A Justiça do Trabalho de São Paulo determinou que a empresa Uber contrate todos os motoristas ativos em sua plataforma e que pague uma indenização no valor de R$ 1 bilhão em danos morais coletivos. Publicada nesta quinta-feira (14), a decisão acatou ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).
Na decisão, o juiz Maurício Pereira Simões, da 4ª Vara do Trabalho de São Paulo, apontou que a empresa sonegou direitos mínimos, deixou colaboradores sem proteção social e “agiu dolosamente no modo de se relacionar com seus motoristas”. Para o magistrado, a Uber agiu de forma planejada com o objetivo de não cumprir a legislação do trabalho, previdenciária, de saúde e de assistência, se omitindo em suas obrigações, mesmo quando tinha o dever constitucional de cumprir tais normas.
O juiz entendeu que todos os motoristas cadastrados na Uber cumprem os requisitos do direito trabalhista que caracterizam um vínculo empregatício de pessoalidade (impossibilidade de substituição por terceiros), não eventualidade (trabalho rotineiro), subordinação (o motorista é coordenado pela Uber), onerosidade (o motorista recebe pelas corridas feitas no aplicativo).
“Cada vez que um motorista se liga ao aplicativo, inclusive com controle facial, gera uma pessoalidade indiscutível de sua figura na prestação do serviço. É possível afirmar, inclusive, que a prestação do motorista […] é mais pessoalizada do que a de um taxista”, defendeu.
Desses critérios, Maurício julga ser mais importante o de subordinação do trabalhador às regras da empresa. “Há comprovação de que a relação permite aos clientes da ré [Uber] atribuírem notas aos motoristas e elas servem de parâmetro para chamadas, valores, restrições, promoções, dentre outros aspectos. O relatório indica claramente que a média de notas impacta no número de viagens, renda média diária, ficando claro o controle do trabalho, a organização de número de chamadas, o número de viagens e a renda possível de ser aferida a partir desta métrica […]. Os motoristas seguem exatamente o modelo de negócio imposto pela Ré, nos exatos termos e formato decididos pela plataforma”, destacou.
De acordo com o juiz, a empresa “decide quem pode dirigir ou não por intermédio de sua plataforma; impõe as regras para trabalhar dirigindo por intermédio da plataforma; controla em tempo integral as atividades dos motoristas; conhece tudo, e de forma ampla e irrestrita, o que é feito pelo motorista, como e quando é feito, individualmente em relação a cada motorista; tem amplo poder fiscalizatório da atividade dos motoristas, diretamente pela plataforma; tem poder de punir de forma média, com restrição de chamadas, bloqueios unilaterais temporários e de forma máxima, extrema, mediante bloqueio definitivo”.
Em relação à indenização, Maurício relata que a definição considera “a capacidade econômica da empresa”, que registrou crescimento do seu lucro em 29% no primeiro trimestre de 2023 e chegou a um faturamento de 8,8 bilhões de dólares.
Para o juiz, R$ 1 bilhão, “olhando o valor de forma pura e simples, notadamente em um país de um povo preponderantemente pobre (ou extremamente pobre), pode parecer impactante, mas contextualizando os aspectos econômicos divulgados pelos meios de comunicação e pela própria ré, […] o valor se mostra irrisório, especialmente se observar que a presente demanda é fruto de anos de apurações, de operação da ré e do espaço geográfico em que opera, não sendo a condenação um elemento isolado no tempo e no espaço”, disse o magistrado.
A empresa terá um prazo de seis meses, após o trânsito em julgado da ação, para que assine a carteira profissional de todos os motoristas, com todas as futuras contratações seguindo essa diretriz. O valor de R$ 1 bilhão por danos morais coletivos terá 90% destinado ao Fundo de Amparo ao Trabalhador. O restante irá para associações de motoristas por aplicativos que tenham registro em cartório. A empresa afirmou que recorrerá da decisão.