Entre os novos alvos da cobiça privada estão 134 escolas já construídas, parques, guinchos do Detran e a Fundação Casa
Sob o crescente número de protestos contra as privatizações e diversos confrontos entre manifestantes e a Polícia Militar, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ampliou sua meta de entrega do patrimônio público à iniciativa privada com concessões.
Mesmo com os frequentes protestos nas ruas, Tarcísio anunciou um novo objetivo: arrecadar R$ 500 bilhões para o estado até dezembro de 2026 privatizando tudo que puder. Para isso, o governo paulista planeja realizar 25 leilões e contratos, obter recursos e avançar em seu programa de privatizações.
Essa meta revisada supera a projeção anterior de R$ 400 bilhões, que já foi alcançada em grande parte — com R$ 340 bilhões já leiloados. A venda de ativos como a Sabesp, que gerou valores mais altos que o esperado pelo governo, motivou o reajuste da meta.
As próximas concessões incluem a rodovia Nova Raposo, com leilão previsto para 28 de novembro, e o Alto Tietê Trens Urbanos, marcado para março de 2025. A lista de projetos à venda é vasta, abrangendo desde rodovias, trens e metrôs, até áreas de lazer como piscinas e parques, além de áreas essenciais, como escolas e a Fundação Casa, que abriga menores infratores.
A privatização de bens e serviços tão próxima do cotidiano da população gera forte resistência e apreensão, o que ficou evidente nos protestos contra a privatização das escolas. Em uma série de manifestações, a Polícia Militar foi chamada para conter a população insatisfeita, e a repressão tem sido sempre truculenta.
Estudantes, sindicalistas e ativistas sociais já protestaram contra a venda da infraestrutura das escolas, denunciando que a educação pública está em risco, mas as manifestações foram duramente reprimidas. Essas “marteladas” da Polícia nos protestos demonstram a postura autoritária do governo estadual.
O projeto do governo prevê que as empresas privadas assumam a construção e manutenção das escolas, incluindo serviços de limpeza, segurança e alimentação, enquanto as questões pedagógicas permaneceriam sob responsabilidade de professores e diretores.
Para especialistas e defensores da educação pública, o modelo de privatização imposto pelo governo paulista ameaça transformar a educação em uma mercadoria. Com a entrega da infraestrutura escolar ao setor privado, a autonomia e o caráter público da escola ficam comprometidos, enfraquecendo um dos direitos mais básicos da sociedade.
A deputada estadual Bebel Noronha (PT) e representantes da Apeoesp alertaram para os riscos de entregar as escolas para consórcios cujo foco está no lucro, não no aprendizado dos alunos. “Esse modelo compromete a natureza democrática da escola pública, que deve ser acessível, gratuita e de qualidade para todos. O governo de São Paulo, que já avançou com a privatização em setores como saneamento e transportes, agora mira a educação, seguindo uma lógica que coloca os interesses financeiros acima do direito da população”.
Numa tentativa de explicação da decisão, o governo afirma que a privatização das escolas não inclui a parte pedagógica, que permaneceria sob a secretaria de Educação, focando apenas na construção e manutenção dos prédios. No entanto, esse argumento ignora os riscos de um serviço público essencial passar para as mãos da iniciativa privada, o que poderia levar a um aumento de custos e à redução do controle social sobre essas áreas.
Além disso, Tarcísio parece apostar em uma suposta aceitação da população para com as privatizações. Ele desafia a percepção de que o brasileiro é contrário a essa política, apesar de uma pesquisa Datafolha de 2023 indicar que, embora o apoio às privatizações tenha subido de 20% em 2017 para 38% em 2023, a maioria da população ainda é contra essa prática.
A pesquisa revela que apenas 28% dos simpatizantes do PT apoiam as privatizações, enquanto 70% dos apoiadores do PL são a favor. Contudo, “essa pesquisa foi realizada, no entanto, antes dos apagões da Enel na capital paulista, que pode ter mudado a percepção no Estado sobre as privatizações”, diz Luciana Chong, diretora do Instituto Datafolha.
A preocupação dos cidadãos tende a aumentar quando as privatizações ocorrem em áreas tão próximas da vida cotidiana. “As concessões de projetos em áreas mais próximas da vida das pessoas, como escolas ou cemitérios, são apostas arriscadas, porque os custos aumentam rápido e os benefícios só vêm no longo prazo”, alerta Chong.
Mesmo durante a campanha de reeleição, o prefeito Ricardo Nunes foi pressionado a responder sobre a privatização dos serviços funerários, que poderia encarecer, gerando grande revolta na população.
A ampliação das privatizações e concessões coloca em debate o futuro do estado de São Paulo e o impacto dessas decisões para a população, que já vem enfrentando custos cada vez mais altos em áreas essenciais, sem garantias de retorno dos benefícios prometidos.