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“O Caso da Vara e outros casos da escravidão”, uma coletânea de contos de Machado de Assis ganhará uma nova edição pela Editora Página 8. A publicação, que está em campanha de pré-lançamento pelo site do Catarse, reúne três contos fundamentais do autor: “O Caso da Vara” (1891), “Pai Contra Mãe” (1906) e “Mariana” (1871).
A edição conta com prefácio e ensaio de Carlos Lopes, diretor de redação da Hora do Povo e vice-presidente do PCdoB, para quem as obras reunidas nesta edição “são uma demonstração magistral, técnica e humana (se é possível técnica sem uma profunda humanidade), desse conteúdo social e político, que então abalava o império e o escravismo”. Em seu texto, o autor aborda a relação entre o Machado e a abolição da escravatura:
“Hoje é um consenso — a rigor, uma unanimidade — que Machado de Assis é o maior escritor da nossa história literária.
Não é algo fácil atingir esse posto em uma literatura onde existem artistas como Graciliano Ramos e Guimarães Rosa, para ficarmos nos prosadores. Sobretudo, considerando que Machado, mulato (ou, se o leitor quiser, negro), escreveu e publicou suas obras principalmente em um Brasil escravagista, onde a própria superestrutura política e jurídica — o império — tinha como fundamento a escravidão.
Mas, exatamente nessa situação de Machado no século XIX e princípios do século XX, está um dos grandes problemas — melhor seria dizer, uma das grandes injustiças — em relação ao que produziu.
Frequentemente o grande escritor é retratado como indiferente à escravidão, logo ele, abolicionista e amigo de abolicionistas como Joaquim Serra e Joaquim Nabuco.
Esse julgamento mostra, mais do que pouca atenção à obra de Machado, uma má vontade infinita (e preconceituosa) para com um homem que abriu os seus caminhos do modo mais aflitivo — porém, mais hábil — possível.
O conto de abertura, o que dá nome ao livro, um dos mais conhecidos de Machado de Assis, narra a história do jovem Damião, que foge do seminário e se abriga na casa de Sinhá Rita. Mas é em torno de Lucrécia, a menina feita de escrava, que o autor expõe sua denúncia.
Sinhá Rita tinha quarenta anos na certidão de batismo, e vinte e sete nos olhos. Era apessoada, viva, patusca, amiga de rir; mas, quando convinha, brava como diabo. Quis alegrar o rapaz, e, apesar da situação, não lhe custou muito. Dentro de pouco, ambos eles riam, ela contava-lhe anedotas, e pedia-lhe outras, que ele referia com singular graça. Uma destas, estúrdia, obrigada a trejeitos, fez rir a uma das crias de Sinhá Rita, que esquecera o trabalho, para mirar e escutar o moço. Sinhá Rita pegou de uma vara que estava ao pé da marquesa, e ameaçou-a:
– Lucrécia, olha a vara!
Além do prefácio, a edição inclui o ensaio Machado de Assis e a luta pelo fim da escravatura, também de Carlos Lopes, publicado em 13 de maio de 2016. Para o autor, foram muitas as contribuições de Machado pelo fim da escravidão, e a principal delas “esteve, naturalmente, em ser Machado de Assis”.
O projeto de edição do livro é feito por meio de financiamento coletivo pela plataforma Catarse e a campanha de apoio ocorre até o final de março. Os apoiadores que contribuírem durante o pré-lançamento, além dos descontos nos valores, podem escolher também outras recompensas que, junto com o exemplar, serão entregues pelos Correios ao final do período.
“O Caso da Vara e outros casos da escravidão”
Campanha Financiamento Coletivo