
Enquanto o governo Ratinho Júnior (PSD) ostenta discursos sobre inovação e eficiência na gestão pública, professores da rede estadual precisam literalmente lutar pela própria saúde — e pela progressão na carreira — ao mesmo tempo. Um deles, lecionando História no Colégio Estadual Princesa Isabel, em Cerro Azul, participou de um curso obrigatório dentro de um hospital.
A cena que poderia ilustrar uma campanha pela valorização dos profissionais da saúde acabou virando símbolo do descaso com a educação. O curso em questão, o “Formadores em Ação”, é realizado a distância, mas com uma exigência absurda: 100% de frequência. E, para o governo estadual, atestado médico não é justificativa válida.
Segundo a APP-Sindicato, que divulgou a imagem do professor hospitalizado na quarta-feira (21), que representa os professores da rede estadual
Segundo a APP-Sindicato, que representa os professores da rede estadual, e que divulgou a imagem do professor hospitalizado na quarta-feira (21), o curso é um dos poucos aceitos pelo próprio governo para progressão de carreira. Ou seja, é uma obrigação para o educador evoluir profissionalmente e assim tentar melhorar o salário. Mas saúde física e emocional ficam por sua conta e risco.
A presidente da entidade, Walkiria Mazeto, reagiu com perplexidade e indignação. “Isso é um absurdo. Todo curso em qualquer instituição tem uma margem de ausências justificadas. Ainda que a Seed exija 100% de presença, precisa prever a reposição dentro de um prazo cabível, não dentro de uma semana, como é nos Formadores”, disse Walkiria. “Atestado médico tem amparo legal”, ressaltou a professora, lembrando que se trata de um direito garantido por lei.
O sindicato já havia se manifestado no dia 7 de maio, antes mesmo do início das aulas do curso, pedindo mudanças imediatas na Resolução 3.659/2024 – GS/SEED, que estabelece as regras do “Formadores”. A APP solicitou, entre outros pontos, que fosse incluída a possibilidade de frequência proporcional à carga horária, aceitação de atestados como justificativa e a oportunidade de reposição com prazos razoáveis.
Mas parece que pedir razoabilidade à gestão Ratinho é como solicitar silêncio em assembleia de escola infantil: um exercício de esperança. O governo insiste em tratar seus profissionais com rigidez administrativa e frieza de planilha — ainda que a realidade envolva pessoas, doenças e, sim, seres humanos.
Após receber a imagem do professor internado, Walkiria entrou novamente em contato com a Secretaria de Estado da Educação (Seed), que disse ter convocado uma reunião com o setor de recursos humanos para discutir o caso. A resposta veio apenas depois que o absurdo já havia circulado nas redes sociais — afinal, se depender do bom senso, a prioridade da Gestão Ratinho Júnior parece ser atender a planilhas, não a pessoas.
A situação escancara uma política de governo que aposta no medo e na punição como mecanismos de controle. Aliás, é esse o modus operandi do Governo paranaense. Na greve da educação em 2023, foi usando dessa prática que Ratinho conseguiu asfixiar o movimento. A valorização do profissional da educação, sempre presente nos discursos oficiais do seu governo, vai sendo diluída na prática diária de regras inflexíveis e desumanas.
Essa lógica de desmonte também se revela no projeto de privatização de mais de 200 escolas públicas estaduais por meio do programa “Parceiro da Escola”. Sob o pretexto de eficiência e modernização, o governo Ratinho Júnior pretende entregar a gestão administrativa das unidades para empresas privadas, transformando a educação pública em produto e os estudantes em meros clientes. Trata-se de uma escolha política clara: retirar da comunidade escolar o controle sobre suas próprias instituições e abrir espaço para o lucro onde deveria haver compromisso social. A medida ignora o princípio constitucional da educação como um direito e evidencia o desprezo pela escola pública como instrumento de emancipação.
Ao mesmo tempo, o governo tenta vender como avanço a substituição de aulas presenciais da Educação de Jovens e Adultos (EJA) por teleaulas. Uma modernidade às avessas, que ignora as especificidades de um público que precisa, mais do que qualquer outro, de acolhimento, escuta e acompanhamento pedagógico real. Transformar a sala de aula em uma tela distante — como o faz Ratinho JR — é retirar o direito à mediação humana, ao vínculo com o professor, ao espaço de troca que é essencial para uma educação de qualidade. Não se trata de inovação, mas de uma clara e deliberada estratégia de precarização do ensino público.
Por enquanto, fica a reflexão: mesmo doente, o professor continua ensinando uma lição valiosa — a de que a educação resiste, mesmo quando os adoradores do mercado tentam destruí-la.
JOSI SOUSA