STF condena núcleo da ‘milícia digital golpista’ por 4 votos a 1

Ministro Alexandre de Moraes, relator da ação (Foto: Gustavo Moreno - STF)

Fux vota por absolvição. Por 4 votos a 1, a Primeira Turma da Corte condena 7 réus ligados à campanha de desinformação contra o sistema eleitoral. Penas chegam a 17 anos de prisão e incluem indenização de R$ 30 milhões

A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria, nesta terça-feira (21), para condenar os 7 réus do chamado “núcleo 4” da trama golpista.

Os membros do grupo foram acusados de integrar a estrutura de desinformação que atuou para desacreditar as eleições de 2022 e fomentar ataques às instituições democráticas.

As penas variam de 7 anos e 6 meses a 17 anos de prisão, com multa e indenização solidária mínima de R$ 30 milhões por danos coletivos.

A sessão foi marcada pelo voto divergente do ministro Luiz Fux, que defendeu a absolvição de 5 dos 7 réus e questionou a competência da Primeira Turma para julgar o caso.

CONDENAÇÕES E ESTRUTURA DO GRUPO

O relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, abriu o voto em que afirmou que “não há dúvida de que houve tentativa de golpe e de abolição do Estado Democrático de Direito”.

Segundo ele, o grupo criou e operou uma “milícia digital”, com o objetivo de espalhar notícias falsas e desacreditar o sistema eleitoral.

Para Moraes, as provas mostraram atuação organizada entre militares, agentes públicos e civis. “O grupo utilizou campanhas coordenadas nas redes sociais para propagar notícias falsas e atacar instituições da República”, disse.

VOTO DOS MINISTROS

O ministro Cristiano Zanin acompanhou integralmente o relator, e destacou a existência de hierarquia e divisão de tarefas. “Havia uma estrutura organizada, com funções específicas, e não um conjunto difuso de manifestantes”, afirmou.


A ministra Cármen Lúcia também votou pela condenação. Ela ressaltou o impacto social da desinformação. “Com as mensagens falsas, direcionadas e repetidas, assolou-se a irritabilidade política, transformando o debate público em um campo minado”, lembrou.

O ministro Flávio Dino reforçou a necessidade de responsabilização. “A desinformação não pode ser minimizada; ela é uma forma de violência psicológica contra a democracia”, declarou.

VOTO DIVERGENTE DE FUX

Único a divergir, Luiz Fux votou pela absolvição da maioria dos réus, sob o argumento que as condutas descritas não caracterizam organização criminosa. “Comportamentos de turbas desordenadas ou iniciativas esparsas, despidas de articulação mínima, não satisfazem o núcleo do tipo penal”, afirmou.

Leia mais sobre o “Voto de Fux abre divergência e aumenta a tensão com seus colegas no STF”.

Fux também questionou a competência da Primeira Turma, e defendeu que o caso deveria ser apreciado pelo plenário do STF. “O Supremo, enquanto [sic] Corte Constitucional, não tem jurisdição natural para julgar este caso”, disse.

O ministro já havia adotado postura semelhante em setembro, quando votou pela absolvição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ex-ministro Anderson Torres em outro processo ligado à trama golpista — e novamente ficou vencido.

DOSIMETRIA E CONDENADOS

As penas fixadas refletem o grau de envolvimento de cada integrante. O major da reserva Ângelo Denicoli recebeu a punição mais severa, 17 anos de prisão.

O coronel Reginaldo Vieira de Abreu foi condenado a 15 anos e 6 meses, seguido de Marcelo Araújo Bormevet (14 anos e 6 meses), Giancarlo Rodrigues (14 anos), Ailton Moraes Barros (13 anos e 6 meses), Guilherme Marques de Almeida (13 anos e 6 meses) e Carlos César Moretzsohn Rocha (7 anos e 6 meses).

Os ministros também fixaram indenização solidária mínima de R$ 30 milhões, destinada a reparar danos causados à coletividade.

SIGNIFICADO POLÍTICO E PRÓXIMOS PASSOS

A decisão reforça o entendimento consolidado no Supremo de que a difusão sistemática de desinformação contra o processo eleitoral pode configurar crime contra o Estado Democrático de Direito.

Após a publicação do acórdão, começa a contagem dos prazos recursais. Advogados de defesa já indicaram que pretendem apresentar embargos de declaração — recurso — e recorrer da decisão ao plenário do STF.

A condenação do “núcleo 4” marca mais uma etapa no julgamento da trama golpista investigada desde 2023, que envolve também os chamados núcleos militar, financeiro e político.

NÚCLEO CRUCIAL”

A condenação do “núcleo 4” reforça o entendimento do Supremo já consolidado no julgamento do “núcleo crucial”, formado por articuladores políticos e militares da tentativa de golpe.

Na ocasião, os ministros também reconheceram a existência de coordenação entre diferentes grupos que atuaram em frentes complementares: difusão de fake news, mobilização de financiadores e preparação logística dos atos.

“Os núcleos se complementavam; a desinformação era o elo entre o discurso e a ação golpista”, destacou Moraes, relembrando o julgamento anterior.

A decisão sobre o “núcleo 4” reforça, portanto, a tese de que a manipulação digital e as campanhas de ódio foram instrumentos fundamentais para viabilizar a tentativa de ruptura institucional.

NOVOS JULGAMENTOS

Ainda restam ser julgados os “núcleos 2 e 3”, que abrangem financiadores e articuladores militares envolvidos na convocação e apoio material aos atos de 8 de janeiro.

Esses julgamentos devem ocorrer nas próximas semanas e poderão consolidar a responsabilização dos principais agentes da trama golpista, que culminou com o 8 de janeiro de 2023.

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