Oposição dividida permite sobrevida a Milei

Kiciloff ao comemorar vitória na eleição da provínccia de Buenos Aires quando bateu o Milei. "Peronismo precisa elevar a unidade e apresentar alternativa à crise gerada pelo governo Milei", diz o governador de B. Aires, (Redes Sociais)

O governo de Javier Milei ganhou uma sobrevida nas eleições intermediárias de domingo (26) ao obter 40,8% dos votos, resultado não esperado pelas pesquisas, depois de o fascista estar nas cordas desde abril, a ponto de ter de ser socorrido pelo FMI com US$12 bilhões, com protestos nas ruas e escândalos rondando a ele próprio e sua irmã Karina, enquanto o peso derretia, o dólar decolava e o risco-país furava o teto, em meio a uma queda histórica no consumo, estagnação e arrocho. A principal força de oposição Fuerza Pátria, em conjunto com aliados, ficou com 31,7% dos votos.

Observe-se que esses 40,8% implicam em uma queda de votos de 15 pontos percentuais em relação à eleição de Milei em 2023. E, em comparação com as eleições de meio de mandato de Macri em 2017, La Libertad Avanza (LLA) obteve dois milhões de votos a menos.

Em seu artigo “Hipótese para entender e superar uma derrota”, publicado no Página 12, o sociólogo Atílio Borón considera como primeiro fator que levou as forças em torno do peronismo ao revés, “o governo conseguiu unificar suas forças, razão pela qual La Libertad Avanza foi o único partido político a apresentar sua candidatura em todos os 24 distritos. Fuerza Patria, por outro lado, o fez em 14, enquanto os partidos com ideias semelhantes que compõem a coalizão o fizeram em outros dez. Essa foi uma enorme vantagem concedida ao governo, e teve um preço alto”.

Segundo Borón, isso significou que “o movimento Mileísmo enfrentou uma multidão de grupos partidários diferentes, desorganizados e sem um diagnóstico e uma estratégia compartilhados para combater La Libertad Avanza”.

Ele aponta ainda que “durante a campanha, a Força Pátria e seus partidos aliados não conseguiram oferecer ao eleitorado propostas concretas sobre como sair do desastre econômico e social [causado pelo mileísmo]. Não havia slogans claros e distintos: não bastava denunciar os horrores que o governo estava produzindo; era necessário divulgar as propostas do peronismo e seus aliados para sair da crise”.

“Em vez disso”, complementa o sociólogo, “houve uma disputa interminável por candidatos e posições de liderança , alimentando o desinteresse ou apatia da própria base social. Em suma: nenhuma proposta, nenhuma liderança clara para comandar a base, algo que Cristina Fernández, injustamente proscrita e condenada, não estava em condições de fazer. Nessas condições, o resultado não poderia ter sido diferente”.

O segundo fator que interferiu no resultado foi a do “medo do desastre”, como avalia o jornal progressista argentino Página 12. Até poucos dias antes das eleições, o peso estava práticmaente se dissolvendo frente ao dólar e nem mesmo torrando os 12 bilhões emprestados – como sempre em condições leoninas – pelo FMI conseguiam deter.

Diante de ameaça de colpaso cambial, Milei correu a Washington que lhe prometeu mais 20 bilhões de dólares, mas chantageando os argentinos de que o dinheiro só saíria se o candidato capacho de Washington vencesse. Dias antes do pleito foi a vez de uma delegação dos bancos, incluindo representantes do J P Morgan a prometerem outros US$ 20 bi.

“Estamos aqui para dar a você o apoio que precisa para as próximas eleições. Se perder, não seremos generosos com a Argentina”, ameaçou Trump, com Milei a tiracolo.

Quanto até onde vai esse resgate, lembra a experiência que Trump no seu primeiro mandato salvou Macri com um resgate do FMI. O que não impediu o regime neoliberal de naufragar após endividar terrivelmente o país, e acabou derrotado nas urnas nas eleições seguintes.

Milei se gabou de que o novo Congresso é o “mais reformista” da história, querendo dizer que é o mais reacionário. Mas o LLA não tem maioria no Senado e nem na Câmara, embora a partir de agora tenha a capacidade para derrubar projetos aprovados pelos parlamentares que vetou, o que ocorreu amiúde nos meses recentes.

Juntando com as cadeiras que não foram disputadas neste pleito, o governo tem 104 cadeiras, enquanto que a oposição 103. Há 50 deputados em disputa. O resultado final, em números, deu 9.341.798 para a LLA e 8.077.098 ao peronismo.

Parte dos ganhos na bancada da LLA propriamente dita apenas significam que no lugar de deputados neoliberais macristas ou da ala colaboracista dos radicais entraram energúmenos mais diretamente ligados ao homem da motosserra. Os macristas perderam 13 deputados e a UCR, 8.

Os entreguistas argentinos estão em estado de êxtase e buscam exagerar seu sucesso ou o grau de divisão interna do peronismo, aproveitando para enxovalhar Cristina Kirchner. Nas vésperas da eleição, o estado de ânimo era outro nas hostes de Milei, conforme o jornal La Nacion, com ministros anunciando previamente a demissão e planos sobre como reaproximar parlamentares e governadores.

Já os peronistas, dos 47 de 99 mandatos na Câmara que estavam em disputa garantiram todos, mantendo esse total de 99 mandatos.

O agravamento da crise vai chamar a oposição argentina a trabalhar ainda mais pela unidade e contra o entreguismo, a estagnação e o corte de direitos.

Instado a ser o porta-voz do peronismo, na condição de governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof chamou todos os setores do partido a cerrarem fileiras, proclamação feita ao lado do ex-ministro e ex-candidato presidencial Sérgio Massa e do deputado Máximo Kirchner, filho de Cristina.

Ele se concentrou em destacar que, após 7 de setembro, Milei foi aos Estados Unidos “para pedir ajuda e apoio a Trump e aos fundos de investimento. Digo a vocês que nem o governo americano nem o JP Morgan são instituições de caridade; eles vêm para lucrar e colocar nossos recursos em risco”, afirmou.

É natural que os peronistas façam uma reflexão sobre a eleição e, como conclamou Kiciloff, a reverter a derrota nests eleições, através de mais firme unidade das vertentes peronistas e “há que trabalhar para construir una alternativa”. “Há vontade na direção, apesar das dificuldades e problemas a serem superados, para que se posso propor alternativa inovadora e atrativa”.

“Tem muita gente entusiasmada em articular, pensar, obter respostas”, finalizou, “temos que propor coisas mais concretas. Temos que reconstruir a força política e depois lançar o melhor candidato”.

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