
A escritora Ana Maria Gonçalves foi eleita para a Academia Brasileira de Letras (ABL) nesta quinta-feira (10), tornando-se a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira na Academia.
Ana Maria Gonçalves é autora do monumental “Um defeito de cor”, que em suas 950 páginas acompanha a vida da heroína Kehinde – inspirada em Luísa Mahin, tida como mãe do líder e advogado abolicionista Luiz Gama – desde que foi sequestrada na África, aos 8 anos, escravizada no Brasil, sua busca incessante pelo filho, e a volta à terra natal. Sua entrada na ABL é mais do que merecida e representa muito para a Casa de Rui Barbosa, como bem afirmou Gilberto Gil, eleito para a academia em 2021: “Representa que estamos vivos, permanecendo ativos nesse contexto variado de diversidade, muitas e de todos os tipos, étnicas, culturais, as religiosas, etc”.
De acordo com a escritora, a sua eleição “pode estar mandando um recado de que a Academia está mais aberta a repensar o trato institucional de uma língua portuguesa mais inclusiva, pensando na riqueza que os africanos e indígenas incorporaram à nossa língua mátria”, afirma.
Ana Maria Gonçalves começou a se interessar por literatura ainda na adolescência, escrevendo contos e poemas, sem publicar, até que em 2002 publicou seu primeiro livro, o romance “Ao lado e à margem do que sentes por mim”, lançado de forma independente. Mas foi em 2006, quando lançou pela editora Record “Um defeito de cor”, que sua contribuição à literatura brasileira seria aclamada.
O livro, que mergulha na diáspora africana, na escravidão, na história do Brasil, na luta e na resistência dos negros, é um marco que levou cinco anos para ser produzido – segundo Ana Maria Gonçalves, dois anos para uma pesquisa rigorosa, um ano para escrita e mais dois anos para reescrita –, vendeu 180 mil exemplares e inspirou exposições de arte e enredo de escola de samba, como o desfile da Portela em 2024.
A escritora, que foi uma das primeiras a se inscrever para ocupar a cadeira nº 33 da ABL, vaga aberta com a morte de Evanildo Bechara, diz que pensou que sua entrada pode “levar para a ABL um público leitor que não se via representado, ainda, em grande parte da literatura que se produz lá dentro”.
“Tenho muita vontade de agir institucionalmente em prol de novos escritores e novas tecnologias de saber, incorporando a oralidade e a escrevivência, por exemplo, que são modos muito nossos de fazer literatura”, disse.
“Ana Maria Gonçalves foi eleita imortal pela Academia Brasileira de Letras (ABL). A primeira mulher negra a ter esse reconhecimento. Que a chegada de Ana Maria inaugure um tempo de valorização de escritoras negras nesse espaço!”, celebrou a ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Macaé Evaristo.
“Um defeito de cor” conquistou o Prêmio Casa de las Américas na categoria literatura brasileira. Em 2007, o escritor Millôr Fernandes classificou a obra como a mais importante da literatura brasileira do século XXI.