“Agora, acho que passar a mão na cabeça de episódios, como o que teve aqui”, diz Luís Roberto Barroso sobre o atentado a bomba, rejeitando “naturalizar o absurdo”
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, defendeu a punição dos envolvidos em atos golpistas, como no caso do 8 de janeiro de 2023, quando uma turba de bolsonaristas raivosos invadiu e vandalizou a Praça dos Três Poderes.
A declaração foi feita na quinta-feira (14), após o bolsonarista-bomba ter atacado o Supremo.
“A anistia antes mesmo da condenação parte do pressuposto de que não aconteceu nada grave nem relevante, acho que é um equívoco”, declarou a jornalistas, na sede da Corte.
“A discussão sobre anistia é uma discussão própria do Congresso, pela Constituição. Agora, acho que passar a mão na cabeça de episódios como o que teve aqui… Isso aqui foi tudo destruído por pessoas que se articularam. Portanto, é preciso responsabilizar”, declarou após ser questionado sobre o projeto de lei bolsonarista que visa anistiar os presos do 8 de janeiro, o PL da Anistia.
“O discurso de que algumas pessoas inocentes e ingênuas estiveram aqui não é um discurso verdadeiro”, acrescentou.
“No contrário, nas próximas eleições, quem perder vai achar que pode fazer a mesma coisa e a gente naturaliza o absurdo”, disse
Até 7 de novembro, cerca de 265 pessoas já haviam sido condenadas pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 3023.
O presidente da Corte deixou claro que o gesto de Francisco Wanderley Luiz, o fascista que explodiu bombas em frente ao STF, é o mais novo episódio de sequência de ataques às instituições da República — sobretudo ao Poder Judiciário — e ao Estado Democrático de Direito.
Ao abrir a sessão, Barroso listou eventos do fascismo relacionados aos bolsonaristas Daniel Silveira, ex-deputado federal — que, entre outras afrontas à Corte, disse que o ministro Edson Fachin merecia “surra de gato morto” —, relembrou.
E Roberto Jefferson — que chamou a ministra Cármen Lúcia, atual presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de “prostituta” —, além da deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP) — que às vésperas do segundo turno da eleição de 2022 perseguiu, de arma em punho, pelas ruas de São Paulo, homem que havia feito a ela provocação política.
“GROSSERIA E INCIVILIDADE”
“Em fevereiro de 2021, um deputado [Daniel Silveira] divulgou um vídeo com discurso de ódio, ofensas e ameaças aos ministros do Supremo Tribunal Federal, num grau inimaginável de grosseria e incivilidade. Em outubro de 2022, um parlamentar, notório por esquemas variados, desrespeita ordem do STF e ataca os policiais federais com fuzis e granadas”, continuou.
“Disse que era em nome da liberdade. Em outubro de 2022, uma parlamentar [Carla Zambelli] persegue de arma em punho um cidadão que havia se manifestado criticamente, em tom, aliás, muito menos grave do que aquele a que todos nós vínhamos sendo submetidos”, listou.
Apesar de afirmar que o extremismo deve ser combatido com punições severas, Barroso fez exortação à volta da civilidade no debate político.
“Onde foi que nos perdemos nesse mundo de ódio, intolerância e golpismo? Por que, subitamente, se extraiu o que havia de pior nas pessoas? Porém, mais do que procurar os inspiradores dessa mudança na alma nacional, o que nós precisamos é fazer o caminho de volta à civilidade, ao respeito mútuo. Onde foi que perdemos a luz da nossa alma afetuosa, alegre e fraterna para a escuridão do ódio, da agressividade e da violência?”, questionou.
ATENTADO MAIS GRAVE À CORTE
Mais cedo, em aula magna no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), o ministro Alexandre de Moraes — relator do inquérito que investiga os atos golpistas — reforçou que o ataque ao STF “não é um fato isolado do contexto” e apontou as explosões como o atentado mais grave à Corte desde o 8 de janeiro de 2023.
E também responsabilizou Bolsonaro e o governo dele pela radicalização política, fomentada pelo chamado “gabinete do ódio” — grupo de auxiliares palacianos do ex-presidente que promoviam ataques e disseminavam desinformações nas redes digitais.
“Queira Deus que seja um ato isolado. Mas é um contexto que se iniciou lá atrás, quando o famoso ‘gabinete do ódio’ começou a destilar discurso de ódio contra as instituições e contra o Supremo Tribunal Federal, principalmente”, enfatizou.
“SEM ANISTIA A CRIMINOSOS”
Moraes lembrou os atos golpistas e os ataques contra a autonomia do Judiciário, ministros do Supremo e as respectivas famílias dos magistrados. O magistrado destacou a necessidade de pacificação do País, mas defendeu que isso não será feito perdoando criminosos.
“Ontem [quarta-feira] foi uma demonstração de que só é possível essa necessária pacificação do País com a responsabilização de todos os criminosos”, disse.
“Não existe a possibilidade de pacificação com anistia a criminosos”, afirmou, referindo-se à PEC da Anistia, que pretende suspender as penas dos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
E, consequentemente, a Bolsonaro, cujos direitos políticos-eleitorais foram cassados pelo TSE e ratificado pelo STF.
“MAIS AGRESSIVIDADE”
“O criminoso anistiado é um criminoso impune. E a impunidade vai gerar mais agressividade, como gerou ontem [quarta-feira], que as pessoas acham que podem vir até Brasília tentar entrar no Supremo Tribunal Federal para explodi-lo”, apontou.
Isso, “porque foram instigadas por muitas pessoas, lamentavelmente várias, com altos cargos da República”, frisou.
O ministro observou que o radicalismo político no Brasil, nos últimos anos, “foi se avolumando sob o falso manto de uma criminosa utilização da liberdade de expressão”, destacou.
“Em nenhum lugar do mundo, ofender, ameaçar e coagir é liberdade de expressão. Isso é crime. Isso foi se agigantando e resultou, a partir da tentativa do descrédito das instituições, no 8 de janeiro”, criticou.