“O crédito está caro, os juros, apesar da queda da taxa Selic, ainda estão altos”, afirma Silvia Matos, economista responsável pelo Boletim Macro do FGV Ibre. “A política monetária está ainda bastante apertada”, acrescenta Tatiana Pinheiro, do Galapagos Capital
As previsões de diversos economistas do mercado para as atividades no terceiro trimestre deste ano não estão muito otimistas. A maioria das projeções de 71 consultorias aponta para um resultado negativo na atividade econômica entre 0,1% e 0,6% neste período.
O governo também reduziu a expectativa para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, mas ainda mantém uma previsão de crescimento de 3% para 2023. Os analistas apostam em um PIB de 2,7% ou 2,9%. No ano passado, o PIB registou uma alta de 2,9%.
O Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério do Trabalho, projeta um saldo positivo de 2 milhões de empregos com carteira assinada este ano, número igual ao do ano passado. A produção industrial registrou uma elevação de 0,1% em outubro em relação ao mês anterior e de 0,0% no ano.
Estes são sinais de que a economia não está deslanchando no segundo semestre, como esperava o governo. A causa, segundo os analistas, é a manutenção de juros ainda muito altos – que inibem investimentos e consumo – e a redução geral da produção provocada pela entressafra agrícola.
“Não tem mais nada no terceiro trimestre: o efeito da safra já foi contabilizado; o impulso fiscal já foi contabilizado, não há novos estímulos. Sobram o ajuste de impostos, diminuindo a renda disponível, e a política monetária ainda bastante apertada”, resume Tatiana Pinheiro, economista-chefe para Brasil da Galapagos Capital, em entrevista ao Valor Econômico.
“Apesar de termos iniciado o processo de corte de juros, estamos em ambiente contracionista. É uma história que, inicialmente, se imaginava para o ano de 2023, mas não veio no primeiro semestre e, agora, estamos observando no terceiro trimestre”, afirma José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. “Os serviços estão andando de lado, de modo que aquela recuperação pós-pandemia está completa, se esgotou”, acrescentou o analista do Fator.
“Algumas medidas do governo, como a expansão e novos valores do Bolsa Família e o reajuste do salário mínimo desde maio, ajudaram a sustentar a renda das famílias e, portanto, o consumo no segundo trimestre, apontam economistas. Essas “novidades”, no entanto, vão “desaparecendo”, diz José Francisco Gonçalves, que tem projeção para o PIB do terceiro trimestre em em linha com a mediana, ou seja, queda de -0,2%. A recuperação da renda, segundo estes analistas, está sendo obtida muito lentamente e não está ajudando.
Segundo Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital, o consumo está retraído. “Além de juros ainda elevados, há um efeito psicológico que afeta o programa Desenrola, do governo”, avalia. “As famílias estavam endividadas e inadimplentes. A partir do momento em que ficam com o nome limpo, elas não saem simplesmente demandando crédito. Há cautela, porque as pessoas não têm perspectivas tão positivas para o futuro, para a manutenção do trabalho e da sua renda”, afirma.
Ainda no lado da demanda, José Francisco Gonçalves destaca o comportamento da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), medida para os investimentos no PIB. “Pode ter alguma coisa [melhor] um pouco na parte de construção, por causa do setor imobiliário, mas, pela importação ou pela produção de bens de capital, está complicado”, analisa o economista.
A FBCF, que mede os investimentos, deve crescer 0,5% no terceiro trimestre, de acordo com a expectativa mediana, mas tinha ficado praticamente estagnada nos três meses anteriores e desabou 3,4% no primeiro trimestre.
“Os juros estão caindo, mas o efeito sobre decisões de investir não é imediato, principalmente porque ninguém tem claro onde vai parar a queda da Selic. Se, em termos nominais, ficar acima de 9%, ainda é muito difícil imaginar que vão investir”, diz Gonçalves.
Silvia Matos, economista responsável pelo Boletim Macro do FGV Ibre, considera que o problema é a política monetária. Ela também falou ao Valor Econômico. “As condições financeiras continuam apertadas”, ressaltou a economista.
“O crédito está caro, os juros, apesar da queda da taxa Selic, ainda estão altos” disse ela. Muito do bom comportamento da atividade no primeiro semestre decorreu do choque de oferta do setor rural, que ajudou no controle da inflação de alimentos. A agropecuária, que sustentou o PIB neste ano, está sob risco em 2024, de quebra da safra por questões climáticas, avalia Matos.