A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal adiou para quarta-feira (10) a votação da PEC que dá ao Banco Central autonomia financeira, desvinculando-o ainda mais do governo e do programa que venceu nas urnas.
Com a “autonomia política” que foi aprovada em 2021, o Banco Central ainda tem um presidente que foi indicado por Jair Bolsonaro, Roberto Campos Neto, e mantém a taxa de juros do Brasil entre as mais altas do mundo.
Já a Proposta de Emenda à Constituição 65/2023, apresentada pelo senador Vanderlan Cardoso, mas patrocinada por Campos Neto, busca desvincular totalmente o órgão do Ministério da Fazenda, transformando-o em uma empresa pública “com autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira”.
A base governista no Senado pedia o adiamento da discussão por, pelo menos, 30 dias, o que seria decidido em votação, enquanto a oposição queria decidir o tema ainda na quarta-feira (3). O presidente da CCJ, Davi Alcolumbre, optou por adiar em uma semana o início da discussão.
Economistas alertam que aprofundar a autonomia do Banco Central em relação ao governo eleito pelas urnas significa entregar a política monetária ainda mais para os interesses privados dos financistas.
Em 2023, por exemplo, o país gastou R$ 776 bilhões com juros, dinheiro que foi para os bancos ao invés de ter sido utilizado em investimentos e programas sociais, por conta da política aplicada por Roberto Campos Neto.
O senador Rogério Carvalho apontou que “a natureza jurídica de empresa só deve ser usada no setor público quando ele vai entrar em atividades que concorrem com empresas privadas. O Banco Central é um órgão normativo, regulador, fiscalizador, liquidador… Ou seja, ele é um órgão de Estado. Não cabem essas atividades dentro de uma empresa pública”.
Carvalho avalia que o governo tem votos suficientes no Senado para barrar a PEC.
Em audiência pública realizada no dia 18 de junho, na CCJ do Senado, o economista Paulo Nogueira Batista Junior declarou que a autonomia é “apenas em relação ao poder político eleito. Não há autonomia em relação aos interesses financeiros”. “Existe no Brasil a captura do BC por interesses privados: os financistas que vão para o comando do BC em geral saem do sistema financeiro e a ele retornam. Se o integrante da diretoria do BC diverge muito dos interesses privados, corre o risco de, na sequência, não ter uma carreira confortável”, afirmou.
Um dos fundadores do Plano Real, o economista André Lara Resende, ex-presidente do BNDES, destacou que uma autonomia financeira do Banco Central significaria “um profundo regresso”.
“É uma volta à ideia de que as atribuições do BC devem ser executadas por um banco público-privado, como o Banco do Brasil. Um regresso de mais de 70 anos”.
Lara Resende ressaltou que com a autonomia financeira “o BC terá um estímulo perverso” porque “quanto mais alta for a Selic [taxa de juros], maior a remuneração de seu orçamento”.
Para o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), a PEC tenta fazer uma grande alteração para uma questão de financiamento.
“Se a grande questão é a garantia de financiamento adequado, não consigo identificar qual a razão para que se faça uma alteração tão substancial. Gera-se toda uma massa de potenciais problemas para resolver uma questão que deve ser resolvida com a prioridade de alocação orçamentária. A definição da estratégia político-econômica de uma Nação deve ser feita pelos seus representantes eleitos e não por instituições tecnocráticas”, afirmou.