A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em seminário com procuradores no dia 30, voltou a criticar a portaria do governo Temer, que dificulta o combate ao trabalho escravo no Brasil. “A Constituição quer que defendamos a dignidade e a igualdade de todos os brasileiros. Nunca seremos iguais se não formos iguais em dignidade”, disse Dodge.
Segundo Raquel Dodge, “não podemos admitir retrocesso no conceito de trabalho escravo porque aquele conceito alcançado nessa portaria está apenas a dizer que a escravidão é uma questão de ofensa a um certo grau da liberdade humana. Ela é muito mais do que isso. A escravidão fere a dignidade humana. E aquela portaria implica em uma mudança de um conceito que está sedimentado em lei e na política pública que vem sendo praticada no país nos últimos 30 anos. É por isso ela representa um claro retrocesso nas nossas instituições”, declarou a procuradora no seminário “Impactos da Sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Fazenda Brasil Verde”, realizado na Escola Superior do Ministério Público da União. A Corte Interamericana condenou o Brasil por omissão e negligência no caso de trabalhadores resgatados de uma fazenda no Pará no ano passado.
Dodge defendeu que as penas aplicadas para empregadores que cometem este tipo crime devem ser mais duras. “Uma das críticas que faço à atual disciplina do Código Penal Brasileiro no tocante a esse crime é que a pena mínima é muito baixa. O juízes em geral aplicam a pena mínima àqueles que não são reincidentes, o que leva a uma punição que permite a conversão da pena de prisão em uma das penas alternativas – pagamento de cestas básicas, prestação de serviços à comunidade -, algo importante para a reeducação do infrator, mas que é, de todo modo, na minha opinião, desproporcional ao que ele fez a outros seres humanos”, explicou a procuradora.
Para Dodge, “o que o agente deste crime faz é transformar aquela pessoa em um objeto, alguém que satisfaça seus interesses, e o seu interesse não é apenas cercear a sua liberdade, é usar aquela pessoa para uma finalidade que satisfaça o interesse desse agente. Transforma aquela pessoa em um objeto à semelhança do que fazemos no exercício do direito de propriedade”, completou.