“A ocupação é ilegal e deve chegar a um fim imediato, completo e incondicional”, disse à CIJ o embaixador palestino na ONU, Riyad Mansour.
A Corte Internacional de Justiça (CIJ), a mais alta instância de justiça da ONU, também conhecida como Corte de Haia, iniciou na segunda-feira (19) uma revisão da legalidade da ocupação israelense nos territórios palestinos, que já dura 57 anos, solicitada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, na resolução 77/247, de dezembro de 2022.
Mais de 50 países – um número sem precedentes na história da corte – e a União Africana, a Liga Árabe e a Organização de Cooperação Islâmica serão ouvidos pelo tribunal sobre a ocupação e suas consequências.
Trata-se de um processo independente do caso apresentado pela África do Sul, que acusa Israel de cometer atos genocidas em sua atual ofensiva em Gaza.
Desde a guerra de 1967, Israel ocupa o que é reconhecido pelo direito internacional como terra palestina, Jerusalém Oriental, Cisjordânia e Gaza. As audiências irão até o dia 26.
O parecer consultivo que deverá ser determinado pela CIJ, embora não tenha força vinculante,
carrega autoridade legal e moral significativa, ainda mais quando está em foco a existência de apartheid, a instauração de assentamentos de colonos – isto é, roubo de terra alheia – e cinco décadas de violência e opressão contra os moradores palestinos – o que se agrava diante do genocídio em curso em Gaza há mais de quatro meses.
A Assembleia Geral da ONU pediu ao tribunal um parecer consultivo sobre as consequências jurídicas da “ocupação, assentamento e anexação de Israel (…) incluindo medidas destinadas a alterar a composição demográfica, o caráter e o status da Cidade Santa de Jerusalém e a partir da adoção de legislação e medidas discriminatórias conexas”.
A resolução da ONU também pede que a CIJ aconselhe sobre como essas políticas e práticas “afetam o status legal da ocupação” e quais consequências legais surgem para todos os países e para a ONU desse status.
APARTHEID E RACISMO
Representantes da Palestina pediram o fim da ocupação dos territórios palestinos e do sistema de apartheid imposto por Israel na Corte de Haia, entre eles o ministro das Relações Exteriores palestino, Riad Malki, o enviado da ONU para a Palestina, Riyad Mansour, e renomados juristas e acadêmicos.
Al Maliki afirmou que “a ONU consagrou em sua carta o direito de todos os povos à autodeterminação e prometeu livrar o mundo do colonialismo e do apartheid. No entanto, durante décadas, os palestinos tiveram esse direito negado.”
“Mais de 3,5 milhões de palestinos na Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental, estão sujeitos à colonização de seu território e à violência racista que o permite”, disse ele. Ele também mencionou os cidadãos palestinos de Israel que são tratados como “cidadãos de segunda classe” em sua “terra ancestral”.
Mansour disse que Israel deve arcar com as consequências de ações que contrariam o direito internacional, e não ser recompensado por elas. Ele descreveu em lágrimas como o direito internacional falhou em proteger as crianças palestinas.
“Pedimos que confirmem que a presença israelense no território palestino ocupado é ilegal e que sua ocupação deve chegar a um fim imediato, completo e incondicional”, disse. “Sem responsabilização, não há justiça; e sem justiça não pode haver paz”.
A equipe jurídica sublinhou que “o coração do projeto colonial de assentamento de Israel é um … sistema que provê amplos direitos para … os colonos israelenses na Margem Ocidental, enquanto impõe sobre os palestinos dominação militar sem as proteções básicas”, citando a Relatora da ONU para as questões palestinas, Francesca Albanese.
Esses juristas registraram, ainda, que somente dois países no mundo defendem a legalidade da ocupação israelense da Palestina, os EUA e as ilhas Fiji: “Quaisquer que sejam as violações da lei internacional que Israel comete, os EUA sempre buscam o escudar da responsabilização”.
Os juízes da CIJ devem levar vários meses para deliberar antes de emitir um parecer consultivo. Israel não participa nas audiências desta semana e reagiu com raiva ao pedido da ONU de 2022, com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu chamando-o de “desprezível” e “vergonhoso”.
FIM À OCUPAÇÃO, PEDE A ANISTIA INTERNACIONAL
“Acabar com a ocupação ilegal de Israel é um pré-requisito para parar as recorrentes violações dos direitos humanos em Israel e nos territórios palestinos ocupados”, afirmou, em paralelo às audiências da Corte de Haia, a Anistia Internacional, através de sua secretária-geral, Agnès Callamard.
Ela enfatizou que “a ocupação da Palestina por Israel é a mais longa e uma das ocupações militares mais mortais do mundo”, notando que “há décadas que se caracteriza por violações generalizadas e sistemáticas dos direitos humanos contra os palestinos”.
Callamard acrescentou que a ocupação também permitiu e consolidou o sistema de apartheid imposto por Israel aos palestinos. “Ao longo dos anos, a ocupação militar de Israel evoluiu para uma ocupação perpétua em flagrante violação do direito internacional”.
Ainda segundo a Anistia Internacional, o atual conflito que assola a Faixa de Gaza ocupada, onde a CIJ decidiu que há um risco real e iminente de genocídio, “colocou em foco as consequências catastróficas de permitir que os crimes internacionais de Israel nos territórios palestinos ocupados continuem impunes por tanto tempo.”
Também a Human Rights Watch se manifestou na segunda-feira em apoio às audiências, e registrando que qualquer opinião emitida poderia “carregar grande autoridade moral e legal e pode, em última análise, se tornar parte do direito internacional consuetudinário, que é juridicamente vinculativo para os Estados”.