
O dinheiro que ficava na tradicional poupança, agora precisa ser utilizado para honrar as dívidas e garantir o sustento da família
De acordo com dados do Banco Central, os brasileiros estão cada vez mais retirando, ao invés de investir, seus recursos na caderneta de poupança. No primeiro quadrimestre deste ano, o saldo entre depósitos e retiradas foi negativo, na casa de R$ 52,1 bilhões: enquanto os depósitos somaram R$ 1,35 trilhão, as retiradas alcançaram R$ 1,4 trilhão.

No mesmo período do ano passado, a saída líquida de recursos da poupança foi na ordem de R$ 23,8 bilhões, de modo que o resultado deste ano quase dobrou seu antecessor e se aproxima do dado de 2023, R$ 57,5 bilhões.
O que explica esse comportamento dos brasileiros é o próprio cenário econômico conturbado que estamos vivenciando, sujeito aos males de três vilões: a inflação (5,53% nos últimos 12 meses), os juros (14,75% ao ano) e o endividamento (48,3% da renda acumulada em 2024).
Esses fatores se reforçam mutuamente e colocam a economia brasileira em um círculo vicioso, posto que a elevação dos preços (inflação) é respondida pelo governo com aumento dos juros, o que encarece o crédito e aumenta o endividamento da população, sem diminuir a inflação. Como consequência, o dinheiro que ficava “embaixo do colchão” e na poupança agora precisa ser utilizado para honrar as dívidas assumidas no passado e garantir o consumo de subsistência do presente.
Por outro ângulo, o ciclo de elevação dos juros em curso desde o início do ano por Galípolo e demais burocratas do Banco Central reduz a atratividade da poupança enquanto modalidade de investimento. Em outras palavras, o custo de oportunidade aumenta, já que os rendimentos são inferiores ao de outras modalidades de renda fixa (como Tesouro Direto, CDB etc) e sequer superam a inflação.
Segundo suas próprias regras de aplicação, os rendimentos da poupança são limitados a 0,5% ao mês (acrescido da variação da taxa referencial, uma média ponderada dos títulos públicos prefixados) quando a Selic ultrapassa 8,5% ao ano. Com a exorbitante taxa vigente hoje, na casa de 14,75% ao ano, aplicar na caderneta de poupança é perder duas vezes, uma para a inflação e outra para os demais ativos de renda fixa que rendem mais.
As consequências dessa migração da poupança para outros investimentos, assim como a retirada por si só desses recursos, revelam como as condições adversas de vida para a população brasileira, na forma de inflação, juros e endividamento, são passíveis de serem transformadas em lucro para as instituições financeiras, banqueiros e financistas do país.
LUCAS SANTOS MARÇAL