Crescemos a uma média de 7% ao ano durante 50 anos, de 30 a 80. Agora, no entanto, quando atingimos 2,5%, soltam-se rojões, como se estivéssemos no melhor dos mundos
Dados econômicos mostram que o neoliberalismo representou uma ofensiva do capital financeiro para retomar as taxas de lucro, em queda desde a década de 70 do século XX (gráfico abaixo). Primeiro, Ronald Reagan e Margaret Thatcher quebraram os sindicatos e o Estado de bem-estar social; depois, Clinton & Cia concluíram o desmonte das barreiras “rooseveltianas” à ganância dos monopólios. A queda da URSS, por fim, abriu as portas para a enxurrada de capitais e o arrombamento das fronteiras nacionais do Sul Global.
Essa política, baseada cada vez mais no capital fictício e na jogatina frenética de Wall Street, funcionou bem para as potências imperialistas até a crise de 2008. A partir dali, ela entrou em falência. Mais uma vez a rentabilidade dos negócios despencou. As “bolhas” suspensas no ar, sem lastro na economia real, estouraram e o Estado teve que salvar os bancos. O setor mais reacionário do capital financeiro respondeu à crise acenando com fascismo.
DOGMAS NEOLIBERAIS
Antes, eles conseguiram emplacar os seus dogmas neoliberais na base da conversa. Ganharam sociais-democratas e liberais pelo mundo afora com o pretexto de que não havia outro caminho a não ser aceitar a “nova ordem”. Uma ordem unipolar, de rapina, surgida com a crise do “mundo socialista”. Agora, vislumbram o fascismo como uma de suas armas para manter as benesses do Consenso de Washington.
No Brasil, algumas correntes abraçaram o “Consenso de Washington”, iniciaram a guerra contra a “Era Vargas” e, com raros períodos de resistência, arrasaram a indústria nacional. Ela correspondia a 30% do PIB e, agora, não passa de 11%. O Estado Nacional, construído por Getúlio, foi literalmente desmontado. As estatais foram vendidas ou esquartejadas.
Mesmo tendo destruído a capacidade produtiva brasileira e aprofundado a dependência aos monopólios e ao capital financeiro, mesmo tendo feito a economia nacional entrar no modo especulação desenfreada e regredido ao modelo agrário exportador, havia quem defendesse a justeza desse modelo.
“Temos que nos inserir ‘com a nossa vantagem comparativa’ nas cadeias globais de produtos e serviços”, diziam. E a nossa “vantagem comparativa”, para eles, era o “agro”. E assim, nossa indústria foi sendo desmontada e a pobreza aumentando.
ESTADO MÍNIMO
A conversa fiada de que o Estado tinha que ser reduzido ao mínimo e se afastar de suas obrigações com a nação, e que o “mercado” resolveria tudo, se desmoralizou totalmente. Na pandemia, então, isso ficou cristalino como água.
Os Estados imperialistas mandaram às favas a cantilena de “Estado Mínimo” e abarrotaram seus bancos com dinheiro público. Era o “quantitative easing”, ou seja, trilhões de dólares injetados nas veias dos bancos para alimentar a guerra cambial à favor de suas exportações, da especulação cambial e da tomada de ativos, a preço de banana, na periferia do sistema.
“Normas” foram criadas pelo centro imperialista para intensificar a espoliação dos trabalhadores e dos povos. A principal delas foi o retorno ao ideário retrógrado e colonialista de que os países da periferia só poderiam “gastar o que arrecadam”. Nações foram proibidas de obter crédito barato ou de emitir sua própria moeda.
Durante todo o período colonial, e mesmo durante os anos em que a República foi dominada pela oligarquia cafeeira, o Brasil seguiu essa regra – de gastar só o que se arrecada -, que ajudou a mantê-lo como um país arcaico, atrasado, rural e, por ironia, extremamente endividado, justamente com os bancos ingleses, que impunham essa visão. Com a Revolução de 1930, esse ideário foi finalmente soterrado.
GASTAR E INVESTIR MAIS
Por incrível que pareça, mesmo já tendo superado essa fase há muitas décadas, estamos novamente assistindo ao retorno desse ideário. Mecanismos ultrapassados e imperiais de controle de nossa economia são novamente impostos ao país. “Não se pode gastar mais do que se arrecada”, repete diariamente a mídia banqueirista.
O tripé macroeconômico, imposto ao país pelo Consenso de Washington, e mantido até hoje, além do “arcabouço fiscal”, elaborado pela equipe de Fernando Haddad, são exemplos destes retrocessos e da submissão aos ditames imperiais.
Enquanto esses instrumentos não forem superados, o país seguirá estagnado, oscilando no fundo do poço e tendo, quando muito, pequenos voos de galinha. Crescemos a uma média de 7% ao ano durante 50 anos, de 1930 a 1980. Agora, no entanto, quando atingimos 2,5%, soltam-se rojões, como se estivéssemos no melhor dos mundos.
TRIPÉ MACROECONÔMICO
O “tripé macroeconômico” impõe juros lunáticos e restrições fiscais que impedem o país de crescer. Não importa se o presidente da República deseja a retomada do desenvolvimento. Não importam suas intenções e seus planos. As amarras, os juros e os arcabouços não deixam que esses planos sejam concretizados. Se não vencermos essas barreiras, que são um empecilho intransponível ao crescimento de fôlego, nada ocorrerá de significativo no país, a não ser a volta do fascismo.
A artimanha de separar os gastos primários – gastos com a sociedade e com o desenvolvimento – dos gastos com juros e com a rolagem da dívida, mantendo um controle rígido sobre os primeiros e nenhum sobre os últimos, garante o privilégio da agiotagem em detrimento dos investimentos e da melhoria da vida da população.
Só para se ter um parâmetro, nos últimos doze meses deste ano de 2024, os bancos desviaram R$ 830 bilhões do Orçamento da União para seus cofres, através dos juros da dívida. Se acrescentarmos a rolagem e o principal, chegamos à metade do orçamento. Enquanto isso, o governo segue anunciando cortes nos gastos públicos para garantir a meta de “déficit zero” nas contas públicas primárias.
Há quem considere possível o Brasil crescer mesmo mantendo essas amarras neoliberais. Defendem até uma posição mais radical, que o país gaste menos ainda do que arrecade para pagar os juros de escorcha. É o chamado “superávit primário”. O problema é que, como dissemos, o critério de crescimento dessa gente é muito tímido.
Bastou aquecer um pouco a economia, cair um pouco o desemprego e, na mesma hora, eles ameaçam com elevação dos juros. Enquanto a média de crescimento do país no período citado acima – de 1930 a 1980 – foi de 7% ao ano, nas quatro décadas do neoliberalismo, essa média caiu para 2%.
O crescimento máximo atualmente admitido pelos serviçais e pela elite financeira é um número arbitrário de 3%. Infelizmente, esta taxa é muito aquém do que o país necessita para puxar a retomada do desenvolvimento. A taxa de investimento do país está na faixa de 16,5% do PIB. Um índice que mal dá para a recomposição da depreciação de equipamentos do parque produtivo.
BC VOLTADO PARA O PAÍS
Se quisermos manter esse crescimento quase vegetativo da economia, realmente não precisamos mudar muito as coisas. É só criar um programa social aqui e outro ali para podemos conviver “pacificamente” com a estagnação e os juros lunáticos do BC.
A hora agora é de aproveitarmos a saída do bolsonarista, Campos Neto da presidência do Banco Central “independente”, para virarmos a chave e tornarmos o Banco Central efetivamente independente “dos banqueiros”. Um banco central que seja voltado para os interesses do país.
Reduzir as taxas de juros, elevar os investimentos públicos, acelerar a reindustrialização, aumentar o crédito barato, os salários e as aposentadorias para aquecer o mercado interno. Este é caminho para a retomada do desenvolvimento. Acabar com qualquer teto de gastos produtivos e criar a imposição de um rígido “arcabouço fiscal” sobre as despesas financeiras que alimentam a especulação e aumentam a dívida.
SÉRGIO CRUZ
Achei o artigo incongruente. Se abaixarmos os juros neste momento, e injetarmos mais dinheiro no mercado, fatalmente a inflação vai aumentar, e quem mais vai sofrer serão os mais pobres.
A inflação está em baixa. Os juros altos somente servem para encher os cofres dos bancos com dinheiro público, isto é, com o nosso dinheiro – e não para controlar a inflação. Continue nos lendo que você vai perceber.