Consideramos se é possível acabar com o petróleo no mundo
ALLAN KARDEC*
Em plena convulsão de transição energética, o mundo se move para que cenário? Essa é a pergunta de um milhão de dólares, que muitos tentam responder. O fato é que a energia é essencial para qualquer povo e fundamental para a soberania de qualquer país. Para entender o que acontece, os especialistas analisam a chamada “matriz energética”, no sentido de ter prognósticos de como serão os cenários futuros, levando em consideração tanto a transição energética quanto outros como o crescimento dos países assim como a batalha pela diminuição da desigualdade e do fim da fome.
A matriz energética mundial é o conjunto de fontes de energia disponíveis para atender à demanda de energia de um país ou do planeta. Essas fontes incluem petróleo, carvão, gás natural, energia nuclear, hidrelétrica, eólica, solar, entre outras. A composição da matriz energética varia de acordo com o país, dependendo de fatores como recursos naturais disponíveis, políticas governamentais, tecnologia e considerações econômicas.
Na figura que ilustra o início deste texto, mostramos a evolução dessa matriz no mundo ao longo do último século. Nesse cenário, o petróleo evoluiu como sendo a principal fonte de energia mundial, sendo fundamental para o setor de transportes. No entanto, devido à agenda climática e oscilação de preços, houve um esforço para diversificar as fontes energéticas em muitos países.
O carvão é uma das fontes de energia mais antigas e ainda é amplamente utilizado, especialmente na Ásia, para geração de eletricidade e mais recentemente retornou à matriz energética europeia, principalmente na Alemanha, por conta da guerra da Ucrânia e Rússia. No entanto, é também uma das fontes mais poluentes.
O gás natural é visto por muitos como a transição entre os combustíveis fósseis tradicionais e as fontes de energia renováveis, ou seja, é a “transição da transição”. Tem menos emissões de CO2 do que o carvão ou o petróleo e tem sido cada vez mais utilizado na geração de eletricidade e várias outras aplicações. Ele tem crescido extraordinariamente, principalmente após a revolução tecnológica ocorrida nos Estados Unidos por conta do uso forte do chamado “gás não convencional”.
A energia nuclear é uma fonte de energia questionada devido a preocupações com segurança, resíduos nucleares e custos elevados de construção. No entanto, ela não emite gases de efeito estufa, e alguns defendem seu uso como parte da solução para as mudanças climáticas.
A capacidade instalada de energias renováveis, como eólica e solar, cresceu rapidamente nos últimos anos. Essas fontes têm a vantagem de serem sustentáveis e não emitirem gases de efeito estufa. No entanto, também apresentam desafios, como a intermitência de produção – fato muito lembrado por especialistas quando do último apagão que ocorreu no Brasil, principalmente nas regiões Norte e Nordeste.
A hidroelétrica é uma das principais fontes de energia renovável e é amplamente utilizada em muitos países, especialmente na América Latina e Canadá. No entanto, a construção de grandes barragens tem sido objeto de intensos debates quanto às questões ambientais e sociais.
Voltemos para a figura. O que você percebe? Em particular, vejo que a biomassa (lenha) conservou seu quinhão, sendo consumida desde quando ocorreu a Revolução Industrial, nos idos de 1800, quase a mesma quantidade. Só mostro desde 1900 porque antes basicamente era só lenha! Mas todas as outras cresceram em consumo: carvão, petróleo, gás, eólica, solar, nuclear. Todas, menos a nuclear e a lenha, que basicamente mantiveram seu espaço. Mais ainda: absolutamente nenhuma foi dizimada na história da Humanidade. Nenhuma desapareceu!
Claro, proporcionalmente elas encolheram quando comparadas entre si. Ou seja, o espaço de algumas ampliou enquanto o de outras diminuiu. O gráfico abaixo ilustra esse fato muito bem: o carvão encolhe, mas continua com um grande espaço no planeta; o petróleo oscila e cai a partir da década de 1980, enquanto o gás natural – a energia do futuro – aumenta claramente. As outras fontes – as renováveis – são residuais proporcionalmente, ainda que fruto de alta tecnologia.
Historicamente, é bom lembrar que, em muitas economias, o crescimento do PIB tem sido acompanhado por um aumento no consumo de energia. Uma economia em crescimento frequentemente exige mais energia para alimentar a expansão industrial, o transporte e o consumo residencial. Nesse contexto, há uma expectativa muito grande da expansão, por exemplo, da Índia ou da África nas próximas décadas.
Ou seja, a partir do comportamento do último século, pode-se concluir algumas coisas:
Que as mudanças relativas na matriz ocorrem ao longo de décadas – muitas décadas – e não em poucos anos;
O PIB do planeta tem aumentado ao longo do tempo e deve aumentar nas próximas décadas, o que deve ser um fator de aumento de consumo de energia;
A História mostra que há uma tendência de novas fontes serem agregadas à matriz energética;
Há estimadas em torno de 700 milhões de pessoas em situação de pobreza ou extrema pobreza, no planeta. Quando essas pessoas entrarem na matriz energética – porque há luta para que elas consigam – elas devem consumir as fontes mais baratas de energia;
Não há casos registrados de diminuição de consumo de qualquer fonte, pelo contrário, a maioria aumentou, em termos absolutos. Em termos relativos e percentuais, claro, elas aumentam ou diminuem;
O aumento da emissão dos gases de efeito estufa aconteceu a partir da Revolução Industrial, no século 19. Ou seja, foi a tecnologia que trouxe o problema e creio que será ela que trará a solução. Nesse contexto, é bom lembrar que a Ciência sempre trouxe novas soluções como a captura de carbono, que parece a opção mais razoável, no contexto atual. A Ciência continuará trazendo outras soluções, inevitavelmente.
Por último, ainda não consegui vislumbrar algum contexto que alguns propagam como possível de acabar com o petróleo. Pergunto: em que cenário isso aconteceria?
* Allan Kardec Duailibe Barros Filho, PhD pela Universidade de Nagoya, Japão, professor titular da UFMA, ex-diretor da ANP, membro da AMC, presidente da Gasmar
Artigo reproduzido do site imirante.com