Único motivo é garantir o ganho astronômico dos rentistas
Pressionando por juros ainda mais elevados no Brasil, os bancos e instituições financeiras elevaram a expectativa de inflação de 2024 para 4,5%, segundo dados do “Boletim Focus” do Banco Central (BC), divulgados nesta segunda-feira (21).
Na semana passada, os agentes de mercado previam uma inflação de 4,39% e agora 4,5%, isto é, no limite da meta de inflação que foi estabelecida pela equipe econômica do governo Lula. Há 4 semanas as expectativas estavam em 4,37%.
Diante do atual aumento dos preços de energia e alimentos, puxados pelas secas que atingem diversas regiões do país, o mercado financeiro viu mais uma oportunidade para pressionar pela continuidade do aumento do nível da taxa de juros básica (Selic) do BC – que não tem nenhum efeito contra choques de oferta, pelo contrário, piora a situação econômica do país, como destaca o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, que também é ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
“Alimentação é clima. Se o clima for ótimo, eu tenho uma grande safra e o preço cai. Se o clima for ruim, a safra é menor e o preço sobe. Não adianta eu aumentar juros, só vou piorar a economia”, comentou Alckmin na semana passada, em entrevista ao Roda Viva da TV Cultura, ao defender que o BC deveria excluir do cálculo de inflação os preços de alimentação e energia – como já faz o Banco Central norte-americano (Federal Reserve), segundo o ministro.
Hoje, a Selic está em 10,75% ao ano. Mas, até o final deste ano, o “mercado” quer que a taxa chegue aos 11,5%, para frear os investimentos e o consumo no país, sob o pretexto de combater a inflação, que ao longo deste ano tem se mantido comportada.
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, alerta que “a política de juros no Brasil parece estar moldada em benefício do mercado especulativo, em detrimento da economia produtiva”. O empresário ressalta que “a narrativa que orienta a política monetária no país” se baseia “na pesquisa FOCUS”, que é majoritariamente ligada ao setor financeiro.
“A pesquisa é respondida por 170 empresas e instituições, mas chama a atenção que apenas 8 não são diretamente ligadas ao setor financeiro”, observou o presidente da CNI. “Isso levanta uma questão importante: até que ponto as perspectivas da economia real, especialmente da indústria, comércio e serviços, são efetivamente consideradas na formulação das políticas econômicas?, questiona.
Para Ricardo Alban, “se o Brasil quer mesmo evitar perder mais oportunidades de crescimento, precisa rever o papel dos juros na política econômica. O Brasil precisa de uma política industrial consistente e de uma visão de longo prazo, onde o incentivo ao investimento produtivo ocupe o lugar central”, defende o empresário.
“Assim, construiremos um país que privilegie o desenvolvimento e o bem-estar social, ao invés de manter o foco no lucro especulativo de curto prazo”, criticou Alban, em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, neste final de semana.
Com a taxa Selic mantida mais um ano acima dos dois dígitos, a economia brasileira retomou novamente o caminho da desaceleração a partir do segundo semestre deste ano. De acordo com o indicador IBC-BR do BC, o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil cresceu apenas 0,23% em agosto deste ano, após ter caído -0,6% em julho.
Já o Monitor do PIB do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) expõe um quadro ainda menos alvissareiro para a atividade econômica brasileira, ao apontar um recuo de 0,2% no PIB no mês de agosto, sendo o segundo mês consecutivo de queda no indicador. Em julho, o recuo no indicador foi de 0,3%.
Segundo projeções da FGV, o consumo das famílias deve desacelerar de 1,3% para 0,2% no terceiro trimestre deste ano em comparação ao trimestre imediatamente anterior. Já o consumo do governo cai de 1,3% para 0,5%, na mesma base comparativa
Na passagem do segundo para o terceiro trimestre deste ano, a FGV projeta 0% de crescimento da formação bruta de capital – indicador que mede o quanto as empresas aumentaram os seus investimentos em bens como máquinas e equipamentos, na construção civil e em outros ativos fixos.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ainda não divulgou os números oficiais do PIB do terceiro trimestre de 2024. No entanto, pesquisas recentes do IBGE apontam que a indústria, serviços e comércio tiveram um péssimo desempenho entre julho e agosto.
Após ter registrado um recuo de -1,4% em julho, a produção industrial ficou estagnada em agosto (+0,1%). O volume de serviços caiu -0,4% em agosto, depois de variar em alta de apenas 0,2% em julho. Por outro lado, as vendas do comércio recuaram -0,3% frente a julho, mês que cresceu 0,6%.