“Os juros praticados no Brasil são uma barreira intransponível ao desenvolvimento. A taxa atual asfixia as empresas, empobrece as famílias, compromete empregos e perpetua a desigualdade. Tudo isso em nome do rentismo”, denuncia Ricardo Alban, presidente da CNI
RICARDO ALBAN*
É inadmissível que o Brasil tenha de aceitar com normalidade um dos maiores absurdos econômicos do mundo contemporâneo: a taxa básica de juros (Selic) a 15% ao ano diante de uma inflação em torno de 5% (IPCA). Mais grave ainda: a inflação em maio e junho, quando anualizada, ficou abaixo do centro da meta. Além disso, as expectativas de inflação vêm caindo e já estão dentro do intervalo da meta. Por que isso só é considerado quando se trata de elevar a Selic, mas nunca quando se discute reduzi-la?
Os juros praticados no Brasil são uma barreira intransponível ao desenvolvimento. A taxa atual asfixia as empresas, empobrece as famílias, compromete empregos e perpetua a desigualdade. Tudo isso em nome do rentismo. Afinal, nada mudou com a nova direção do Banco Central.
Não existe crescimento sustentável com juros estratosféricos. Não há espaço para inovação, reindustrialização e crédito acessível. O que se vê é a paralisia dos investimentos produtivos, com sequelas para toda a sociedade.
Por que correr riscos investindo em produção no Brasil quando é possível obter, sem esforço, rendimento real de 10% ao ano aplicando no mercado financeiro? Esse modelo condena o país a andar de lado – ou de marcha à ré – sob a miopia de uma única e cruel ferramenta de política monetária. Quantas economias, mesmo com inflação incômoda e quadro fiscal delicado, impõem a seus cidadãos uma taxa real de juros de 10%?
Os juros podem parecer invisíveis, mas seus efeitos são palpáveis e devastadores: encarecem o alimento na mesa, o crédito no banco, o investimento na fábrica e diminuem a esperança de um emprego digno. Impedem o crescimento do pequeno empresário, corroem a base da economia e aprisionam o país numa armadilha de baixo crescimento e alta desigualdade.
A indústria brasileira não se calará diante desse quadro. É hora da mobilização. Empresários, trabalhadores, lideranças políticas e sociedade precisam se unir para romper essa camisa de força. Juros altos não podem ser naturalizados.
Este não é um apelo por soluções mágicas ou canetadas improvisadas. Reconhece-se que o patamar atual dos juros reflete uma realidade complexa: dívida pública elevada (e inflada pelos próprios juros), gastos obrigatórios crescentes e indexados, desconfiança dos mercados diante da incapacidade do governo em controlar despesas. Essa realidade precisa ser enfrentada, mas não pode justificar uma política de estrangulamento econômico.
Nesse espírito, o setor produtivo está construindo o pacto Brasil +25, a ser apresentado aos poderes constituídos, com propostas de reformas estruturantes e políticas de Estado. O país precisa de uma estratégia para o futuro, não de uma política monetária que nos mantém prisioneiros do passado.
Se fosse fácil, a questão dos juros já estaria resolvida. Mas, por ser difícil e tão danosa, precisa ser enfrentada com coragem e urgência. O Brasil não pode mais se contentar em ser refém de uma política que beneficia poucos e sacrifica milhões.
Baixar os juros de forma consistente e responsável, conjugando medidas críveis de ajuste fiscal, é imperativo. Reformas estruturais não podem seguir sendo adiadas ou usadas como eterna desculpa para manter os juros reais mais altos do planeta. O país precisa alinhar-se à realidade de uma economia globalizada em plena ebulição.
A economia real exige independência em relação ao rentismo e participação efetiva no processo de decisão. Por que não garantir ao setor produtivo assento no Conselho Monetário Nacional? A indústria e a economia real precisam estar representadas onde se definem os rumos do país.
O Brasil precisa de uma nova visão. Uma visão que reposicione o Banco Central e reoriente as políticas públicas para a responsabilidade, a racionalidade e, sobretudo, para o compromisso com o desenvolvimento nacional.
*Ricardo Alban é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)
O artigo foi reproduzido do jornal O Globo no dia 6 de outubro de 2025.