Para o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o acordo de repactuação das compensações referentes à tragédia de Mariana (MG), que ocorreu em 2015, atende a interesses das empresas. A principal crítica diz respeito aos valores das indenizações individuais para os afetados, considerados baixos. As “compensações” serão financiadas pelas empresas responsáveis pelos danos na região da bacia do Rio Doce, incluindo Vale, BHP e Samarco.
“O Movimento considera que esse Programa de Indenização Definitiva [PID] é muito rebaixado em termos de valores porque a média de indenização no sistema simplificado de indenização, o Novel [modelo de indenização simplificada estabelecido pela 12ª Vara Federal], foi de R$ 90 a R$ 100 mil reais. Então, é um valor muito rebaixado”, disse ao HP Thiago Alves, da coordenação do MAB.
Além disso, continua Thiago, também “cria um ambiente para os atingidos assinarem milhares e milhares de quitações finais, de danos presentes e futuros, por um valor desconhecido, então interessa muito e muito às empresas”, reitera, “porque isso alcança uma grande estabilidade jurídica com essas quitações e se livra da massa dos atingidos, porque as obrigações de fazer estarão com o Estado”, afirma. “Além de desidratar todo tipo de outras iniciativas judiciais para esse direito, como ocorre na ação da Inglaterra”.
“O MAB é contra que a indenização individual neste modelo seja inserida no acordo do jeito que tá, [defendemos que] seja separada dessa parte da repactuação e haja um segundo momento, como foi feito no caso de Brumadinho, para se discutir exclusivamente o direito individual, aí sim, para um programa justo e definitivo”, defende o Movimento.
A tragédia da Barragem de Fundão, operada pela Samarco Mineração, pertencente à Vale e à britânica BHP Billiton, aconteceu em 5 de novembro de 2015, resultando na morte de 19 pessoas. Com o colapso da barragem, uma avalanche de lama devastou dois distritos de Mariana—Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo—e seguiu pelo curso do rio Doce até alcançar o mar, no estado do Espírito Santo.
O valor do acordo seria de cerca de R$ 170 bilhões ao todo, segundo a Vale. Do montante, R$ 38 bilhões são referentes a valores já investidos em medidas de remediação e compensação; R$ 100 bilhões pagos pelas próximas duas décadas ao governo federal, aos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo e aos municípios, enquanto R$ 32 bilhões seriam pagos em obrigações de execução da Samarco.
Em entrevista à F. de São Paulo, o representante dos Atingidos criticou também o prazo de 20 anos para pagamento dos R$ 100 bilhões aos entes públicos. “Um valor baixo para ser repartido em duas décadas”. O MAB ainda aponta a falta de transparência envolvendo as discussões e defende que “muitos pontos precisam ser discutidos e detalhados antes de qualquer decisão final”.
No sábado [19], em coletiva de imprensa em Belo Horizonte, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que tem expectativa de assinar o documento ainda neste mês. O ministro ressaltou que o acordo de reparação de danos “não é motivo de comemoração porque o melhor é que o dano não tivesse acontecido”. “Mas, agora, efetivamente, nós chegamos a um termo que eu entendo que é o possível para a gente minimizar os impactos deste incidente tão grave”, analisou ele.
“Em dezembro de 2022, os governos estadual e federal anunciavam um acordo que, na totalidade, girava em torno de R$ 100 bilhões. Naquele momento, o presidente Lula determinou que nos debruçássemos sobre o acordo para negociações com todos. O acordo foi para R$ 167 bilhões, outro patamar de reparação”, afirmou Silveira.
Após 9 anos, metais liberados durante o rompimento da barragem do Fundão em Mariana [MG] atingem baleias na costa marinha do Espírito Santo e Sul da Bahia, por onde os rejeitos se espalharam, segundo constataram pesquisadores. Além da contaminação das águas do Rio Doce e do mar, animais estão apresentando anomalias e tumores e níveis elevados de metais no sangue.
Peixes, aves, tartarugas, toninhas e até baleias estão entre os animais mais impactados pelos dejetos. Nos estudos anteriores, a contaminação era identificada principalmente em animais microscópicos e da base da cadeia alimentar. Mas agora, ficou provado que os metais também atingiram os grandes animais.
Os dados constam do 5º relatório anual sobre os ambientes de água doce, costeiros e marinhos, ao qual o g1 teve acesso. Esse relatório apresenta as principais conclusões sobre a saúde dos ecossistemas aquáticos monitorados pelo Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática (PMBA) desenvolvido pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
“A gente coleta amostras de água, sedimento, areia e lama dos diversos ambientes: doce, costeiro, praia, manguezais, restingas, plataforma continental, e toda a cadeia trófica, desde o produtor primário, o plâncton, o fitoplâncton, o zooplâncton, larvas de peixes, larvas de caranguejos, bentos (que são os organismos que vivem no fundo), até grandes animais, como cetáceos, aves, tartarugas”, destacou o coordenador técnico do PMBA e professor da Ufes, Fabian Sá, ao portal.
ADOECIMENTO E A DEFORMAÇÃO DOS PEIXES
O adoecimento e a deformação dos peixes prejudicam a pesca, conforme relataram pescadores ao g1. “As pessoas têm preconceito de comprar nosso pescado. Têm medo de passar mal. Antigamente, nosso rio era saudável, mas depois da descida da barragem tudo mudou. Os nossos rios estão doentes”, disse Helena da Silva Vieira Santos. “Minha cunhada, que sempre catou mariscos”, continua a pescadora, “agora fica com coceira quando entra no mangue. As ostras estão manchadas, a pele está lisa com uma espécie de cobertura de minério, brilha à noite. Eu nunca vi isso antes”, relatou.
“Nunca vi uma tartaruga assim. Estava cheia de bolotas, parecia vários tumores, câncer, sei lá. Não sei o que era aquilo. Estava toda ferida e fedendo muito. Acho que estava quase morrendo”, disse ao veículo o pescador Djalma da Neves Fraga.
Um vídeo capturado por pescadores em Aracruz, no norte do Espírito Santo, revela uma tartaruga resgatada no Rio Piraquê-Açu, que apresenta diversas deformações.
De acordo com o coordenador do CTBio [Câmara Técnica de Biodiversidade, Áreas Protegidas, Florestas, Educação Ambiental e Bem-Estar Animal], Frederico Martins, que analisou as imagens, o animal desenvolveu Fibropapulomatose, uma doença causada por vírus, que ataca tartarugas em regiões poluídas, condição que pode estar relacionada com os rejeitos arrastados pela tragédia em Mariana.
“Ocorre em todo o mundo e está relacionada com regiões poluídas. Como os estudos identificaram uma queda na qualidade da saúde desses animais por causa do rompimento da barragem, essa ocorrência pode estar se intensificando”, alertou.
Os dados do relatório anual foram apresentados em Vitória, durante o 5º Seminário Técnico-Científico de Apresentação dos Resultados do Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática (PMBA), no início de setembro.