Após as altíssimas taxas registradas ao longo dos quatro anos do governo Bolsonaro, o desmatamento anual na Amazônia ficou abaixo de 10 mil quilômetros quadrados pela primeira vez. De agosto de 2022 a julho de 2023, houve uma redução de 22,3% na comparação com o período anterior, com perda de 9.001 quilômetros quadrados de floresta. A área equivale ao tamanho da República de Chipre, na África.
Os números são do relatório anual do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgados nesta quinta-feira (9). O programa é considerado o mais preciso para medir as taxas anuais e funciona como parâmetro para a definição de políticas públicas na área ambiental. O Prodes difere do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), que lança os alertas mensais e já sinalizava baixas na destruição nos meses recentes.
Ao contrário de Bolsonaro (PL), que virou às costas para o meio ambiente, com o desmonte das políticas para o setor e o estímulo às ações de madeireiros e de garimpo ilegais, a paralisação do Fundo Amazônia, entre outras medidas catastróficas para o setor, a reversão das taxas negativas contra o meio ambiente era um dos compromissos de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, defendeu que os dados poderiam ser melhores, mas o quadro ainda reflete os cinco meses da gestão Bolsonaro, justificou. O período avaliado pelo Prodes vai de agosto a julho por ser o intervalo entre as estações secas da floresta amazônica, quando o desmate é facilitado pela falta de chuvas.
“Conseguimos uma redução de 22% do desmatamento mesmo tendo uma ‘contratação’ de 6.000 km² (destruídos na Amazônia) do governo Bolsonaro”, afirmou, referindo-se aos índices de agosto a dezembro de 2022, que compõem os números ora divulgados. Mas, “esse resultado é fruto do trabalho de todos nós”, ressaltou a ministra.
“Desde janeiro, quando assumimos o governo”, continuou Marina, “o presidente Lula assumiu o compromisso com o desmatamento zero até 2030”. “Grande parte desse desmatamento vem da Amazônia”, explicou. “Nós sabíamos que era um desafio muito grande”, disse. “É um trabalho que já tínhamos um know-how da nossa gestão anterior. Agora atualizamos e estamos vendo esses resultados”, completou.
“O discurso do presidente, de proteção à floresta, se traduziu em número e virou entrega concreta”, disse Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima. “É um resultado expressivo e que sela a volta do Brasil à agenda de clima”, comemora.
Para Mariana Napolitano – diretora de Estratégia do WWF-Brasil, trata-se de “uma boa notícia, mas a gente tem que continuar perseguindo sistematicamente essa redução do desmatamento”, defendeu.
Em 2004, o índice do Prodes atingiu sua marca mais alta dos últimos 20 anos: 27,7 mil km² desmatados. Porém, depois disso, quando analisado o período seguinte, houve uma queda constante nesses números e 2012 registrou a maior baixa da série histórica do Prodes, com 4,5 mil km².
Em 2015 a situação se alterou e a área desmatada aumentou, chegando a 10.129 km², em 2019; 10.851 km², em 2020; e 13 mil km², em 2021. Os números só apresentaram um leve recuo no último ano da gestão Bolsonaro. Ele, porém, assumiu o governo com uma taxa inicial de desmatamento próxima de 7.500 km², a qual não apresentou reduções em comparação com àquela do início do seu mandato.
Os números divulgados nesta quinta ocorrem em meio a uma seca histórica que atinge o bioma amazônico, que fez rios virarem desertos e isolou comunidades. O fenômeno é consequência de uma soma de fatores como o El Niño, as mudanças climáticas, o aquecimento do Atlântico Norte e a degradação da floresta, segundo especialistas.
De acordo com o Inpe, em outubro, o Amazonas registrou 3,9 mil focos de queimadas durante todo o mês, a pior taxa dos últimos 25 anos. “Clima favorável aos incêndios”.
“O clima está muito favorável à expansão dos incêndios florestais. Existe uma relação entre o desmatamento e o fogo na Amazônia […], afirmou a diretora de ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Ane Alencar, em entrevista ao podcast “O Assunto”. Mas a gente tá vendo esses incêndios se alastrando e isso acontece por conta da seca”, completou.
O desmatamento passado e a extração seletiva de madeira contribuíram para a regularidade de queimadas, segundo a especialista. Ela alertou sobre a possibilidade de uma situação mais drástica se as condições climáticas deste ano coincidirem com o aumento do desmatamento.
Nesta quinta-feira, o Ministério Público Federal (MPF) acionou a Justiça Federal em busca de explicações do Governo do Amazonas sobre suas ações contra as queimadas. O órgão pediu documentos que confirmem as providências adotadas pelo estado desde 2019, incluindo as que integram o Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas do Amazonas (PPCDQ 2020-2022).