Na última terça-feira (4), a Justiça Federal concedeu uma reparação econômica mensal vitalícia no valor de R$ 34.577,89 para a publicitária Clarice Herzog, de 83 anos, viúva do jornalista Vladimir Herzog, torturado e morto pela ditadura militar em 1975.
A decisão, proferida pelo juiz Anderson Santos da Silva, da 2ª Vara Federal Cível do Distrito Federal, atendeu a um pedido de tutela de urgência. A sentença, no entanto, não é definitiva, pois a União Federal, ré no processo, ainda pode contestar a decisão.
O magistrado destacou em sua decisão: “Diante das fartas evidências a respeito da detenção arbitrária, da tortura e da execução extrajudicial de Vladimir Herzog, o pedido autoral de reconhecimento da sua condição de anistiado político, com as suas consequências legais, apresenta plausibilidade jurídica”.
Ele também determinou: “O valor da reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada deve ser fixada em R$ 34.577,89, valor que estará sujeito a reavaliação durante a instrução probatória. Também está presente o perigo de dano, pois a parte autora – pensionista – é pessoa com 83 anos e com diagnóstico de Doença de Alzheimer em fase avançada”.
O valor corresponde ao salário do cargo que Vladimir Herzog ocupava como diretor do departamento de jornalismo da TV Cultura.
Em nota, o Instituto Vladimir Herzog e a família Herzog celebraram a decisão judicial. “Esta importante decisão, que ainda não é definitiva, acontece no marco de 50 anos desse crime e de incansável luta de Clarice por justiça para Vlado. A medida foi deferida no escopo da ação que busca a declaração de anistiado político post-mortem de Vladimir Herzog, cumulada com pedido de reparação econômica em favor de Clarice, nos termos da Lei de Anistia”, diz o texto.
Segundo os advogados Beatriz Cruz e Paulo Abrão, do escritório Cruz e Temperani, responsáveis pela ação, “ainda há um longo caminho até a decisão de mérito no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), mas a concessão da medida liminar é um importante marco que garante o imediato pagamento da prestação mensal devida à viúva”.
Em abril do ano passado, a Comissão de Anistia aprovou, por unanimidade, o reconhecimento da condição de anistiada política de Clarice Herzog. A decisão admitiu que o Estado brasileiro perseguiu Clarice e sua família durante o regime militar, em razão do movimento liderado pela publicitária para esclarecer o assassinato do marido.
A Comissão também assegurou a Clarice o direito a uma reparação econômica, que deverá ser paga pelo Ministério do Planejamento em até 60 dias após a publicação da portaria que reconhece a condição.
“O Instituto seguirá trabalhando ao lado da família Herzog pelo cumprimento dos demais pontos resolutivos da sentença da Corte Interamericana, que não integram o escopo da ação no TRF1, como a responsabilização dos agentes públicos que praticaram crimes contra a humanidade durante a ditadura, e o cumprimento das recomendações da Comissão Nacional da Verdade”, finaliza a nota do Instituto Vladimir Herzog.
Viúva aos 34 anos, Clarice Herzog liderou um movimento que questionou e cobrou a investigação da versão do Exército sobre a morte de Vladimir Herzog.
Vladimir Herzog era diretor de jornalismo da TV Cultura quando foi convocado pelo Exército para prestar depoimento sobre supostas ligações com o PCB, partido contrário ao regime militar. Em outubro de 1975, o jornalista compareceu ao prédio do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) e nunca mais foi visto com vida.
A versão oficial do Exército à época afirmava que Herzog teria se suicidado por enforcamento com um cinto, o que foi posteriormente desmentido. Vladimir Herzog foi torturado e assassinado por militares.
Em 2013, a Justiça de São Paulo determinou a emissão de um novo atestado de óbito à família Herzog, substituindo “asfixia mecânica por enforcamento” por “lesões e maus tratos sofridos durante o interrogatório em dependência do 2º Exército (Doi-Codi)” como causa da morte.
Agora, quase cinco décadas depois, a luta de Clarice Herzog por justiça e reparação continua a ecoar, reafirmando a importância da memória e da verdade histórica.