
“Esse pessoal deveria ter vergonha na cara”, disse o presidente, referindo-se aos bolsonaristas que apoiam o tarifaço do ditador norte-americano, utilizando a ameaça como chantagem para salvar a pele do chefe do clã, Jair
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu com contundência e classificou como “covardia” os movimentos dos bolsonaristas e do próprio Bolsonaro no sentido de chantagear o Brasil com o tarifaço de Trump aos produtos exportados aos EUA, anunciado para acontecer a partir de 1º de agosto. “Esse pessoal deveria tomar vergonha na cara”, sentenciou.
O presidente reiterou as críticas a Bolsonaro e ao filho, Eduardo, que se encontra nos EUA chantageando contra ao Brasil. “A coisa [Bolsonaro] mandou um filho que era deputado se afastar da Câmara para ir lá ficar pedindo: ‘Trump, pelo amor de Deus, solta meu pai, não deixa meu pai ser preso’.”
“É preciso criar vergonha na cara, porque a coisa mais pequena de um homem é ele não ter caráter. Vocês viram ontem o filho dele [Eduardo] na internet lendo uma carta [dizendo]: ‘Trump fala que você não vai taxar [o Brasil] se meu pai não for preso’. Que tipo de homem que é esse? Que não tem vergonha de enfrentar o processo dele de cabeça erguida e provar que é inocente”, denunciou.
Já numa entrevista à TV Record, Lula afirmou que o grupo político que o antecedeu não voltará a governar o Brasil.
O presidente alfinetou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), por responsabilizar a gestão atual pela sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros anunciada pelo presidente americano Donald Trump.
“Uma coisa eu posso dizer. Os loucos que governaram esse país não voltam mais”, disse. “O Tarcísio pode tirar. Não vai tentar esconder o chapeuzinho do Trump, não, Tarcísio. Pode ficar mostrando para a gente também quem você é. Porque está cheio de lobo com pele de carneiro”, afirmou.
“VOU BRIGAR EM TODAS ESFERAS”
Lula disse que recorrerá aos parceiros do BRICS, com os quais se reuniu, no último final de semana, no Brasil, e à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra as medidas de Trump que afetam a economia nacional.
“Vou tentar e brigar em todas as esferas para que não venha taxação. Vou brigar no OMC, vou conversar com meus companheiros dos BRICS”, afirmou o presidente, referindo-se à sobretaxa de 50% imposta por Trump na última quarta-feira (9).
Além disso, Lula reafirmou que, mantido o tarifaço de Trump, o governo, com base na lei aprovada pelo Congresso Nacional, adotará a reciprocidade. “Simples, assim”, resumiu o presidente brasileiro.

“Eu que deveria taxar ele”, disse Lula, numa referência ao atual inquilino da Casa Branca, que, além do Brasil, resolveu abrir uma guerra comercial contra vários países, inclusive alguns tradicionais parceiros dos EUA. A declaração foi feita em discurso em Linhares, no Espírito Santo, ao anunciar os avanços do Novo Acordo Rio Doce.
USO DO “TARIFAÇO” PARA CHANTAGEAR O BRASIL
Mas, no caso do Brasil, há um grave componente político: a tentativa de usar a pressão do tarifaço para salvar a pele de seu parça, Jair Bolsonaro, algo que Trump fez explicitamente ao publicar mensagem e endereçar carta a Lula alegando que o ex-mandatário brasileiro sofre perseguição política.
E mais: Trump justificou as sobretaxas citando supostas centenas de “ordens de censura secretas e ilegais” emitidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) contra plataformas de mídia social dos EUA, incluindo milhões de dólares em multas, ao mesmo tempo em que reiterou suas críticas ao processo judicial da trama golpista, na qual Bolsonaro está enredado como nunca, que está sob julgamento na suprema corte brasileira.
Lula, no entanto, deixou claro que não vai permitir “brincar com o Brasil” quem quer que seja.
“Realmente, gente, essas pessoas não sabem o que é o respeito que nós temos pelo nosso país. Essa gente não sabe que nós não somos um povo qualquer. Nós somos uma mistura de indígenas, negros e europeus, por isso que nós saímos essa espécie bonita de gente”, afirmou o presidente.
Esclareceu, ainda, que não faz “nenhuma confusão entre o comportamento do presidente Trump e o povo americano”, que, segundo ele, é um povo “trabalhador” que merece respeito.
Lula também acusou Trump de “desinformação” sobre a relação comercial entre Brasil e Estados Unidos, país que não têm um déficit comercial com o Brasil. Já o Brasil, de acordo com o presidente, enfrenta um déficit comercial de 410 bilhões de dólares em transações comerciais e de serviços com os americanos ao longo de 15 anos.
Segundo o mandatário, os comentários de Trump sobre tarifas foram “baseados na mentira”, enfatizando a necessidade de reconhecer a realidade das relações comerciais entre as duas nações, observando que, em vez de impor tarifas, os EUA deveriam repensar sua abordagem com o Brasil.
A FALÊNCIA DA ONU E A GUERRA COMERCIAL
O ano de 2025 deveria ser um momento de celebração dedicado às oito décadas de existência da Organização das Nações Unidas (ONU), mas pode entrar para a história como o ano em que a ordem internacional construída a partir de 1945 desmoronou.
Em artigo de sua autoria, o presidente Lula afirmou, ao analisar a situação internacional e a falência da ONU, que “a solução para a crise do multilateralismo não é abandoná-lo, mas refundá-lo sobre bases mais justas e inclusivas”
“As rachaduras já estavam visíveis. Desde a invasão do Iraque e do Afeganistão, a intervenção na Líbia e a guerra na Ucrânia, alguns membros permanentes do Conselho de Segurança banalizaram o uso ilegal da força. A omissão frente ao genocídio em Gaza é a negação dos valores mais basilares da humanidade. A incapacidade de superar diferenças fomenta nova escalada da violência no Oriente Médio, cujo capítulo mais recente inclui o ataque ao Irã”, argumentou Lula.
E acrescentou:
“A lei do mais forte também ameaça o sistema multilateral de comércio. Tarifaços desorganizam cadeias de valor e lançam a economia mundial em uma espiral de preços altos e estagnação. A Organização Mundial do Comércio foi esvaziada e ninguém se recorda da Rodada de Desenvolvimento de Doha”.
Prosseguiu:
“O colapso financeiro de 2008 evidenciou o fracasso da globalização neoliberal, mas o mundo permaneceu preso ao receituário da austeridade. A opção de socorrer super-ricos e grandes corporações às custas de cidadãos comuns e pequenos negócios aprofundou desigualdades. Nos últimos 10 anos, os US$ 33,9 trilhões acumulados pelo 1% mais rico do planeta são equivalentes a 22 vezes os recursos necessários para erradicar a pobreza no mundo”.
Argumentou, ainda, sobre o corte feito por nações ricas aos programas de cooperação para implementar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável até 2030:
“Não se trata de fazer caridade, mas de corrigir disparidades que têm raízes em séculos de exploração, ingerência e violência contra povos da América Latina e do Caribe, da África e da Ásia. Em um mundo com um PIB combinado de mais de 100 trilhões de dólares, é inaceitável que mais de 700 milhões de pessoas continuem passando fome e vivam sem eletricidade e água”.
E concluiu:
“É urgente insistir na diplomacia e refundar as estruturas de um verdadeiro multilateralismo, capaz de atender aos clamores de uma humanidade que teme pelo seu futuro. Apenas assim deixaremos de assistir, passivos, ao aumento da desigualdade, à insensatez das guerras e à própria destruição de nosso planeta”.