“Vale a pena ter um acordo de livre comércio, ainda que não seja o ideal, só por ter?”, questiona o assessor especial da Presidência da República
O assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, afirmou nesta segunda-feira (4) que o acordo comercial entre o Mercosul e União Europeia (UE) “oferece pouco” e “exige muito” do bloco sul-americano.
“O que o acordo nos oferece é pouco, em termos dos produtos do nosso interesse, e o que se exige da gente é muito. Fica apenas a questão: vale a pena ter um acordo de livre comércio, ainda que não seja o ideal, só por ter?, questionou Celso Amorim, em entrevista ao Valor Econômico.
Celso Amorim disse, ainda, que não se surpreendeu com a negativa do presidente da França, Emmanuel Macron, ao acordo comercial entre os blocos, uma negociação que já vem sendo costurada há mais de duas décadas.
“Era uma coisa de se esperar. Agora, é uma questão de julgamento, né? E os julgamentos variam muito de acordo com o interesse dos grupos. Aqueles poucos setores que vão ter alguma vantagem, acham que tem que ter o acordo. Tem outros que acham que tem que ter o acordo só porque é um selo de qualidade. Isso é uma bobagem, na minha opinião”, comentou.
O assessor especial da Presidência também defendeu que a sociedade brasileira deve ser ouvida.
“É óbvio que, historicamente, nós tratamos esse acordo como estratégico, em termos até do equilíbrio global”, observou Amorim. “Mas a Europa de hoje não é a mesma Europa de quando nós começamos a fazer o acordo. Até que nesse ponto a França é dos mais independentes, mas muitos outros não. Então, eu vejo assim. Vamos ouvir agora a sociedade brasileira também, quer dizer, aquela parte da sociedade que não é ouvida, não é ouvida pelo valor tampouco. Têm de ser ouvidos os pequenos agricultores, enfim, os sindicatos, saber como eles estão vivendo essa questão”, defendeu o assessor especial da Presidência.
Celso Amorim também foi questionado sobre a disputa entre a Venezuela e a Guiana envolvendo o território chamado Essequibo. No último domingo, os venezuelanos aprovaram, por meio de um plebiscito, a proposta do governo Maduro para criar um novo estado em Essequibo, a região atualmente controlada pela Guiana. O contencioso entre os países por Essequibo já existe há décadas, mas reaqueceu com a descoberta e a exploração de petróleo na região.
“É uma reivindicação histórica da Venezuela”, lembrou Amorim. “Não vou entrar no mérito, mas está lá dormente. Até no período do Chávez ficou dormente. O Chávez fez até a Petrocaribe. A Guiana participava da Petrocaribe. Por que isso está sendo ressuscitado dessa forma agora é uma matéria de interpretação, mas eu acho perigoso”, asseverou.
“O fato real é que havia outras coisas que estavam predominando na agenda da Venezuela, questões ligadas ao processo eleitoral, etc”, constatou. “E isso passou a dominar. Então, isso talvez para ele tenha sido um ganho. O problema é que o ganho interno pode se tornar um problema externo sério”, avaliou Amorim.
“Para nós, no projeto de integração da América do Sul, complica. Nós queremos ter boas relações com ambos, com a Venezuela e com a Guiana. E a Guiana também pode vir a tomar medidas que não nos interessam. Por exemplo, chamar tropas de outros países para ajudá-la na eventualidade de uma invasão. Isso também não é positivo”, disse Amorim.
Sobre a declaração do presidente Lula de que a relação com Israel está complicada, Amorim disse que “a relação de Netanyahu com o mundo inteiro está complicada”. “Até nos Estados Unidos, tem largos setores, tanto à esquerda quanto à direita, que criticam o comportamento de Netanyahu”, disse Amorim. defendendo que a solução é aceitar a existência de um Estado Palestino.