“Enquanto o controlador está se comunicando com os pilotos do helicóptero e do jato, os dois conjuntos de pilotos podem não ser capazes de ouvir um ao outro”, de acordo com The New York Times. O resultado foi 67 mortos na pior colisão aérea nos EUA em 24 anos.
Um relatório preliminar da Administração Federal de Aviação (FAA) revelou, na quinta-feira (30) que apenas um controlador de voo da torre de controle – quando o normal são dois – orientava tanto o avião da American Airlines quanto o helicóptero militar no momento da colisão aérea sobre o aeroporto Ronald Reagan, em Washington, que matou 67 pessoas.
A equipe no momento da tragédia “não era normal para a hora do dia e o volume de tráfego”, admitiu a FAA, cujo novo presidente sob Trump só foi anunciado após o desastre.
Conforme o The New York Times relatou, os controladores usam diferentes frequências de rádio para se comunicar com os pilotos de helicóptero e os que pilotam aviões. “Enquanto o controlador está se comunicando com os pilotos do helicóptero e do jato, os dois conjuntos de pilotos podem não ser capazes de ouvir um ao outro”.
A colisão foi o mais letal acidente de aviação em 24 anos nos EUA, e o voo 5342 já estava prestes a pousar quando houve o choque com o helicóptero UH-60 em manobra de treinamento. O Bombardier se quebrou em três partes e caiu emborcado no rio Potomac, mesmo destino do helicóptero.
Não se sabe porque o helicóptero não respeitou a preferência para o jato civil, após ter sido instruído nesse sentido. Era uma noite clara e a tripulação militar tinha óculos de visão noturna.
As duas caixas pretas foram recuperadas. As causas da tragédia aérea estão sendo investigadas pelo National Transportation Safety Board (NTSB) e pela FAA, com previsão de um mês para o relatório preliminar.
De acordo com a Aviation Today, em 2019, a FAA permitiu que aeronaves militares voando “operações sensíveis” nos EUA desligassem seus sistemas de transmissão automática de vigilância dependente (ADS-B) devido a preocupações de que a tecnologia de rastreamento por satélite pudesse comprometer a localização do veículo. Não se sabe se esse foi o caso no acidente de quarta-feira, mas era de um treinamento desse tipo que o UH-60 participava.
MAIS 25% DE ‘QUASE COLISÕES’ EM UMA DÉCADA
Segundo a Associated Press, na véspera quase houve outro acidente, envolvendo também um jato e um helicóptero. Um artigo do Times de 2023 observou que “chamadas próximas” e quase colisões entre pilotos aumentaram quase 25% na última década.
“Nossa nação está enfrentando uma crise de segurança da aviação”, afirmou a senadora oposicionista Tammy Duckworth, veterana militar e piloto de helicóptero. “Quase acidentes ocorrem com muita frequência, e eu me recuso a ser complacente em esperar para agir até que a próxima incursão na pista resulte em uma colisão fatal.”
Curiosamente, o aeroporto de Washington foi denominado em homenagem a Ronald Reagan, o presidente republicano que demitiu em 1981 os controladores de voo em greve e deu fim a seu sindicato.
No ano passado, sob pressão das empresas aéreas o Congresso dos EUA aprovou mais voos para o sobrecarregado aeroporto. Na época, o senador democrata que se opusera, Tim Kaine, profetizou: “Deus me livre de acordar e olhar no espelho um dia e dizer: ‘uau, fui avisado. Fui avisado e não deveria ter feito isso”.
A sobrecarga no trabalho dos controladores de voo acarreta doenças, aposentadorias precoces e até suicídios. No ano passado, a FAA, o sindicato dos controladores e a Associação Nacional de Controladores de Tráfego Aéreo negociaram um novo cronograma com mais horas de folga entre os turnos: 10 horas de folga entre os turnos, 12 horas de folga antes e depois do turno da meia-noite e um limite de horas extras consecutivas
CIRCO DE TRUMP AGRAVA O QUADRO
Apesar de todo o circo de Trump para atribuir os problemas no controle de voos à contratação pela gestão anterior de deficientes físicos e até anões, surgem a todo o momento mais denúncias sobre a degradação da infraestrutura de aeroportos dos EUA em curso, condições de trabalho dos controladores e restrições orçamentárias.
O que só piorou com a enxurrada de ordens executivas da primeira semana da volta de Trump à Casa Branca. Decretou uma paralisação inconstitucional de grande parte do governo federal, até ser bloqueado por um juiz. Então, ameaçou demitir todos os funcionários federais, incluindo os controladores de tráfego aéreo da FAA, pagando oito meses de indenização. Também demitiu todos no Comitê de Segurança da FAA.
Aliás, se não se tratasse de Trump alguém até poderia ficar assombrado com o que o presidente bilionário arrotou, em busca de bodes expiatórios. Ele disse que a FAA, em busca da diversidade, contratou “pessoas com deficiência, incluindo nanismo, membros ausentes e deficiências intelectuais”.
A repórteres, ele acrescentou ainda, responsabilizando “Obama”, que “um grupo dentro da FAA determinou que a força de trabalho era muito branca, então eles fizeram esforços conjuntos para fazer com que o governo mudasse isso e mudasse imediatamente”. Na verdade, como registrou o People’s World, “84% dos controladores são brancos”.
FALTA CRÔNICA DE PESSOAL
Em 2023, a torre perto de Washington, tinha 19 controladores de tráfego aéreo totalmente certificados. A FAA e o sindicato dos controladores dizem que o número ideal é 30.
No mesmo ano, o Departamento de Transportes revelou que 77% de todas as instalações de controle de tráfego aéreo estão com falta de pessoal. Em Nova York, essas instalações estão operando com 54% da força de trabalho necessária.
Há dois anos, em uma audiência ao Comitê de Transporte da Câmara dos deputados, o então presidente da Associação Nacional de Controladores de Tráfego Aéreo (NATCA), Rich Santa, advertiu que “o Sistema Nacional de Espaço Aéreo permanece perto de uma baixa de 30 anos no número de controladores totalmente certificados”.
“No final do ano fiscal (FY) de 2022, havia 1.200 controladores profissionais certificados (CPCs) a menos empregados pela FAA do que uma década antes e 6% dos que permanecem são elegíveis para se aposentar.”
Note-se, como registrou o Washington Post, que o aeroporto Reagan, localizado em uma região que “apresenta alguns dos desafios mais complexos do país para os pilotos, exigindo que eles confiem em camadas de procedimentos e salvaguardas eletrônicas para evitar uma catástrofe”, tanto pela proximidade com a Casa Branca, o Capitólio e o Pentágono, quanto por operacionalizar voos militares. Construído para atender 15 milhões de passageiros anualmente, agora lida com 25 milhões.