
As queixas de consumidores pela péssima qualidade no fornecimento de energia pelas distribuidoras privatizadas no país bateram recorde em 2023, conforme dados da própria Aneel. Somente o grupo Enel, responsável por manter mais de um milhão de pessoas sem energia em São Paulo no mês de novembro, subiram 52,88%.
Nos 12 meses encerrados em dezembro, dado mais recente, 84.328 reclamações por qualidade do fornecimento de energia foram feitas ao órgão, o maior patamar da série histórica, iniciada em 2014. Uma alta de quase 40% em comparação com o mesmo período de 2022.
As reclamações relativas ao Grupo Enel (com concessionárias no Rio, São Paulo e Ceará) subiram 52,88%. Para a Enel Rio, o número de reclamações pela qualidade do fornecimento saltou 103,98% de um ano para outro. A empresa atende Niterói, Região dos Lagos e Norte Fluminense.
Os dados são analisados pela Aneel, que pode aplicar multas ou outras sanções.
No Rio Grande do Sul, a prefeitura de Porto Alegre pediu à Aneel maior fiscalização da CEEE Equatorial na semana passada. E a concessionária já é alvo até de uma CPI na Câmara Municipal.
A companhia disse que restabeleceu o fornecimento a 99,8% dos clientes desabastecidos devido a temporais do dia 16. E que eventos climáticos extremos vêm impactando a rede elétrica do estado.
Outras cidades gaúchas acionaram a Rio Grande Energia (RGE). Em Estrela, com pouco mais de 32 mil habitantes, João Carlos Schäfer, vice-prefeito em exercício, diz que na semana passada, após chuvas, cerca de 80% dos moradores ficaram sem luz por 72 horas. “Protocolamos uma ação civil pública e obtivemos uma decisão favorável. Fizemos uma representação na Aneel porque os problemas com a RGE são recorrentes”, disse.
PREFEITOS VÃO À JUSTIÇA
As cidades de Venâncio Aires e Cachoeirinha também entraram na Justiça. Segundo Schäfer, os 27 municípios que fazem parte da Vale do Taquari iniciaram discussões com o Ministério Público para pedir a troca da RGE como fornecedora de energia pela cooperativa de energia Certel.
A RGE informou estar em contato com as autoridades. Outras cidades estão recorrendo à Justiça.
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), classificou a Enel de “irresponsável”, no último dia 10, depois de bairros da cidade ficarem sem luz por mais de 24 horas após dois dias de fortes chuvas. Ele afirmou que a concessionária não cumpriu o plano de contingência e que “tem que sair da cidade”.
O município ajuizou uma ação contra a Enel cobrando melhor atendimento e restabelecimento mais célere do fornecimento.
Segundo o engenheiro Roberto Pereira D’Araújo, do Instituto Ilumina, a Aneel deveria liderar a fiscalização com o avanço dos efeitos das mudanças climáticas. “Mas percebemos pouca atuação da agência, especialmente nos locais mais vulneráveis, onde há proximidade entre a rede e as árvores, que têm provocado os inúmeros apagões”, disse ele.
NITERÓI
Após Niterói ter registrado as chuvas mais intensas em dez anos, a prefeitura pretende iniciar nova ação judicial contra a Enel para evitar mais problemas de fornecimento. A ação será movida em conjunto com a prefeitura de Areal, diz o prefeito de Niterói, Axel Grael (PDT), e deve ser protocolada hoje. Ele frisa que a ideia é reunir 65 municípios atendidos pela Enel.
“Em novembro e dezembro, muitos bairros ficaram dias sem energia. A empresa não tem um plano de contingência. Em novembro, entramos na Justiça pedindo para retomar o fornecimento de energia mais rápido”, diz Grael.
MARICÁ
Maricá também fez uma representação na Aneel contra a concessionária. E, após iniciar uma ação civil pública contra a Enel, obteve no último sábado na Justiça decisão que proíbe a empresa de cortar a energia de qualquer consumidor por 30 dias e dá duas horas para restabelecer o fornecimento.
Na última semana passada, dezenas de moradores do distrito de Itaipuaçu, que estavam sem energia, foram dormir na praia devido ao calor. O juiz José Renato Oliva de Mattos Filho, da 1ª Câmara Cível da Comarca de Maricá, determinou que a Enel apresente em 30 dias plano de contingência. Em caso de descumprimento, a multa diária é de até R$ 20 mil.
“Desde meados do ano passado, aplicamos à concessionária três multas, somando mais de R$ 6,4 milhões. Mas nada mudou”, diz o prefeito Fabiano Horta (PT).
Na cidade do Rio, queixas de moradores da Ilha do Governador crescem. Procurada, a Light disse que iniciou no dia 18 a construção de três linhas de distribuição para atender o bairro e a instalação de cem postes. A prefeitura não informou se adotou medidas.