A decisão do Corregedor Nacional da Justiça, Humberto Martins, de pedir explicações à desembargadora Kenarik Boujikian, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), por seus comentários às declarações de Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre o golpe de 1º de abril de 1964, é, no mínimo, esdrúxula – e, no limite, intimidatória.
A desembargadora declarou, em evento público, na segunda-feira (15/10), que “um ministro do Supremo Tribunal Federal chamar de movimento um golpe reconhecido historicamente é tripudiar sobre a história brasileira. De algum modo é desrespeitar as nossas vítimas”.
A jurista comentava o que fora dito por Dias Toffoli, em conferência na Faculdade de Direito da USP: “Não foi um golpe nem uma revolução. Me refiro a movimento de 1964” (v. Juízes repudiam declarações de Toffoli sobre golpe de 1964).
Naturalmente, se há alguém que está devendo explicações é Toffoli – e não a desembargadora Kenarik Boujikian.
Esta apenas disse o que já passou para a História do Brasil. Quem está desrespeitando a História – e, inclusive, as vítimas da ditadura instalada pelo golpe de 64 – é Toffoli.
No entanto, o Corregedor deu 15 dias para que a desembargadora se explique, baseado em que “a Constituição proíbe os juízes de dedicar-se à atividade político-partidária e a Lei Orgânica da Magistratura Nacional veta ao magistrado manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério”.
A desembargadora não exerceu nenhuma “atividade político-partidária” nem se manifestou sobre “processo pendente de julgamento” ou fez qualquer “juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças”.
O que ela fez foi afirmar uma verdade – uma verdade histórica, que está em qualquer livro respeitável sobre o período; uma verdade que Toffoli tentou escamotear para bajular Bolsonaro e caterva.
Quando foi proibido aos juízes se manifestar em relação a acontecimentos históricos ou travar polêmica sobre eles?
Em São Paulo, a desembargadora confirmou o que havia dito – que, realmente, é sua opinião que chamar o golpe de 1964 de movimento “é tripudiar a história brasileira, suas vítimas e toda a humanidade”. Acrescentou que considera o regime oriundo desse golpe uma ditadura.
Em Brasília, perguntado se sua declaração era um “aceno” para Bolsonaro e sua trupe, Dias Toffoli respondeu que “de maneira nenhuma”.
C.L.