Após ser eleito, Jair Bolsonaro voltou a atacar a imprensa. Em entrevista ao “Jornal Nacional”, na segunda-feira (29), voltou à carga contra a “Folha de S.Paulo”, acusando o jornal de publicar notícias falsas. Ele repetiu o que já havia feito na campanha eleitoral, sempre que surgiram reportagens com denúncias contra ele na imprensa.
Na entrevista, prometeu cortar verbas de publicidade do governo federal destinados à “Folha”. Ao ser questionado sobre liberdade de imprensa, Bolsonaro afirmou ser “favorável à liberdade de imprensa”, “mas temos a questão da propaganda oficial de governo, que é outra coisa”. “No que depender de mim, na propaganda oficial do governo, a imprensa que se comportar dessa maneira, mentindo descaradamente, não terá apoio do governo federal”, disse.
Bolsonaro mostrou-se irritado com duas reportagens feitas pelo jornal, uma que apontou a existência de uma funcionária fantasma em seu gabinete parlamentar na Câmara dos Deputados e outra que revelou um esquema de disparos em massa de mensagens anti-PT via WhatsApp financiado por empresários, o que configura caixa dois.
O presidente eleito manifestou disposição de acabar com o jornal, que nas suas palavras “por si só” já teria acabado. “Não tem prestígio mais nenhum. Quase todas as fake news que se voltaram contra mim partiram da Folha”, afirmou.
Ainda na noite da segunda, o jornal publicou em seu site que, “diferentemente do que Bolsonaro afirmou na entrevista, a Folha não mentiu sobre a funcionária fantasma de seu gabinete. Desde a primeira reportagem, o agora presidente eleito vem dando diferentes e conflitantes versões sobre a assessora para tentar negar”. O jornal também faz esclarecimentos sobre a reportagem que trata da compra de disparos no WhatsApp.
Leia abaixo o trecho da entrevista concedida ao JN:
William Bonner – Presidente, o senhor sempre se declara, enfaticamente, aliás, um defensor da liberdade de imprensa. Mas, em alguns momentos da campanha, o senhor chegou a desejar que um jornal deixasse de existir. É indiscutível que a imprensa não é imune a erros e nem a críticas e isso vale para qualquer órgão da imprensa profissional. Mas também é fato que a imprensa livre é um pilar da democracia. Como presidente eleito, o senhor vai continuar defendendo a liberdade da imprensa e a liberdade do cidadão de escolher o que ele quiser ler, e o que ele quiser ver e ouvir?
Bolsonaro – Totalmente favorável à liberdade de imprensa. Temos a questão da propaganda oficial do governo que é uma outra coisa. Mas aproveito o momento para que nós realmente venhamos fazer justiça aqui no Brasil. Tem uma senhora de nome Valderice, minha funcionária, que trabalhava na vila histórica de Mambucaba, e tinha uma lojinha de açaí. O jornal “Folha de S.Paulo” foi lá nesse dia 10 de janeiro e fez uma matéria e a rotulou de forma injusta como fantasma. É uma senhora, mulher, negra e pobre. Só que nesse dia 10 de janeiro, segundo boletim administrativo da Câmara de 19 de dezembro, ela estava de férias. Então, ações como essa, por parte de uma imprensa, que mesmo a gente mostrando a injustiça que cometeu com uma senhora, ao não voltar atrás, logicamente que eu não posso considerar essa imprensa digna. Não quero que ela acabe. Mas, no que depender de mim, da propaganda oficial do governo, imprensa que se comportar dessa maneira, mentindo descaradamente, não terá apoio do governo federal.
William Bonner – Então o senhor não quer que esse jornal acabe. O senhor está deixando isso claro agora.
Bolsonaro – Por si só, esse jornal se acabou. Não tem prestígio mais nenhum. Quase todas as fake news que se voltaram contra mim partiram da “Folha de S.Paulo”, inclusive a última matéria, onde eu teria contratado, né, empresas fora do Brasil, via empresários aqui para espalhar mentiras sobre o PT. Uma grande mentira, mais uma fake news do jornal “Folha de S.Paulo”, lamentavelmente.
William Bonner – Presidente, me permita, como editor-chefe do Jornal Nacional, eu tenho um testemunho a fazer. Às vezes, eu mesmo achei que críticas que o jornal “Folha de S.Paulo” tenha feito ao Jornal Nacional me pareceram injustas. Isso aconteceu algumas vezes. Mas, para ser justo, do lado de cá, eu preciso dizer que o jornal sempre nos abriu a possibilidade de apresentar a nossa discordância, de apresentar os nossos argumentos, aquilo que nós entendíamos ser a verdade. A “Folha” é um jornal sério. É um jornal que cumpre um papel importantíssimo na democracia brasileira. É um papel que a imprensa profissional brasileira desempenha, e a “Folha” faz parte desse grupo da imprensa profissional brasileira. Mas a gente pode seguir adiante com a próxima pergunta da Renata, por favor.
A Folha de S. Paulo afirmou em nota que “o presidente eleito se engana”. “A reportagem da Folha mostrou que uma funcionária sua na Câmara dos Deputados trabalhava em horário de expediente vendendo açaí em Angra dos Reis (RJ) em mais de uma ocasião e em meses diferentes. Tanto que ela acabou exonerada por ele. Jair Bolsonaro, mesmo após eleito presidente, não deixa de ameaçar a Folha. Ainda não entendeu o papel da imprensa nem a Constituição que promete obedecer”, destacou.
Então, por que Bolsonaro não fala em suspender toda a propaganda oficial? Por que fala apenas em suspender a propaganda de quem não concordar com ele?