM OBEDECE
Segundo Torres, a iniciativa de mapear os locais onde Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL) receberam mais de 75% dos votos no primeiro turno partiu da delegada Marília Alencar, então diretora de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas, do Ministério da Justiça.
Ela sustenta, todavia, que o levantamento foi feito a pedido de Torres. E é absolutamente plausível essa sustentação, porque o chefe era ele, não ela.
Outro aspecto dessa patacoada bolsonarista é que eles achavam que iam ganhar de qualquer jeito e, por isso, tinham crença na impunidade, consequência da vitória do ex-presidente da República.
HISTÓRIA PARA BOI DORMIR
Ele alegou que o intuito do boletim sobre os votos era “relacionar crimes eleitorais”, mas afirmou não ter levado a informação adiante por “não entender que os dados eram indicativos” das irregularidades.
Essa versão, tudo indica fantasiosa, deve ter sido elaborada há tempos, pois ele teve tempo hábil de pensar no que dizer caso fosse convocado a depor na CPI do Golpe.
Torres declarou que a operação da PRF teria sido igual em todo o País – versão já ampla e materialmente desmontada -, mas levantamento do Ministério da Justiça aponta que a corporação fiscalizou 2.185 ônibus no Nordeste, onde Lula era favorito, contra 571 no Sudeste, entre 28 e 30 de outubro.
A propósito, o ex-diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques, está preso porque foram reveladas conversas, reunião e planejamento das ações ilícitas, e um dos seus coordenadores era exatamente Vasques.
CULPADOS SÃO OS OUTROS
Ao ser questionado pelos deputados sobre outros temas, Torres manteve o figurino: em suas respostas os culpados são os outros e nunca ele, que não tem responsabilidade por nada do que aconteceu.
Segundo ele, os atacantes do 8 de janeiro só conseguiram agir porque não houve o cumprimento do PAI – Protocolo de Ações Integradas, documento que determina um conjunto de ações das forças de segurança, elaborado enquanto ele ainda era secretário. “Por mais violento que fosse, por mais preparados que os manifestantes estivessem, se o PAI tivesse sido cumprido à risca, eu posso afirmar que o dia 8 não teria sido daquela forma”, disse. Não apontou quem não cumpriu o PAI.
Assim, a culpa pelo não cumprimento do PAI foi de outros e não dele que fugiu, antecipadamente, para os EUA e não deixou nada organizado para enfrentar os golpistas.
Também negou que tenha sido omisso, alegando que suas férias, iniciadas nas vésperas dos ataques, haviam sido programadas dois meses antes. E jogou a responsabilidade nas costas do delegado Fernando de Souza Oliveira, dizendo que Souza tinha total autonomia para atuar naquela situação.
“Se eu soubesse, nem teria viajado” afirmou em sua narrativa. Mas ele sabia, sim, do que estava sendo preparado. Por isso mesmo, se ausentou antes do dia 9 quando oficialmente entraria de férias. E foi por isso mesmo que o governador Ibaneis Rocha o demitiu na mesma tarde de 8 de janeiro em razão de sua omissão.
Sobre os acampamentos golpistas, jogou também nas costas do Exército o fato deles não terem sido desmontados antes. “O Exército nunca permitiu que se tomasse alguma medida com relação àquelas pessoas enquanto elas estavam ali acampadas”, disse.
O ex-ministro de Bolsonaro adotou a versão dos golpistas de que o problema foi o Ministério da Justiça e não as atrocidades dos criminosos bolsonaristas.
Segundo ele, se fosse ministro da Justiça, no dia 8, teria convocado a Força Nacional para reprimir os ataques. “Teria feito contato com o governador e colocar à disposição a Força Nacional”, destacou. Mas ele era o secretário de Segurança do DF e não acionou o Ministério da Justiça e muito menos a polícia do DF, pois, segundo informações do seu setor, estaria tudo dentro da “normalidade”.
O deputado Max Maciel (PSOL) criticou o fato de Anderson Torres não ter designado, de ofício, um substituto para o período em que estava de férias.
O deputado distrital Gabriel Magno (PT) criticou narrativas que, segundo ele, estão sendo criadas dizendo que haveria infiltrados em meio aos manifestantes no momento das invasões. “As declarações do ex-presidente da República foram responsáveis pela tentativa de um golpe de estado”, afirmou Magno.