Brasil tem que voltar a diferenciar o capital nacional do estrangeiro, defende Jabbour

Elias Jabbour (reprodução)

O professor da UERJ argumenta que poucos países do mundo deixam de fazer essa diferenciação. “É que sem capital nacional não tem desenvolvimento, um país sem indústria é um país sem futuro, sem condições de existir enquanto nação”, destacou

O professor Elias Jabbour, professor universitário, geógrafo, intelectual marxista, dirigente do PCdoB, escritor, presidente do Instituto Pereira Passos e uma promessa forte do Rio de Janeiro para a Câmara dos Deputados no ano que vem, afirmou, nesta terça-feira (14), em entrevista ao HP, que uma de suas prioridades políticas será o retorno à Constituição Brasileira da diferenciação entre capital nacional e capital estrangeiro.

Esta diferenciação foi introduzida na carta magna na Constituinte de 1988, mas, a onda neoliberal que tomou conta do país no início dos anos 90, responsável por uma série de medidas antinacionais, levou também a que essa diferença fosse abolida por uma emenda constitucional que buscava beneficiar o capital estrangeiro. A medida praticamente impediu que o país conseguisse desenvolver políticas em defesa do capital nacional. O resultado foi que o Brasil viveu um processo de desindustrialização. Elias Jabbour esclarece, nesta entrevista, por que este retorno à definição da Constituinte de 88 é uma de suas principais bandeiras políticas.

Confira a entrevista na íntegra!

HORA DO POVO: Quais foram as consequências para o Brasil da mudança constitucional que acabou com a diferença entre capital estrangeiro e nacional?

ELIAS JABBOUR: As consequências foram gravíssimas, porque ela, ao abrir condições de igualdade entre capital nacional e capital estrangeiro, permitiu que nossa indústria, que já não tinha a devida competitividade, fosse devidamente engolida pelo capital estrangeiro.

Como os países que fizeram o catch-up agiram? Eles protegeram a sua própria indústria até que a sua indústria conseguisse alcançar condições de competir internacionalmente. Aí sim, passa a se ter uma política cambial menos rígida, uma política de juros correta, etc.

Ou seja, você primeiro cria indústrias poderosas, com marcos macroeconômicos muito claros de potencialização das suas indústrias nacionais, para depois fazer uma abertura lenta, gradual e segura. No Brasil foi quase uma terapia de choque nesse aspecto e o resultado foi o fato do Brasil ter sido o país que se desindustrializou mais rápido na história do capitalismo.

HP: Por que você está colocando esta questão como uma de suas prioridades políticas?

ELIAS: Eu coloco como central isso porque a gente tem que ter um ponto de partida, ou seja, e o ponto de partida é o de diferenciar o capital nacional e o capital estrangeiro. É a tal da indústria infante, ou seja, nós temos a nossa própria siderurgia, capaz de criar máquinas, produzir máquinas, criando condições para o aumento da complexidade nacional e econômica, o capital estrangeiro se vier a ter o mesmo acesso ao crédito, por exemplo, vai ter que se adaptar às nossas condições.

Eu acho que esse também é outro ponto, você diferencia para criar condições para a entrada do capital estrangeiro a partir de condições que nós colocamos, como por exemplo, transferência de tecnologia, de joint ventures, etc. É fazer o que os países, inclusive capitalistas, fizeram lá atrás. Nenhum país abriu completamente a sua economia e até hoje nenhum país, poucos países no mundo, somente Brasil, Argentina, e outros países que dão esse mesmo tratamento não diferenciado, o normal é diferenciar.

HP: Por que é importante para o desenvolvimento brasileiro a prioridade para o capital nacional?

ELIAS: É que sem capital nacional não tem desenvolvimento, um país sem indústria é um país sem futuro, sem condições de existir enquanto nação. Então o capitalismo nacional, vamos dizer assim, como condição para uma transição ao socialismo, demanda um país dotado de grandes conglomerados empresariais, com um sistema financeiro sólido e orientado ao crédito bancário nacional.

E é isso, ou seja, como diz o Adam Smith, a riqueza das nações, a riqueza de uma nação são suas empresas, seus bancos, seu mercado interno. Então se nós não tivermos isso, nós nem podemos começar a pensar em projeto nacional em termos estratégicos e sensíveis, como deve ser tratado.

HP: Você acha possível restabelecer a condição original da Constituição de 88 que diferenciava os dois tipos de capital?

ELIAS: Olha, não é fácil porque a sociedade brasileira foi ganha para noções de que nossa economia é fechada, de que nós somos um país que não é um país amigável ao investimento estrangeiro, ou seja, vai ser difícil essa batalha. Mas acredito que existe um flanco aberto aí para que esse tipo de agenda, orientada à construção de um projeto nacional, ela volte à tona com muita força, inclusive partindo dessa discussão de soberania que o Trump nos deu de presente.

A batalha é difícil, mas acho que nós podemos abrir vanguarda na construção de um projeto nacional e esse ponto nós levantamos, diferente de capital nacional e capital privado nacional ou estatal e estrangeiro, é um belíssimo ponto de partida para fazer a sociedade começar a acordar para essa nossa realidade da necessidade de construir um tecido econômico próprio nacional.

Compartilhe

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *