
“No mundo fantasioso de Armínio Fraga a situação econômica da Argentina é uma espécie de nirvana”. O lunático quer que Brasil siga no mesmo rumo
O professor de economia da UnB José Luis Oreiro rebateu, em artigo publicado em seu blog esta semana, os absurdos defendidos pelo porta-voz da especulação, Armínio Fraga, um apologista da política desastrosa de Javier Milei. O ex-presidente do Banco Central defendeu que o Brasil deveria fazer o que a Argentina está fazendo. A mesma Argentina que está arrasada e afundada numa gravíssima crise provocada, exatamente, pela política de arrocho fiscal tresloucada, aplicada lá por Milei e defendida aqui por Fraga.
Neste mesmo sentido, em recente debate promovido pelo BTG, o mesmo Armínio Fraga intensificou sua cruzada pela destruição do setor produtivo e do mercado interno brasileiro. O porta-voz do bancos voltou a acenar com o exemplo da “ousadia” argentina e preconizou que o salário mínimo no Brasil deveria ser congelado por no mínimo seis anos. A ideia é tão estapafúrdia, que até o ministro Fernando Haddad, que é um aficionado por ajustes ficais, e que também participava do evento, foi obrigado a reagir. Ele rebateu dizendo que “Fraga está fora da realidade”.
No artigo do blog, Oreiro desnuda o desastre que Milei está aprontando na Argentina e mostra que esse “caminho” deve ser combatido e não imitado no Brasil. “(…) existe uma divergência bastante acentuada entre o quadro que Fraga pinta da economia Argentina vis-a-vis a economia Brasileira e o que os dados apresentam. Quando os fatos não corroboram a narrativa ideológica neoliberal, as favas com os fatos!!! Milei está fazendo um governo fantástico porque faz tudo o que Fraga acha que deveria ser feito no Brasil”, ironiza Oreiro.
O professor da UnB comenta também um artigo de Fraga no Infomoney onde ele se esmera em advogar a favor da especulação. “(..) Fraga apresenta pela enésima vez a cantilena monetarista – repaginada pela Teoria Fiscal do Nível de Preços – de que a inflação é o resultado do desequilíbrio fiscal e que, portanto, apenas um forte ajuste fiscal – como o que Milei fez na Argentina, ainda que Fraga o considere ‘tosco’ – poderia levar a uma redução sustentada da taxa de inflação. De acordo com a matéria, Fraga teria dito que enquanto ‘Milei derruba inflação na Argentina, Brasil brinca com fogo’”. Confira o artigo na íntegra!
A Dissonância Cognitiva de Armínio Fraga sobre a Economia da Argentina
JOSÉ LUIS OREIRO*
De acordo com a Wikipédia a dissonância cognitiva consiste na “necessidade, do indivíduo, de procurar coerência entre suas cognições (conhecimento, opiniões ou crenças). A dissonância ocorre quando existe uma incoerência entre as atitudes ou comportamentos que acredita serem certos e o que realmente é praticado” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Disson%C3%A2ncia_cognitiva).
Aparentemente – digo pois não sou psiquiatra – é o que acontece com o ex-presidente do Banco Central do Brasil Armínio Fraga. Em matéria publicada pela Infomoney, Fraga afirma que (sic) “O experimento argentino traz lições importantes também para o Brasil” (Ver: https://www.infomoney.com.br/advisor/milei-derruba-inflacao-na-argentina-e-brasil-brinca-com-fogo-diz-arminio-fraga/) Ao longo da matéria, Fraga apresenta pela enésima vez a cantilena monetarista – repaginada pela Teoria Fiscal do Nível de Preços – de que a inflação é o resultado do desequilíbrio fiscal e que, portanto, apenas um forte ajuste fiscal – como o que Milei fez na Argentina, ainda que Fraga o considere “tosco” – poderia levar a uma redução sustentada da taxa de inflação. De acordo com a matéria Fraga teria dito que enquanto “. Milei derruba inflação na Argentina, Brasil brinca com fogo”.
O que exatamente Fraga entende por derrubar a inflação na Argentina? De acordo com matéria publicada no portal G1 em 10/09/2025 no mês de agosto de 2025 a inflação Argentina foi de “apenas” 1,9%, caindo para míseros 33,6% em 12 meses (https://g1.globo.com/economia/noticia/2025/09/10/inflacao-argentina-agosto.ghtml). Já no Brasil, que nas palavras de Fraga está brincando com fogo, ocorreu deflação (ou seja, queda de preços) de 0,11% em agosto de 2025 (https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/44428-ipca-fica-em-0-11-em-agosto#:~:text=No%20ano%2C%20o%20IPCA%20acumula,de%20%2D0%2C02%25.) e a inflação acumulada em 12 meses atinge o incrivelmente elevado patamar de 5,13% em 12 meses, o que é claramente maior do que os 33,6% observados na Argentina como também maior do que os 5,23% acumulados em 12 meses no Brasil até julho. Ou seja, a inflação no Brasil está mais alta do que na Argentina e acelerando !!!!!!!!
No mundo fantasioso de Armínio Fraga a situação econômica da Argentina é uma espécie de nirvana. Com efeito, matéria publicada em 18 de setembro de 2025 no Valor Econômico (Ver: https://valor.globo.com/mundo/noticia/2025/09/17/pib-da-argentina-cai-no-2o-trimestre.ghtml) mostra que o PIB Argentino apresentou uma taxa de crescimento negativa de 0,1% no segundo trimestre de 2025 relativamente ao primeiro trimestre. No mesmo período o PIB brasileiro apresentou uma taxa de crescimento positiva de 0,4% puxado pelo consumo das famílias que cresceu 0,5% na comparação com o trimestre anterior.
Já na Argentina o crescimento negativo o consumo das famílias foi de 1,1% no segundo trimestre na comparação com o primeiro, as exportações caíram 2,2% e a formação bruta de capital fixo caiu 0,5%. O único componente da demanda agregada que se expandiu foi o consumo do governo Argentino que aumentou 1,1% na comparação com o primeiro trimestre de 2025. Já no Brasil, que segundo Fraga estaria “brincando com fogo”, o consumo do governo foi reduzido em 0,6% no segundo semestre na comparação com o primeiro.
Neste momento deve estar claro e cristalino para o leitor que existe uma divergência bastante acentuada entre o quadro que Fraga pinta da economia Argentina vis-a-vis a economia Brasileira e o que os dados apresentam. Quando os fatos não corroboram a narrativa ideológica neo-liberal, as favas com os fatos !!! Milei está fazendo um governo fantástico porque faz tudo o que Fraga acha que deveria ser feito no Brasil; embora esteja colhendo resultados catastróficos (nota: ontem, dia 17 de setembro, a cotação do dólar frente ao peso ultrapassou o teto da banda cambial definida pelo Banco Central da Argentina); ao passo que o governo do Brasil está fazendo tudo o que Fraga acha errado, embora esteja colhendo resultados satisfatórios (na minha opinião poderia ser muito melhor se nao fossem as escolhas erradas do Ministro da Fazenda, mas isso é tema para outro post).
Fraga, assim como outros economistas neo-liberais, estão anunciando desde o final de 2022 que o Brasil iria entrar numa espécie de buraco negro caso fosse abandonada a “responsabilidade fiscal” trazida pelo Teto de Gastos. Em carta aberta enviada ao Presidente Lula em novembro de 2022, eu e outros economistas desenvolvimentistas já havíamos rebatido a tese de Fraga et caterva de que o abandono do Teto de Gastos levaria a um descontrole inflacionário (Ver: https://g1.globo.com/economia/noticia/2022/11/21/em-nova-carta-a-lula-economistas-rebatem-alerta-de-fraga-malan-e-bacha-sobre-risco-fiscal.ghtml). Passados quase tres anos do fim do Teto de Gastos está absolutamente claro que eu estava certo e Fraga estava errado. Se ocorreu um descontrole inflacionário, o mesmo ocorreu durante o governo Bolsonaro como argumentei em artigo publicado na edição de julho do Le Monde Diplomatiqué Brasil (Ver https://jlcoreiro.wordpress.com/2025/07/02/uma-analise-do-desempenho-e-das-perspectivas-da-economia-no-governo-lula-3-le-monde-diplomatique-01-07-2025-versao-ampliada/).
O que impressiona no debate econômico Brasileiro é que os economistas neoliberais nunca são cobrados pelos erros sistemáticos que cometem em suas análises; ao passo que os economistas heterodoxos são, via de regra, retratados pela grande imprensa como “desqualificados” e “ideológicos”. Mas para tudo existe um limite. Essa comparação esdruxula entre o governo de Milei e o governo Lula 3 é demais, mesmo para Armínio Fraga.
*José Luis Oreiro é professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília e Professor e Pesquisador Visitante do Programa de Doutorado em Integração Econômica da Universidade do País Basco (Bilbao/Espanha)