Cientistas alertam que fundação de pesquisa é um patrimônio do povo brasileiro e orçamento está previsto na Constituição de São Paulo
O orçamento proposto pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para o ano de 2025, e que está agora sob análise na Assembleia Legislativa, pretende reduzir em até 30% os recursos destinados à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
A Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2025, encaminhada pelo Executivo à Assembleia Legislativa, inclui artigo que permite reduzir o repasse de 1% das Receitas Tributárias do Estado à Fundação, determinado pela Constituição Paulista, para 0,7%, corte estimado de R$ 600 milhões, o que representa quase 60 mil bolsas de iniciação científica ao menos.
O Conselho Superior da FAPESP afirmou por meio de nota que “recebe essa notícia com grande surpresa e extrema preocupação. Surpresa porque a redução do financiamento da ciência, tecnologia e inovação não fez parte, até o momento, de qualquer plano ou manifestação da atual administração do Estado”.
De acordo com a FAPESP, “o sucesso das universidades de pesquisa, notadamente as estaduais paulistas (USP, Unicamp e Unesp), mas também as federais (Unifesp, UFABC, UFSCar, ITA) e privadas, deve-se ao financiamento da pesquisa por parte da FAPESP. Milhares de startups e pequenas empresas foram financiadas pela FAPESP nos últimos 27 anos. Vinte e dois centros de pesquisa em parcerias com grandes empresas dependem da estabilidade desses investimentos, atuando em temas como aeronaves inovadoras e produção de hidrogênio de baixo carbono”.
Outros 22 centros de pesquisa na fronteira do conhecimento cuidam de temas como tratamento de câncer, doenças genéticas e novos materiais, além de 10 modernos centros de inteligência artificial. Pesquisas em temas identificados pelas Secretarias de Estado buscam soluções concretas para desafios da sociedade paulista, como transição energética, agricultura digital, combate ao “greening”, melhoria do pescado, segurança pública, para exemplificar alguns deles. Cerca de 4 mil projetos de curto e médio prazos e quase 10 mil bolsistas são apoiados pela Fundação.
“O Conselho Superior acredita que o Executivo pode reverter com urgência esta previsão de reduzir o financiamento da FAPESP, cuja estabilidade desde a promulgação da Constituição Paulista de 1989 jamais foi afetada”, afirmou a fundação, que continuou: “Esperamos que o Executivo Paulista, fiel à sua determinação de apoiar o desenvolvimento do Estado com base no conhecimento e na tecnologia, restaure a determinação pioneira feita pela Assembleia Constituinte de São Paulo em 1947, reiterada na reforma constitucional de 1989, de aplicar 1% da receita tributária do Estado no apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico paulista. É esta destinação que assegurou e assegura a liderança do Estado na ciência e na inovação brasileira”.
A proposta de corte no orçamento da Fapesp gerou preocupação e revolta entre pesquisadores, estudantes e a comunidade científica brasileira.
“A FAPESP é um patrimônio do Estado de S. Paulo: se nossas três universidades estaduais ocupam posições entre as melhores do Brasil e da América Latina, é em boa parte graças à ideia da constituinte paulista de 1947, que previu sua criação, e do fato de que tem um orçamento garantido pela Constituição estadual. Mais que isso, ela é um patrimônio do povo brasileiro, porque a fundação paulista serve de exemplo às que cresceram em outros Estados e, além disso, financia pesquisas que melhoram a vida de nossa população inteira”, destacou a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
De acordo com a entidade, “a proposta, a ser votada na Assembleia Legislativa, de cortar seu orçamento causa perplexidade e indignação na comunidade científica, não apenas porque prejudica as pesquisas que fazemos, como também porque prejudicará a vida dos paulistas e dos brasileiros, que muito se beneficiam dos resultados que a ciência proporciona. Não podemos esquecer que a economia hoje está toda vinculada à ciência: a produção de bens e serviços depende essencialmente de um parque científico vigoroso, que o anunciado corte no orçamento ora ameaça”.
O estudante da USP, diretor de Ciência e Tecnologia da União Nacional dos Estudantes (UNE), Caio Guilherme, condenou a proposta de Tarcisio e afirmou: “Isso é um absurdo. É o negacionismo agindo, a anti-ciência agindo, enfim, nós vivemos um período de obscurantismo muito forte, um período do Bolsonaro, que nós não podemos permitir que isso avance aqui no estado de São Paulo”.
Caio Guilherme ainda relembrou que “no final da semana passada, houve essa discussão de corte nos orçamentos das universidades estaduais – USP, Unicamp e Unesp -, e o governo do estado voltou atrás” e defendeu: “agora, não pode ser diferente”.