
Opção de Putin por acordo de paz duradouro foi explicada à comitiva europeia que escoltou Zelensky até à Casa Branca
Ao se reunir na Casa Branca com governantes europeus que ali foram acompanhar o escabriado Zelensky, o presidente Trump observou que nas seis guerras que diz ter terminado nunca houve um cessar-fogo prévio às negociações, esvaziando a choradeira sobre os resultados da cúpula Rússia-EUA no Alasca.
Aquela em que o presidente Putin foi recebido com tapete vermelho, enquanto o chanceler Lavrov exibia um suéter com as iniciais da União Soviética em cirílico: CCCP. E com Trump abrindo mão de seu “ultimato” e do “cessar-fogo imediato”, em prol da tese russa de “um acordo de paz duradouro”. E com direito a Putin saudá-lo, muito à vontade, com um “bom dia, caro vizinho”.
Em Anchorage, Putin pôde apresentar a Trump direta e didaticamente as razões que levaram a Rússia a intervir no Donbass, depois de cinco ondas de expansão da Otan até às fronteiras da Rússia desde a reunificação alemã e contrariando os compromissos assumidos com a então União Soviética; do “convite” de 2008 de W.Bush de anexação da Ucrânia à Otan; da derrubada do governo ucraniano legítimo por golpe de Estado em 2014 e decorrentes rebeliões no Donbass e na Crimeia, e, depois, o descumprimento dos acordos de paz de Minsk, que determinavam o fim da perseguição aos russos étnicos, aos monumentos históricos, ao seu idioma e até religião.
Assim, a paz é possível desde que a Ucrânia restaure seu status de neutralidade, sem Otan e sem bases estrangeiras; reconheça as regiões que por referendo se reunificaram com a Rússia, a começar com a Crimeia, e sendo possível a troca de áreas nas regiões de Kharkov e Summy sob controle russo pela integral retirada das tropas ucranianas de Kherson, Zaporozhia e do Donbass. E restaure os direitos constitucionais da minoria de russos étnicos.
E com a Rússia aceitando o estabelecimento de garantias firmes de segurança para a Ucrânia. Antes da revoada a Washington, líderes europeus voltaram a ameaçar enviar suas tropas à Ucrânia após o acordo de paz, o que evidentemente só é feito na tentativa de implodir as negociações e tentar eternizar a guerra por procuração da Otan contra a Rússia.
Se o acordo é “nada de Otan” na Ucrânia, não há qualquer lugar para botas da Otan no solo.
MAPA NO SALÃO OVAL
Segundo as agências de notícias, Trump recebeu Zelensky no salão oval, adornado com um mapa da Ucrânia com as áreas libertadas pela Rússia marcadas em rosa, possivelmente com o objetivo de ajudar o ex-comediante a parar de fingir não saber qual é a situação real.
Zelensky, que fez aprovar no parlamento uma ‘lei’ proibindo negociar, agora diz aceitar negociações sem pré-condições.
Os “líderes” europeus – que alguns descrevem como chihuahuas – Friedrich Merz, Emmanuel Macron, Sir Keir Starmer, Giorgia Meloni e Ursula von der Leyen (além do chefe de cerimônias da Otan, Mark Rutte) – acompanharam Zelensky a Washington e depois também se reuniram com Trump.
A efeméride foi interrompida por Trump por 40 minutos para falar com o presidente Putin pelo telefone, dando conta das discussões com Zelensky e a entourage. Trump tem manifestado o desejo de uma reunião trilateral, com ele, Putin e Zelensky sobre um possível acordo. Tese com a qual o Kremlin ainda não se comprometeu.
O premiê alemão, Merz, que quer “rearmar a Alemanha” até os dentes, resmungou “não conseguir imaginar que a próxima reunião seja realizada sem um cessar-fogo”, exigindo “tentar pressionar a Rússia.”
Talvez alguém possa explicar ao ex-banqueiro da BlackRock que foi exatamente assim para o fim da Guerra do Vietnã e o do Afeganistão, só para citar duas das mais importantes guerras em que os EUA beijaram a lona.
‘RAMBO DAS ESTEPES’ ESTREIA TERNO PRETO
Depois de ter há dois meses expulsado da Casa Branca Zelensky, então trajado como o rambo das estepes, Trump o recebeu agora calorosamente e manifestou apreço pelo recém estreado terno preto.
Perguntado por um repórter qual era sua mensagem para o povo da Ucrânia, Trump disse: “Nós os amamos”.
Sobre as alegações de que a cúpula do Alasca “configurou uma vitória para Putin”, Trump desconversou, mas colocou sobre Zelenskiy o ônus para acabar com a guerra, dizendo que a Ucrânia deveria desistir das esperanças de recuperar a Crimeia, anexada pela Rússia em 2014, ou de se juntar à aliança militar da Otan.
A GUERRA DE BIDEN
Trump tem dito que a guerra da Ucrânia não é dele, é “uma guerra de Biden” – no que tem certa razão, já que a Rússia, antes de reconhecer e socorrer as repúblicas do Donbass, apresentou aos EUA e à Otan proposta para restaurar o equilíbrio de forças na Europa, conforme os termos da época da reunificação alemã, com o encerramento da expansão da Otan e retirada de mísseis para a linha do Oder-Neisse (a divisa entre a então República Federal Alemã e a Alemanha Oriental socialista).
Biden e a Otan se recusaram sequer a discutir, dizendo que a Otan pode anexar o que quiser e quando quiser, na prática revogando as Atas de Helsinki de 1975 para segurança da Europa.
QUANTO À FARSA DE MERKEL E HOLLANDE
Mais tarde, os garantidores dos acordos de Minsk, a alemã Angela Merkel e o francês François Hollande, revelaram que assinaram para ganhar tempo para rearmar a Ucrânia (tornando-a de fato uma extensão da Otan) e não para cumprir.
Os setores mais degenerados do Estado Profundo norte-americano acreditaram no que pagavam aos think tanks belicistas para escrever, que a economia da Rússia seria destruída pelas sanções econômicas que decretaram e haveria uma mudança de regime.
Quando a Rússia fez seu avanço inicial cercando Kiev para forçar a abertura de negociações, que ocorreram em Istambul e se chegou a um acordo, o governo Biden enviou o primeiro-ministro inglês Boris Johnson a Kiev dar a Zelensky a ordem de continuar a guerra, com os resultados conhecidos.
Sob a guerra, a economia europeia, que se automutilou abrindo mão do gás russo barato, mergulhou na estagnação, enquanto a subserviência chegou ao ponto de a Alemanha ver o Nord Stream ser explodido pelos EUA, com a desindustrialização como corolário.
ENCORPAMENTO DOS BRICS
Já a Rússia, por paridade de poder de compra, tornou-se a quarta maior economia do mundo e a maior da Europa, reafirmou sua soberania e se reindustrializou e está esmagando no terreno a guerra por procuração da Otan contra Moscou na Ucrânia.
Ao invés de isolada, como era a intenção do eixo Washington-Bruxelas, a resistência russa à ditadura unipolar só fez ampliar a relação de Moscou com a maioria global, fenômeno do qual o encorpamento dos BRICS é um dos principais sintomas, e fortalecer a instauração de um mundo multipolar, menos desigual e mais pleno de soberania. Ou, como dizem os chineses em sua milenar sabedoria, em que está mais próximo um futuro compartilhado para a Humanidade.