Difícil é convencer a sociedade, reclama o ministro, prometendo que seus cortes não serão tão drásticos como os da Argentina
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou, na segunda-feira (14), em entrevista à jornalista Mônica Bergamo, que pretende convencer o presidente Lula da necessidade de cortar gastos sociais e investimentos públicos para garantir a meta fiscal. Sua meta de zerar o déficit significa a paralisação do crescimento do país.
Ele não fala diretamente em parar o crescimento, que já vem sendo bastante tímido nos últimos anos, mas sabe perfeitamente que o resultado dos cortes propostos por ele será esse. Não é à toa que Lula resiste a fazê-los. O presidente sabe aonde isso vai levar o país.
O Brasil está com uma taxa de investimento de 16,8% do PIB, considerada por muitos economistas como insuficiente até para a reposição do desgaste natural de máquinas e equipamentos. O país já atingiu no passado uma taxa de investimento de 24% do PIB e, atualmente, ela está muito abaixo do necessário para a esperada retomada do desenvolvimento.
A meta, que Lula anunciou na campanha, de fazer mais e melhor do que fez em seus governos anteriores, está sendo substituída pela meta de déficit zero de Haddad. O ministro argumenta que o atingimento da meta é importante para que o Brasil reconquiste o chamado “grau de investimento”.
Quem dá o “grau de investimento” para países e empresas são aquelas agências que avalizaram o banco Lehman Brothers nas vésperas da quebradeira geral de 2008. Além de pouca credibilidade, essas agências só elevam notas dos países que seguem sua cartilha neoliberal e cortam seus investimentos para garantir o pagamentos dos juros em dia.
Um outro problema de quem busca essas “metas” avalizadas pelas agências americanas é que eles acreditam que só capital estrangeiro é quem poderá salvar o Brasil. Capital estrangeiro que no momento só pensa em especular e muito pouco em investir.
Na entrevista, Fernando Haddad tentou minimizar o desastre econômico e social que será para o país – sem falar das consequências políticas – se os cortes de investimentos defendidos por ele forem feitos e o país se mantiver estagnado ou mesmo entrar em recessão.
Ele disse acreditar – ou seja, não tem certeza – que o ajuste fiscal pode ser feito por aqui sem que o Brasil siga o exemplo da Argentina, onde o arrocho neoliberal de Milei provocou uma explosão da pobreza e miséria, sem alterar em quase nada a inflação.
Só de comparar com a Argentina – mesmo dizendo que não será tão grave quanto lá – já fica evidente a gravidade do que está se pretendendo por aqui. A sensibilidade política de Lula, certamente o fará perceber o desastre que ocorrerá se prevalecer esse “bom-mocismo” de Haddad e a insistência doentia dele em agradar o mundo da especulação financeira.
O ministro da Fazenda lembrou que, desde que assumiu, as receitas do governo cresceram, mas os gastos estruturais também aumentaram. O que ele chama de “gastos estruturais” são os salários de servidores, as aposentadorias e as transferências constitucionais a estados e municípios.
Não entra no cálculo do que deve ser cortado os trilionários gastos com os juros da dívida. Uma dívida que cresce fundamentalmente com as despesas públicas provocadas pelos maiores juros do mundo. Só esse ano, em doze meses, o país gastou R$ 855 bilhões só de juros. E as taxas, segundo aponta o Banco Central, vão subir ainda mais, mesmo com a inflação dentro da meta.
Os cortes que Fernando Haddad defende não são nas despesas financeiras. Ele quer cortar nas despesas estruturais, ou seja, Previdência, salários, investimentos, etc. “Será preciso enfrentar os gastos estruturais que podem comprometer as contas no futuro, destacando que a dívida pública só cresce e isso não pode ser ignorado”, argumenta o ministro.
Percebendo o desastre que ele está preparando para o Brasil, o ministro alertou que o maior desafio é convencer a opinião pública e o Congresso a aprovar suas medidas de ajuste. “Cortar é fácil, qualquer economista pode apresentar uma planilha”, afirmou Haddad, enfatizando que é preciso construir politicamente essas decisões.
Ele ameaçou que, se o governo não endereçar adequadamente esses temas, os juros reais da dívida pública, que hoje estão em torno de 7%, “podem se tornar insustentáveis”. De olho fixo nas preocupações da Faria Lima, o ministro frisou que é crucial harmonizar as políticas monetária e fiscal para evitar um ciclo vicioso que prejudicaria ainda mais a economia.
Ele afirmou que as receitas devem voltar ao patamar de 19% do PIB, mas que as despesas precisam ser menores do que isso para gerar superávit. Ou seja, Haddad não quer só zerar o déficit primário, ele quer arrochar ainda mais o país e fazer superávit primário. Isso significa cortar na parte dos recursos que devem ser destinados para a sociedade para que sobrem mais para o setor financeiro.
SÉRGIO CRUZ