
O julgamento se encerrou na sexta-feira (10). Jurados concluíram que a Monsanto sabia dos riscos do RoundUp e RangerPro mas nada fez para alertar usuários.
Na primeira condenação do que podem ser mais de 4 mil processos por câncer causado pelos agrotóxicos RoundUp e RangerPro, um júri determinou nos EUA que a Monsanto pague R$ 1,1 bilhão (US$ 289 milhões) ao jardineiro Dewayne Johnson, diagnosticado com um câncer não-Hopkins e em estado terminal. Desde 2015, um braço da Organização Mundial da Saúde (OMS) da ONU, a Agência Internacional de Pesquisa do Câncer, classificou o glifosato, principal componente dos dois agrotóxicos, como “provavelmente cancerígeno para humanos”.
Johnson usava frequentemente o RangerPro em seu trabalho como jardineiro de uma escola na Califórnia e foi diagnosticado com um linfoma em 2014. O julgamento durou oito semanas e se encerrou na sexta-feira (10), com os jurados concluindo que a Monsanto foi “mal intencionada” e, conforme e-mails internos da corporação dos agrotóxicos, sabia ou deveria saber dos riscos mas nada fez para alertá-lo e os herbicidas contribuíram “substancialmente” para a doença dele.
A conclusão foi possível porque o juiz do caso permitiu que a defesa exibisse os documentos secretos da Monsanto que provaram, como assinalou o advogado de Johnson, Brent Wisner, que a corporação “sabia há décadas que o RoundUp poderia causar câncer”. Decisão judicial que é um grande golpe contra o malsinado ‘modelo de negócio’ transgênicos/agrotóxicos, podendo potencialmente, como analisou um especialista australiano, se tornar um novo “caso amianto”.
Os e-mails internos da Monsanto mostraram como a corporação ignorou qualquer advertência sobre os riscos dos seus agrotóxicos e como atuou para desacreditar os cientistas que faziam tais advertências. Também como ajudou a escrever “pesquisas fantasmas” que encorajavam o uso continuado e outros artigos laudatórios.
“As evidências contra os agrotóxicos são “esmagadoras”, afirmou Wisner, que considera a sentença “apenas a ponta de lança” do escândalo do uso do glifosato. O veredicto enviou uma mensagem à Monsanto “de que seus anos de fraude sobre o RoundUp acabaram e que eles deveriam colocar a segurança do consumidor em primeiro lugar acima dos lucros”, acrescentou. Outro membro da equipe de advogados, Robert F. Kennedy Jr, apontou que o júri constatou que a Monsanto “agiu com malícia e opressão porque estava ciente de que estava fazendo algo errado e com indiferente negligência à vida humana.”
Pai de três filhos, Johnson pulverizava herbicidas para conter as ervas daninhas nas dependências da escola, às vezes por várias horas por dia, sendo que em duas vezes, por vazamentos, ele teve contato direto com o produto. Os médicos dizem que ele, aos 46 anos, só tem poucos meses de vida. A mulher foi obrigada a trabalhar em dois empregos, para ajudar a custear o tratamento.
“Eu tenho passado por muita dor”, disse o ex-jardineiro, “realmente tira tudo de você”. Ele disse, ainda, que a Monsanto não o deveria ter deixado usar o produto perto de crianças numa escola. “Eu nunca teria pulverizado esse produto nos terrenos da escola ou em torno das pessoas, se soubesse que isso lhes causaria dano”.
Como era de esperar, a Bayer/Monsanto não vai desistir de seu negócio de bilhões de dólares só por causa do câncer, do envenenamento do meio ambiente ou da destruição da biodiversidade. A direção da corporação asseverou que o veneno é “seguro” e autorizado em 130 países. A Monsanto também relembrou que a agência de preservação ambiental dos EUA mantém o sinal verde para o glifosato – o que para muita gente é só um sintoma gritante da conivência que impera nessa questão.
Após o julgamento, Scott Partridge, vice-presidente da Monsanto, rejeitou qualquer ligação entre glifosato e câncer, insistindo que “o veredicto não altera as mais de quatro décadas de uso seguro e ciência por trás do produto”. Partridge chegou ao extremo de chamar a agência da ONU de “corrompida” por ter declarado o glifosato “carcinogênico”. A Bayer comprou a Monsanto por US$ 66 bilhões, criando a maior empresa do mundo no setor. No próximo outono, em St Louis, já está marcado o segundo julgamento em que a Monsanto e seus pesticidas são acusados de causar câncer.
A.P.