Maria Elizabeth Rocha comparou a tentativa de golpe dos bolsonaristas com 1964 e defendeu a democracia. “Se a gente pisca o olho, ela pode escapar dos nossos dedos”.
A ministra do Superior Tribunal Militar (STM), Maria Elizabeth Rocha, que assumirá a presidência do órgão no dia 12 de março, afirmou que os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 são “uma ferida aberta que vai custar para cicatrizar” e que é “precoce” a discussão sobre uma possível anistia aos envolvidos.
Na entrevista à colunista Malu Gaspar do jornal O Globo, ela afirmou que o ocorrido, “deu uma lição para todos nós, cidadãos brasileiros, de que a democracia é um processo continuado. É um pacto intergeracional, igual às Constituições, e que nós sempre devemos estar de olho no que acontece ao nosso redor, na República, nas arenas públicas de discussões”, porque “a liberdade é perigosa. Se a gente pisca o olho, ela pode escapar dos nossos dedos”.
Segundo a ministra, a tentativa de golpe “vai ser como 64, vai incomodar ainda por muitas décadas”.
Na entrevista, a ministra falou sobre a atuação das Forças Armadas e a importância da justiça militar nesse momento. Maria Elizabeth é uma entre os cinco representantes civis do tribunal militar, formado por 15 magistrados, e a única mulher a integrá-lo.
Sobre a possibilidade de anistia aos envolvidos nos atos que culminaram com a invasão e a depredação da sede dos Três Poderes em Brasília, a ministra disse que, além de ser “precoce” se falar sobre isso, “nem todos os réus ainda foram julgados, apenados – e outros ainda vão ser denunciados. Então é preciso aguardar para que todos os autores e perpetradores do 8 de Janeiro sejam efetivamente julgados”.
Para Maria Elizabeth, “é preciso que se tenha em conta toda a cena do crime”, para se pensar em “perdão”.
“Podemos dizer que, pelo visto, não foi só a depredação do Palácio do Planalto, do Supremo e do Congresso. Ela extrapolou a Praça dos Três Poderes, e aí é preciso ter consciência do que realmente poderia acontecer para se valorar a possibilidade ou não desse perdão”, afirmou.
De acordo com ela, o 8 de Janeiro “é um fantasma que nos atormenta, e que nos obriga a ficarmos vigilantes e reflexivos”.
“Aqueles que têm um pensamento de vanguarda, que querem que o país progrida, que querem reformar as instituições e distribuir a riqueza de uma forma igualitária, também andamos falhando muito. Os setores progressistas da sociedade têm falhado muito também com as camadas populares”, pontuou.
Perguntada sobre o desconforto nas Forças Armadas causado com os indiciamentos e condenação de militares de alta patente, a ministra disse que, “sem dúvida” há desconforto, porque “a instituição acaba pagando pelo mal agir de determinados membros que a integram”.
“Realmente é desconfortável, do mesmo jeito que é desconfortável demais para o Poder Judiciário quando há suspeitas de corrupção de assessores ou de magistrados, não importa. É desconfortável para qualquer instituição, mas tem que enfrentar. Vai colocar sujeira debaixo do tapete? Não pode ser, não em uma República, não em uma democracia”, disse.