
Entidades sociais apontam que privatizar a captação e o tratamento de água no estado do Rio pode ter como consequência uma crise hídrica sem precedentes. O presidente do Sindicato de Saneamento do Rio de Janeiro (Sintsama), Vitor Duque, alerta que, caso se concretize e a Companhia de Águas e Esgotos do Estado (Cedae) seja entregue na bolsa de valores, “o caos vai ser total”.
A estatal é responsável por captar e tratar a água para consumo no Estado do Rio de Janeiro. Em fevereiro abriu uma licitação para escolher a instituição financeira que vai desenhar as melhores alternativas em termos de modelo de negócio que pode ter como estratégia a abertura de capital com venda direta de ações na bolsa de valores, como levantado por Cláudio Castro durante a campanha de 2022.
O resultado da licitação ainda não foi divulgado, porém movimentos populares e entidades consideram que a venda de ações representa uma privatização disfarçada do que “sobrou da Cedae pública”. A empresa foi privatizada em 2021, no governo Cláudio Castro (PL) e com apoio do então presidente Jair Bolsonaro (PL) ao ser fatiada em quatro blocos compostos por 35 municípios do Rio de Janeiro. A Cedae manteve pública até então a captação e o tratamento da água.
Para combater a proposta, movimentos populares e entidades convocam o primeiro grande ato em defesa da Cedae no centro da cidade para a próxima quinta-feira (15). “Se o governo do Estado vender o que sobrou da Cedae pública, o caos vai ser total. Esse serviço de má qualidade prestado pelas concessionárias vai se refletir também na qualidade da água e no valor, porque com certeza o tratamento e a captação vão ter novas taxas e as contas vão aumentar novamente”, afirma Duque, em entrevista ao Brasil de fato.
Para o presidente do Sintsama, a qualidade da água tratada no estado se manteve justamente porque a Cedae continua operando o serviço. Por outro lado, as ocorrências de vazamento, falta d’água e rompimento de adutora evidenciam o serviço prestado pelas concessionárias que visam apenas o lucro.
“Por ser feita por uma subsidiária pública, a Cedae consegue manter [a produção de água] a um preço praticamente de custo. O preço da água sai para as concessionárias muito baixo. As empresas jogam um valor acima para cobrir todas as suas despesas, mais o lucro que elas almejam ter. Estamos vendo, além da queda na qualidade dos serviços concedidos, também os aumentos desenfreados das contas d’águas e até a criação de novas tarifas. A privatização se tornou um caos para toda a população do Rio de Janeiro”, afirmou Vitor Duque.
Roberto Oliveira, do Movimento Atingidos por Barragens (MAB), denuncia que o governador colocará a segurança hídrica do Rio de Janeiro em risco com a venda da única parte da Cedae que ainda é mantida sob controle social, o que pode agravar os efeitos da crise climática.
“Entregar a captação e a produção de água para a iniciativa privada em um momento de crise climática que nós estamos passando no Brasil, e o Rio de Janeiro como um dos estados mais atingidos, é um crime. Esse vai ser o primeiro grande ato que estamos fazendo esse ano que vai desembocar em muitas ações e diálogo popular”, disse.
Desde a privatização da distribuição da água, moradores do Rio de Janeiro e da Baixada Fluminense enfrentam graves problemas relacionados à qualidade do serviço de abastecimento de água, com falta frequente de fornecimento, mesmo em escolas e postos de saúde, e um aumento expressivo nas tarifas. Relatos indicam que as contas dobraram ou até ultrapassaram os R$ 1.800, mesmo sem justificativa plausível, e consumidores passaram a ser multados ou cobrados retroativamente. O número de reclamações cresceu drasticamente, com denúncias de cortes indevidos, erros de cobrança e ausência de solução por parte da concessionária Águas do Rio, demonstrando que a promessa de melhoria feita no leilão de privatização não se concretizou.
“Estamos vendo diversos vazamentos na cidade, falta d’água em locais onde nunca faltou, bairros e localidades sem água por dias, semanas, meses até. Antes das concessões, a população de classe baixa, classe média, estava com medo da privatização. Hoje, vejo grandes empresários e condomínios de luxo reclamando das tarifas e do próprio fornecimento de serviço, estão sendo obrigados a comprar carro pipa”, relata Vitor Duque.
O ato em defesa da água e contra a venda da Cedae está marcado para o próximo dia 15 de maio (quinta-feira), às 10 horas em frente ao prédio sede da Cedae, na Av. Presidente Vargas, nº 2655, centro do Rio.