
Interceptações telefônicas revelam planos de obstrução de Justiça e destruição de evidências por ordem de líder da organização
Um funcionário da Larclean, empresa investigada pela operação Overclean, em interceptação telefônica da PF (Polícia Federal) fala com outro amigo sobre “operação limpeza”, com o uso de trituradores para destruir documentos 4 dias após a PF apreender R$ 1,5 milhão e a contabilidade clandestina do grupo suspeito em avião que saiu de Salvador, com destino a Brasília. As informações são da coluna de Fábio Sarapião, do portal Metrópoles.
A operação apura fraudes em contratos milionários com recursos em parte custeados por emendas parlamentares.
A empresa tem ligação com os irmãos Fábio e Alex Parente, que, ao lado do empresário José Marcos de Moura, conhecido como o “Rei do Lixo”, são apontados como lideranças do grupo investigado pela PF.
OBSTRUÇÃO DE JUSTIÇA
A conversa interceptada dia 7 de dezembro de 2024 deu origem à 3º fase da operação autorizada pelo ministro Kassio Nunes Marques, do STF (Supremo Tribunal Federal). Um dos crimes investigados nessa fase é o de obstrução de Justiça.
“O conteúdo das conversas revela que a destruição das evidências foi planejada em atendimento a uma ordem direta de Alex Rezende Parente, líder identificado da organização criminosa”, está escrito em relatório da PF.
Leia trechos da interceptação:
GERALDO: Fala, gatão…
IURI: Diga aí, autoridade…tava no Waze, senão ia me perder, porque eu
não conheço…
GERALDO: Ah, tá, entendi… Não, tava na LARCLEAN, tava despachando lá
com o ALEX. Rapaz, e os caras, irmão, tá fazendo uma operação limpeza
na empresa. Você não tem noção.
IURI: É mesmo?
GERALDO: É, rapaz, aí eu chamei o ALEX, perguntei, velho, vem cá, tá com
alguma suspeita, alguma coisa. Ele disse, velho, eu não tenho certeza, mas
vai ter uma caça às bruxas aí, entendeu? Então eu já tô me precavendo. Aí
ele até falou, vem cá, você lá que trabalha com prefeitura, ele falou
comigo, negócio de cotação de outras empresas, negócio de qualquer
coisa de transferência, papel impresso, documento salvo no computador…
ele [inaudível] limpa tudo, viu, porque disse que vem uma operação braba
aí agora, entendeu?
IURI: Sempre quando vira assim, vem essas operações.
GERALDO: Vem uma operação brava aí agora. Aí eu parei, aí eu liguei a
antena. Eu disse rapaz, vou ligar pra ele, porque MÁRCIO não [inaudível]
essas coisas. Eu disse, eu vou ligar, porque ele nem sabe. Eu vou ligar,
porque a única coisa que o MÁRCIO vai dizer eu não sei, eu não sei, eu não
sou sabendo de nada…
IURI: No nosso caso, era bom o que aí, GERARDO, a se fazer?
GERALDO: No nosso caso, irmão, carimbo de empresa que tem lá, não é
pra ter aquilo lá. Aquilo ali é perigosíssimo, não é pra ter nada de timbrado
de outras empresas, [inaudível] aqueles documentos lá. Aí, ali…
IURI: Qualquer hora vai bater alguém na porta.
GERALDO: Não! Cê tá maluco, não é o que? Aprende tudo, para tudo.
IURI: O certo é tá no…
GERALDO: O certo é [inaudível]… eu e você, pode levar até o “MATHEUS”,
e fazer uma limpeza!
IURI: Não, Matheus, não, porque se não assusta ele, se não assusta ele…
ele é medroso…
GERALDO: Então pronto, eu e você tem que ir lá, pegar tudo que tiver de
cotação impressa de outras empresas. Você pode ter o arquivo digital,
botar tudo na porra de um negócio…
IURI: Na nuvem.
GERALDO: É, você pode ter alguma coisa lá, entendeu? Com a senha, uma
coisa que não seja de fácil acesso. Um arquivo lá que você guarda lá. Mas
impresso, essas coisas, não é pra ter nada, IURI, nada, nada!
IURI: Aí a gente está tudo lá, tudo lá…
GERALDO: Então aqueles carimbos é pra sumir da empresa. Não é para ter aqueles carimbos lá. Sumir com aquilo ali. Precisou, usou, descarregou. Não é para deixar lá.
IURI: Verdade
GERALDO: Não é para deixar lá. Não é para deixar lá. Não é para deixar lá. Segundo, o que tiver de impressão, de coisa, de proposta, de terceiro, ação, arrancar tudo. Tudo!
IURI: Triturar!
GERALDO: Só pode deixar documento da empresa.
IURI: A gente compra o triturador.
GERALDO: Triturador. Não, oxe, lá tá com 3 trituradores trabalhando em tempo real. Você não tem noção.
IURI: Caralho…
GERALDO: Velho, tem que pegar tudo. Ele já mandou fazer uma limpeza lá no meu setor. Tudo que for coisas, [inaudível], tudo proposta, de coisa, tudo. Ele mandou limpar o computador, meu, já está lá, segunda-feira que eu vou pegar. O celular já me deu um aparelho novo. Já vou trocar, igualzinho o meu, já vou trocar tudo. Fazer o backup de 5 semanas. Entendeu?
IURI: É…
OPERAÇÃO OVERCLEAN
As investigações, que envolvem a CGU (Controladoria-Geral da União), PF, MPF (Ministério Público Federal) e a RFB (Receita Federal do Brasil) foram deflagradas em 10 de dezembro de 2024.
Elas apontam que o esquema criminoso atingiu principalmente o Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), especialmente a Cest-BA (Coordenadoria Estadual da Bahia), além de outros órgãos públicos que contavam com o apoio operacional da organização criminosa nas localidades afetadas.
A apuração indica, ainda, que a organização direcionava recursos públicos provenientes de emendas parlamentares e convênios para empresas e indivíduos ligados a administrações municipais, utilizando superfaturamento de obras e desvios financeiros.
Estima-se que os criminosos tenham movimentado cerca de R$ 1,4 bilhão por meio dos contratos fraudulentos e obras superfaturadas.
Os crimes apurados incluem corrupção ativa e passiva, peculato, fraude em licitações e contratos, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça.