Bastou subir um pouquinho a renda e o Copom, do Banco Central, já começa a ameaçar com elevação de juros
Em 2023, tanto a Renda Nacional Disponível Bruta das Famílias (RNDBF) quanto a versão restrita da RNDBF apresentaram um crescimento, em termos reais (descontada a inflação), acima da casa de 7% na comparação com o ano passado, segundo dados do Banco Central (BC).
Significa “7,7% no trimestre móvel até agosto, 7,9% no acumulado do ano e 9,1% em 12 meses até agosto, no conceito restrito”, destacou o economista-chefe da Tullett Prebon, Fernando Montero, em reportagem do Valor Econômico, publicada nesta quarta-feira (11).
Segundo o Banco Central, a RNDBF corresponde à renda total das famílias, que inclui os rendimentos obtidos pelo uso de fatores de produção (trabalho e capital) e as transferências recebidas descontadas das transferências pagas, como impostos e contribuições sociais. Essa medida expressa a renda agregada das famílias disponível para consumo final e poupança. Já a restrita da RNDBF desconsidera o excedente operacional bruto e as rendas de propriedade das famílias.
A elevação da renda está relacionada com a recuperação parcial do salário mínimo e a obtenção de acordos salariais acima da inflação.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC já começa a ameaçar com elevação de juros por conta desta primeira recuperação da renda. Os banqueiros não querem abrir mão da mamata dos juros altos e dizem que estão preocupados com “o possível impacto que poderia ocorrer sobre a dinâmica da inflação de serviços, em caso de um crescimento sustentado pela renda e pelo consumo”.
“No que se refere à atividade econômica doméstica”, destaca o Copom em sua ata, uma “elevação de renda disponível, seja em função do dinamismo do mercado de trabalho, da queda de preços de alimentos ou de programas de transferência de renda”, podem ter fornecido “algum suporte para o consumo”, escreveu.
Assim, “a conjectura de um crescimento sustentado pela elevação da renda é corroborada pela resiliência no consumo de serviços das famílias”, apontou o Copom, em sua ata, buscando os motivos para economia brasileira não ter desacelerado mais, ou nas próprias palavras do BC, ter demonstrado um “crescimento mais resiliente nos últimos trimestres”, frente a política contracionista econômica que está sendo imposta pelo BC, por meio da manutenção da taxa básica de juros (Selic) em níveis elevados.
Ocorre que, apesar do crescimento da renda disponível neste ano frente ao último ano do trágico governo Bolsonaro, este aumento não se demonstra suficiente para recuperar o estrago que a política de juros altos do Banco Central fez e continua fazendo na vida de milhões de brasileiros. Um bom exemplo são os índices de endividamento e inadimplência demonstrando que as famílias no Brasil, principalmente as de menor renda, seguem com seus orçamentos apertados e não conseguindo honrar com suas dívidas.
Em agosto, 30% das famílias brasileiras estavam com dívidas atrasadas, a maior proporção em oito meses, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Já o volume de famílias endividadas no Brasil ficou em 77,4% no período.
Já o levantamento feito pela empresa Serasa Experian, aponta que mais de 71,74 milhões de pessoas se encontravam na inadimplência em agosto, tendo seus nomes incluídos no cadastro de devedores. São 320 mil devedores a mais do que foi registrado no mês de julho e quase 25% do total de inadimplentes tinham dívidas ligadas a contas de serviços essenciais, como luz, água, gás e telefone, por exemplo. Esse é o maior patamar para esse tipo de dívida desde o início da série histórica, em janeiro de 2019.
Se com a economia em desaceleração, com mais de 8,4 milhões de pessoas em busca de uma oportunidade no mercado de trabalho, a renda obtida pela maioria dos brasileiros não consegue cobrir as despesas do dia a dia e demais dívidas, imagina para poupar dinheiro.
Conforme números divulgados pelo próprio BC, no último mês de setembro o movimento de depósitos e saques nas cadernetas de poupança voltou a apresentar resultado negativo, com os saques superando os depósitos em R$ 5,83 bilhões no período. Esse foi o terceiro mês seguido de retiradas e, no ano, apenas no mês de junho os depósitos superaram os saques.