“Respondemos à carta deles (União Europeia e franceses) colocando aquilo que deve ser parte do acordo e dizendo que não aceitamos que uma carta entre amigos tenha ameaça”, afirmou o presidente sobre novas exigências draconianas para o acordo com o Mercosul
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu à nova investida da União Europeia sobre o Mercosul, cujo acordo está para ser ratificado desde 2019 e se tornou inviável par ao Brasil e os países da região em razão das exigências europeias, especialmente dos franceses.
Lula falou neste sábado (26) sobre as novas imposições dos franceses que, segundo ele, “querem que você abra mão de tudo e não abrem mão de nada”.
“Respondemos à carta deles colocando aquilo que deve ser parte do acordo e dizendo que não aceitamos que uma carta entre amigos tenha ameaça. Estamos há 20 e poucos anos brigando por isso. Não é fácil negociar com os franceses, não é fácil. Eles querem que você abra mão de tudo e não abrem mão de nada. Eles valorizam o franguinho deles, o vinho deles”, afirmou o presidente.
A União Europeia (EU) recebeu do governo brasileiro uma resposta a essas exigências pelo qual o Brasil sugere um mecanismo chamado de “equilíbrio de concessões” pelo qual se os europeus decidirem proibir a importação de determinado produto que teve origem em uma área desmatada, eles terão de abrir seu mercado para outro item exportado pelo Brasil, ou perderão a vantagem concedida a bens de seu interesse.
A proibição, por exemplo, por parte da UE da importação de carne bovina teria como consequência a abertura adicional à carne de frango ou teria que renunciar à venda para o Brasil, com alíquotas menores, de produtos de seu interesse, como veículos automotores.
Por esse mecanismo, o governo brasileiro busca compensar os produtores nacionais prejudicados pela legislação aprovada pelo Parlamento Europeu que veta a importação de alimentos das áreas desmatadas até dezembro de 2020.
A contraproposta brasileira inclui a sugestão da UE suspender qualquer sanção comercial e assegurar a abertura a produtos oriundos do Brasil de forma sustentável, além de prever ajustes em compras governamentais com o mesmo tratamento a empresas nacionais e europeias em aquisições da União.
Consta no texto como um dos principais pontos a possibilidade do Brasil exigir compensações a empresas europeias habilitadas em licitações públicas, como investimentos e transferência de tecnologia, assim como a preferência de até 20% a empresas brasileiras de todos os portes: micro, pequenas, médias e grandes. Quanto maior o compromisso da empresa com o meio ambiente, maior seria esse percentual.
O Acordo de Associação Mercosul-União Europeia teve suas negociações concluídas em 28 de junho de 2019, e ainda dependente do processo de revisão, assinatura e ratificação.
CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E A GUERRA
Em sua entrevista à imprensa em Luanda (Angola), o presidente brasileiro também argumentou que boa parte dos conflitos mundiais tem a participação de algum país integrante do Conselho de Segurança da ONU e, em razão disso, sugeriu um reequilíbrio de forças, lembrando que o Brasil postula a condição de membro permanente.
Segundo Lula, o organismo é um fator de insegurança mundial por causa da política externa de seus próprios integrantes, submissa à dos EUA. Conforme avaliou, aquele que “deveria ser a segurança da paz e da tranquilidade, é o que faz a guerra sem conversar com ninguém”.
Ainda de acordo com o presidente brasileiro, o Conselho de Segurança da ONU não representa a diversidade de forças geopolíticas existentes atualmente. “Estou há mais de 15 anos brigando pela participação no Conselho de Segurança. Agora, vou falar com o meu amigo (Joe) Biden: ‘Você pode tratar de começar a defender o Brasil’. Os Estados Unidos nunca disseram ‘não’ perto de mim, mas também não disseram que ‘sim’. Eles não querem que a gente entre, mas acho que vão mudar. A gente vai brigar com eles para entrar”, garantiu. Lula e Biden se encontrarão em Nova York, em setembro, na cerimônia de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas.
DÍVIDA DA ÁFRICA COM O FMI: IMPAGÁVEL
Lula também tratou do problema da dívida dos países africanos com o FMI em sua entrevista coletiva. Segundo o presidente, é necessário fazer uma revisão, na medida em que “essa dívida vai ficando impagável porque o dinheiro do orçamento nunca dá para pagar e o problema vai sempre aumentando”, afirmou.
Lula defendeu a anulação do valor da dívida, embora considere essa proposta improvável, ou a extensão do prazo de ressarcimento ao FMI ou investindo o montante em obras de infraestrutura para o desenvolvimento dessas nações, lembrando que a África, como um todo, deve US$ 760 bilhões ao fundo.
O presidente brasileiro informou aos jornalistas que solicitou ao Ministério das Relações Exteriores (MRE) um estudo sobre a possibilidade de abertura de um consulado-geral em Luanda — o primeiro aberto em um país africano de língua portuguesa que cuidaria de questões relacionadas a repatriações, hospitalizações e prisões de brasileiros em território estrangeiro, além de emitir passaportes, documentos de viagens e vistos a estrangeiros.
“Com aproximadamente 30 mil brasileiros, Angola abriga nossa maior comunidade em todo o continente africano. Por isso, instruí o chanceler Mauro Vieira a estudar a abertura de um consulado-geral”, anunciou Lula.
MAC