
Em evento do mercado financeiro, governador de São Paulo admitiu que entrega da água de São Paulo aos interesses privados nunca teve objetivo de reduzir a tarifa
Menos de uma semana após aprovar na Assembleia Legislativa de São Paulo a autorização para a privatização da Sabesp, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) admitiu em evento do mercado financeiro que a conta de água aumentará, contrariando tudo que disse para justificar a venda da companhia.
Antes de conseguir aprovar o projeto ilegal que libera a entrega da Sabesp, em uma sessão que contou com uma brutal repressão aos manifestantes contrários à venda do patrimônio público, Tarcísio dizia que a privatização não iria aumentar a tarifa paga pelos cidadãos e, ao contrário, os recursos obtidos com a venda da empresa seriam utilizados para reduzir a conta de água. Agora falou que haverá “um aumento menor”.
“A tarifa vai subir, mas a privatização garante que ela vai subir num valor menor”, disse nesta segunda-feira (11) em evento da empresa de especulação XP.
A declaração ainda contradiz o principal argumento do governo para a privatização da Sabesp, a tarifa não ficar mais cara para os mais pobres.
A lei que autorizou a privatização estabelece que 30% do arrecadado com a venda de ações será usado para criar um novo fundo para “proporcionar modicidade tarifária”. Segundo o governo, modicidade tarifária significava baixar a tarifa. Na prática, o dinheiro retornaria para a empresa compradora na forma de “subsídio”.
O projeto aprovado pelos deputados governistas, sem a presença da oposição na Alesp, dá um verdadeiro “cheque em branco” para Tarcísio, já que não estabelece nenhum critério técnico, preço, ou pré-condição de investimento para a venda da estatal que abastece mais de 32 milhões de pessoas no Estado.
“O que estamos criando é inovador no mercado de saneamento: um fundo com recursos do próprio Estado, seja por meio da venda de parte das ações do Governo de São Paulo na Sabesp ou pela participação nos lucros da empresa para reduzir tarifa à população. Queremos levar saneamento de qualidade para todos, mais rápido, melhor e mais barato”, afirmou Tarcísio, em outubro, em uma matéria sobre as mudanças na Sabesp, que o governo publicou em seu site oficial.
“Precisamos de mais investimentos, aliado a uma redução tarifária. Essa é uma premissa que estabelecemos desde o início”, disse a secretária indicada pelo governo para tocar a privatização, Natália Resende, em entrevista à Folha de S.Paulo em agosto.
Em entrevista à TV Globo em janeiro, Natália Resende prometia a redução da cobrança pelo saneamento. “A gente não vai fazer nada sem baixar tarifa”, disse na ocasião.
Texto do próprio site da Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística após a sanção da privatização da Sabesp afirmava: “Após amplo aval da Alesp, Tarcísio de Freitas oficializa norma que vai permitir redução de tarifa e garantir acesso à água e esgoto para 10 milhões de pessoas”.
O governador voltou a afirmar, nesta segunda, que o estado de São Paulo vai ser “um acionista relevante” da Sabesp e não terá mais o controle da empresa. Segundo ele, um papel importante na governança basta.
“As dúvidas estão sendo equacionadas e em breve vamos divulgar o novo modelo regulatório. Estudamos o que deu errado e o que deu certo para incorporar no nosso modelo”, afirmou Tarcísio.
Com relação à adesão dos municípios paulistas a novos contratos com a Sabesp privatizada, Tarcísio não se diz preocupado. Na capital, o contrato será automaticamente extinto, mas, segundo ele, um novo acordo já está sendo desenhado.
DISCUSSÃO AZEITADA
“A discussão está evoluindo bem, já fizemos apresentações para vereadores. A tratativa com a equipe técnica da prefeitura está muito azeitada. Vamos ter zero dificuldade com a capital. Vai passar”, garantiu Tarcísio, sem esclarecer o que seria o termo “azeitado”.
Para o governador, a Sabesp foi só o início das privatizações. A próxima venda será a Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia), em 2024. E já em fevereiro, ele quer entregar para a iniciativa privada o Trem Intercidades.
Além disso, estão na reta da sanha privatista de Tarcísio, as rodovias do Lote Litoral, Mogi-Dutra e Mogi-Bertioga, dois lotes da via oeste, e as linhas 10, 11, 12, 13 e a futura 14 da CPTM, o túnel de Santos-Guarujá.
Ainda estão nos planos, as PPP (parceria público-privada) para administrar a Fundação Casa (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente), e para a construção de escolas estaduais.