
A ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Vera Lúcia Santana de Araújo, foi impedida de entrar em evento para o qual foi convidada como palestrante, na última sexta-feira (16). O caso foi denunciado, nesta terça-feira (20), pela presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, que entrou com um ofício na Comissão de Ética da Presidência da República, pasta promotora do evento.
O evento em questão era o 25º Seminário Ética na Gestão e, de acordo com Carmen Lúcia, a ministra substituta foi constrangida ao tentar acessar as dependências do edifício da Confederação Nacional do Comércio, no dia 16 de maio. O seminário tinha como tema “Prevenção e Enfrentamento do Assédio e da Discriminação” e reuniu cerca de 600 pessoas, virtual e presencialmente.
“Gostaria de dar início tornando pública uma ocorrência dotada de muita gravidade e infelicidade. Uma das integrantes desse tribunal foi centro de uma inaceitável conduta de discriminação, racismo, um tratamento indigno, quando ela se apresentava atendendo um convite”, disse a presidente do TSE.
“Oficiei hoje o presidente da Comissão de Ética da República para dar ciência formal do agravo que pode constituir até crime. E, que de toda sorte, agrava cada brasileiro e cada brasileira, além de atingir a Justiça Eleitoral como um todo”, continuou.
Mesmo apresentando a carteira funcional de ministra substituta, a magistrada foi destratada pela equipe de seguranças. Ainda segundo Carmen Lúcia, a ministra só foi autorizada a entrar e realizar sua palestra após a adoção de “providências”.
“Racismo é crime, etarismo é discriminação. É inconstitucional, imoral e injusto qualquer tipo de tratamento em razão de qualquer critério que não seja o da dignidade da pessoa humana. […] Nós fazemos campanhas permanentes pela inclusão, pela igualdade, pela possibilidade de ninguém passar por tratamento como esse”, declarou Carmen Lúcia.
Vera Lúcia é a segunda mulher negra a ingressar na Corte Eleitoral, nomeada em 2023 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nesta quarta-feira (21), a Comissão de Ética Pública (CEP) da Presidência da República manifestou solidariedade à Vera Lúcia por meio de nota.
Na nota, a CEP afirma que as informações chegaram por meio de relato direto de Vera Lúcia, “dando conta de que teria sido alvo de tratamento discriminatório por parte de agente de recepção e vigilância ao tentar acessar o local do evento” e afirmou que não possui “qualquer responsabilidade administrativa ou gerencial sobre o imóvel onde o fato ocorreu”.
“O episódio, conforme narrado, não foi praticado por servidor da Comissão de Ética Pública, tampouco ocorreu no auditório onde se realizava o seminário, mas sim no trajeto até esse espaço, em uma das portarias do edifício — que abriga diversas instituições públicas e empresas privadas”, diz o documento.
“A Comissão entende que a denúncia deve ser apurada com o devido rigor pelos órgãos competentes, observando-se os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. Confirmada a ocorrência de conduta discriminatória ou qualquer outra violação a direitos fundamentais, é imprescindível a aplicação das sanções legais cabíveis nos âmbitos apropriados”, diz nota da CEP
“A Comissão de Ética Pública reitera seu compromisso com a ética, a igualdade de tratamento, a dignidade da pessoa humana e a integridade no serviço público — valores que orientam sua atuação e que devem ser resguardados em todos os espaços institucionais”, continua.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também manifestou apoio à ministra Vera Lúcia. A nota, assinada pelo Presidente do Conselho Federal da OAB, Beto Simonetti, solicita a apuração rigorosa e a adoção de medidas concretas para responsabilização dos envolvidos.
“O caso, relatado pela presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, revela uma afronta não apenas à dignidade da ministra Vera Lúcia, mas aos princípios fundamentais que regem a administração pública e a convivência democrática”, destacou Simonetti.
Em sua declaração desta terça, Carmen Lúcia acrescentou que Jorge Messias, advogado-geral da União, enviou um ofício se solidarizando com a ministra atingida e que “adotará providências para entender o que aconteceu”.
Vera Lúcia já comandou as diretorias da Fundação Cultural Palmares (FCP), da Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso do Distrito Federal (Funap) e ocupou o cargo de secretária-adjunta de Políticas para a Igualdade Racial do Distrito Federal.