A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), que catapultou os juros de 12,25% para 13,25%, mal saiu do papel e o representante de um dos maiores bancos privados nacionais, Fernando Honorato, economista-chefe do Bradesco, já prevê que a economia brasileira entrará em recessão em 2025, ainda no 2º semestre.
A declaração foi dada em entrevista ao programa VEJA Mercado. “O Banco Central foi assertivo ao dizer em seu comunicado que há possibilidade de a economia esfriar mais do que o imaginado. É exatamente o que nós esperamos. Nós antevemos que com o juro a 15,25% ao ano, nossa projeção atual, a economia brasileira estará em recessão no segundo semestre deste ano”, disse.
Honorato fez coro com os argumentos utilizados pelo Copom para colocar o Brasil na segunda posição entre os países com maior taxa de juros do mundo, bem acima da média mundial de 1,34% em 40 países pesquisados, e previu que o PIB do 1º trimestre será impulsionado pela agricultura e que a desaceleração do consumo e dos investimentos será sentida a partir do 2º e do 3º trimestre do ano.
“O agro será um espetáculo em 2025 e vai inflar o PIB no 1º trimestre. Entretanto, já veremos o consumo e o investimento esfriarem no 2º trimestre e nossa expectativa é que o PIB seja ligeiramente negativo no 3º trimestre”, argumentou, para alívio dos bancos e rentistas em geral.
Com um juro real a 9,18% e com perspectiva, já anunciada pelo Copom de Galípolo, de chegar a 11,18%, considerando a inflação do momento, não há notícia boa para quem vive do trabalho e da produção, pois a escalada da ciranda financeira ficará absolutamente irrefreável.
Se havia alguma dúvida sobre os propósitos do Copom de conter qualquer possibilidade de crescimento da economia, Honorato abriu o jogo e revelou a aposta que o setor financeiro está fazendo, sempre, é óbvio, sob o falacioso e surrado argumento de controlar a inflação, cujas causas, como já demonstraram inúmeros especialistas na matéria, são externas e não internas, portanto, carecem de um decidido freio de arrumação por parte do governo, especialmente no que diz respeito a câmbio, estoque regulador de alimentos e outros bens de primeira necessidade e ruptura (não a suavização, como ocorre atualmente) com a política do Preço de Paridade Internacional, implementada pela Petrobras em 2016, ainda na gestão de Michel Temer, que tirou do País sua condição de controlar os preços dos combustíveis, algo que os consumidores voltaram a sentir no bolso esta semana com a majoração do diesel e da gasolina.
O fato é que o Copom segue uma lógica de só ouvir os ocultos dealers do mercado financeiro, nada mais que representantes de bancos e corretoras, que atuam como intermediários do Banco Central, especialmente no mercado primário e secundário de títulos públicos. Na prática, os maiores beneficiários dos juros reais praticados pelo BC, absolutamente apartados da economia real, ou seja, do a realidade do setor produtivo e dos trabalhadores do Brasil.
Essa gente, certamente, deve ter alergia a um chão de fábrica, acostumados que estão com o conforto de seus escritórios refrigerados da Faria Lima. Pois bem! São esses agentes do rentismo que, em última instância, dão as cartas no Banco Central, e, agora, mais do que nunca, depois da ardilosa “autonomia” da instituição.
A arrogância deles é tanta que não se bastam com a política monetária que está sob a responsabilidade do BC, que a utiliza, como ocorreu frequentemente na gestão de Campos Neto, para chantagear o governo a praticar uma política fiscal restritiva, o que, infelizmente, mesmo a contragosto do presidente Lula, aconteceu, em algumas ocasiões, com o beneplácito do ministro Haddad, iludido que as concessões à Faria Lima reduziria os juros. Agora, é hilário vê-lo reclamando reconhecimento, pois, segundo ele, foi mais eficiente que Guedes e Meirelles na tarefa de zerar o déficit primário.
Afinal de contas, o problema do Brasil não são os quase R$ 1 trilhão que o País paga de juros anualmente aos bancos e rentistas, mais7, sim, o salário mínimo, as aposentadorias, o abono salarial, os programas sociais e o Fundeb, vítimas do último pacote fiscal.
A taxa brasileira de juros reais só perde para a da Argentina que encontra-se em 9,36%. A média geral, entre os 40 países pesquisados, está em 1,34%, sendo que em 13 países o juro real está negativo ou em torno de zero e em 14 países não passa de 2%.
Resta-nos no momento apenas o conforto de que o extremista de direita da Argentina, o Milei, está praticando uma taxa ainda maior, mas, pela previsão de Honorato, logo, logo, ultrapassaremos nossos hermanos nesse quesito, criando um ambiente para a acalentada recessão.
Há tempo para reagir e parece que até o ministro Haddad, que conhece bem Galípolo, começou a se incomodar com os juros na estratosfera, afinal, persistindo essa escalada perversa, até mesmo os empregos, ainda que precarizados, e a renda, ainda que comprimida, gerados nesse período mais recente, acabarão indo para o ralo.
Nunca é demais repetir: só aos inimigos da democracia interessa o flerte da política macroeconômica com o risco de caos social previsto tacitamente pelo funcionário do Bradesco ao prenunciar um quadro de recessão ainda este ano.
MARCO CAMPANELLA