Documento com o currículo da promotora foi encontrado pela CGU no computador de Ramagem entre uma série de materiais impressos pela “Abin paralela”. Ele mantinha computador da Abin dois anos depois de sair do órgão
O currículo da promotora de Justiça do Rio Simone Sibilio, responsável por investigar o homicídio da vereadora Marielle Franco, foi impresso no computador do então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem (PL-RJ). É o que aponta a investigação da Controladoria-Geral da União (CGU).
O documento foi encontrado pela CGU entre uma série de materiais impressos pela “estrutura paralela” do órgão. O material resgatado ajudou a embasar a investigação da PF sobre o suposto esquema de espionagem ilegal no órgão.
Este fato revela que a máquina de espionagem montada para bisbilhotar a vida privada de adversários e, até, de aliados “infiéis”, montada por Alexandre Ramagem e Jair Bolsonaro, funcionou ativamente durante o período em que eles estiveram no governo.
A Polícia Federal suspeita que os crimes continuaram depois, com a permanência de equipamentos da Abin em poder de espiões bolsonaristas que foram infiltrados no órgão. A polícia Federal achou na casa de Ramagem um notebook e dois celulares pertencentes à Abin. Ele já havia saído do órgão há dois anos e não devolveu os equipamentos. Na Abin, eles constavam como devolvidos.
Com o avanço das apurações, a CGU descobriu que impressões feitas na Abin deixavam um rastro, pois geravam o chamado “log”, espécie de registro no sistema que mostra a identidade do usuário do equipamento. A partir daí, 120 gigabytes (GB) de documentos foram recuperados e compartilhados com a PF. É nesse conjunto de documentos que está o currículo da promotora.
No relatório enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Polícia Federal aponta que o documento “tem a mesma ausência de identidade visual nos moldes dos Relatórios apócrifos da estrutura paralela”.
O resumo do currículo de Simone Sibilio foi encontrado no servidor de Alexandre Ramagem. Simone coordenava o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e atuou na força-tarefa do inquérito sobre o assassinato da parlamentar, ocorrido em 2018. A promotora deixou o caso em 2021.
As investigações tiveram início com a vinda à tona do episódio do FirstMile, instrumento israelense de espionagem adquirida pelo governo Temer e usado intensamente no governo Bolsonaro.
A ferramenta israelense foi usada ilegalmente e permitia monitorar a localização de pessoas por meio de dados de celulares. Segundo especialistas, o equipamento podia espionar até 10 mil pessoas por ano. Políticos, servidores e até ministros do Supremo teriam sido espionados.
Além da impressão do currículo da procuradora nas instalações da Abin, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, citou em seu despacho que a ferramenta israelense First Mile foi usada para localização dela.
Num dos celulares de Ramagem apreendidos pela PF aparece uma troca de mensagens entre uma assessora de Carlos Bolsonaro, Luciana Paula Garcia da Silva Almeida, pedindo a Ramagem que obtenha informações sobre inquéritos sigilosos da Polícia Federal que envolveriam Jair Bolsonaro e seus três filhos. Nesta segunda-feira (29), Carlos Bolsonaro teve sua residência no Rio e Angra, além de gabinetes, revistados pela Polícia Federal. Carlos será ouvido em depoimento na PF ainda hoje (30).
Na casa de um militar cedido para a Abin, Giancarlo Gomes Rodrigues, ligado a Ramagem, foram encontrados três notebooks – um deles pertencente à Abin –, dez celulares e um HD externo, apreendidos para serem submetidos à perícia (foto acima). A PF suspeita que o esquema criminoso de espionagem, montado por Carlos Bolsonaro e Alexandre Ramagem dentro da Abin – que ficou conhecida por “Abin paralela” – tenha prosseguido mesmo depois da saída de Ramagem do órgão.
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