“O choro da mãe daquela criança é algo que nunca vou esquecer”, disse Jussara Kdouh que vive no Líbano
A brasileira Jussara Kdouh, de 34 anos, que vive no Líbano relatou ter visto “uma criança de 11 anos morrer dentro de uma ambulância porque não conseguiram chegar ao hospital” depois de um ataque de Israel.
“O choro da mãe daquela criança é algo que nunca vou esquecer”, disse à BBC.
“As ruas estavam tomadas por pessoas tentando escapar. Ficamos presos no trânsito enquanto as bombas explodiam. Vi uma criança de 11 anos morrer dentro de uma ambulância porque não conseguiram chegar ao hospital”, contou.
Jussara falou que as bombas de Israel chegavam cada vez mais perto de sua casa, até que resolveu sair com os filhos e sua mãe em direção a Beirute, capital do Líbano.
“Eu via as explosões pelas janelas. O medo tomava conta, e eu sabia que precisava fazer algo para proteger meus filhos e minha mãe”, contou.
A viagem, que normalmente duraria 1 hora, durou 13. Quando chegou à capital, viu que “muitas pessoas estavam dormindo nas ruas porque não havia mais lugar. Eu consegui um quarto de hotel, mas o medo não nos deixava”.
“Eu tive que abandonar tudo: a casa, os investimentos, os sonhos. Tudo o que construímos no Líbano se foi com essa guerra. Só queremos viver em paz”, continuou.
“Cada bomba que cai faz você se perguntar se vai ver o próximo dia”, afirmou.
Jussara nasceu no Brasil, mas, ainda criança, foi levada pela família para o Líbano. Aos 22 anos, voltou para o Brasil com seu marido. Em junho de 2024, Jussara decidiu ir morar no Líbano para que os filhos, que são brasileiros, tivessem mais contato com a cultura árabe.
“O povo libanês é cheio de fé, mesmo em meio ao sofrimento. Eu amo essa terra, mas hoje, como mãe, a segurança dos meus filhos está acima de tudo. Vou embora levando comigo as memórias da infância e a esperança de um futuro mais seguro no Brasil”.
O governo brasileiro anunciou que vai começar a operação de repatriação dos brasileiros que estão no Líbano. Nesta quarta-feira (2), um avião da Força Aérea Brasileira partiu em direção ao Líbano para fazer o resgate, que deve trazer 200 pessoas.
Jussara conseguiu uma passagem para deixar o Líbano em direção à Turquia no dia 22 de outubro, mas ainda não sabe como virá ao Brasil.
HEZBOLLAH
Jussara falou para a BBC que o Hezbollah, partido que atua no Líbano, não é um movimento terrorista e que “eles protegem a nossa terra”.
“Eu cresci no Líbano vendo o Hezbollah ajudar as pessoas, construindo escolas, hospitais e cuidando da nossa segurança. Eles não são terroristas, eles protegem a nossa terra. Sem eles, estaríamos completamente vulneráveis”, disse.
“As pessoas que vivem fora não entendem a importância deles aqui. Muitos acham que são apenas milicianos, mas a verdade é que eles estão aqui para proteger o país, especialmente do que consideramos ser agressões israelenses”, acrescentou.
“É fácil julgar de fora, mas, para quem vive aqui, o Hezbollah faz parte da vida cotidiana. Eles oferecem suporte e proteção que muitas vezes o próprio governo libanês não consegue oferecer”, completou.
Israel, para “justificar” o assassinato do povo libanês, diz que está em guerra somente contra o Hezbollah, cujo líder Sayyid Hassan Nasrallah já foi morto.