Relator do Novo PNE propõe cortar meta de investimento público em Educação

Foto: CSP/Conlutas

Enquanto 28,6% dos jovens de 15 a 17 anos estão fora da escola, relatório no Congresso reduz meta de aplicação de recursos de 10% para 7,5% do PIB

Em discussão na Câmara dos Deputados, a atualização do Plano Nacional de Educação (PNE) para a próxima década coloca em risco conquistas importantes do último período. O relatório apresentado pelo deputado Moses Rodrigues (União Brasil-CE) prevê diminuir a meta de investimento em Educação dos atuais 10% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2035, para 7,5%.

A votação do relatório na Câmara dos Deputados estava prevista para esta quinta-feira (06), mas foi adiada.

Para mascarar o ataque, o deputado federal Moses Rodrigues (União Brasil -CE) argumenta que o investimento chegaria a 11%, pois, além de contar com os 7,5% do PIB com investimento público, também entram na conta outros 3,5% do PIB que supostamente viriam de investimento da iniciativa privada e chamou isso de chegar num número mais “adequado”, considerando a expectativa de queda de matrícula de 43,3 milhões para 40,4 milhões até 2035. Uma redução que não chega a 10%, mas o relator quer cortar 25% da meta de investimento final.

Para Valentina Macedo, presidente da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES-SP), sem o investimento necessário para o desenvolvimento da educação, esse PNE será um fracasso já em sua concepção.

“Reduzir a proposta de investimento para educação nesse novo PNE é um retrocesso sem tamanho, é tirar o compromisso do Estado em garantir uma educação de qualidade. Se entre as próximas metas não houver o investimento necessário para se obter uma educação de qualidade, esse PNE já dará indícios que não terá sucesso”, diz a líder estudantil.

Valentina destaca que as metas do último PNE não foram alcançadas porque foi imposta uma política de austeridade que impediu o Estado de investir nos setores essenciais para entregar dinheiro para o sistema financeiro.

“Grande parte das metas do último PNE não foram sequer alcançadas devido à falta de investimento necessário, que não chegaram nem perto de atingir a meta dos 10% do PIB, em decorrência do Teto de Gastos do Temer e do Arcabouço do ministro Fernando Haddad. Investimento é a chave principal para que os objetivos da educação sejam alcançados”, destacou. 

Valentina considera que “a possibilidade da iniciativa privada entrar na educação como um suposto complemento, é algo extremamente perigoso, pois coloca a educação em uma vitrine como se fosse mercadoria e escancara a tentativa de tirar a responsabilidade do Estado de garantir investimento na educação”.

Valentina Macedo, presidente da UMES – Foto: Reprodução/Alesp

“A educação é responsabilidade do Estado, do governo, e é ele quem tem a responsabilidade de cuidar, investir e garantir a qualidade. A iniciativa privada, que pode entrar como complemento para além dos 10% do PIB, não tem qualquer compromisso no desenvolvimento da educação, mas sim com o lucro. Porque é essa a característica do setor privado, obter lucro. Contar com recursos iniciativa privada na meta do PNE é abrir margem para os tubarões da educação se crescerem, é tirar a educação do interesse público e colocá-la como mercadoria a serviço do  lucro e não como um direito. É desconsiderar seu papel fundamental para o desenvolvimento e soberania do país.”

De acordo com o relatório, a estimativa é de que o valor fique em R$ 280 bilhões, nos próximos 10 anos, dos quais R$ 130 bilhões seriam para zerar deficiências históricas, como analfabetismo, percentual mínimo de pessoas com ensino fundamental e médio, entre outros, e R$ 150 bi para a manutenção da infraestrutura educacional.

Um projeto de Lei foi incluído no PNE, para que os recursos de exploração do Pré-Sal, estimados em R$ 220 bilhões, sejam voltados para educação. “Encontramos um crescimento de recursos de exploração do pré-sal, existe um crescimento que não tem previsão de uso de 2026 em diante e antes que aparecesse um dono estamos amarrando esse recursos extraordinário, que excede o que está já previsto. Só o petróleo atende 80% do que estamos colocando no nosso parecer”, afirmou.

O que Moses não disse é que já há uma lei aprovada que destina os recursos dos Royalties do Petróleo e Gás Natural 75% para a educação e 25% para a saúde, a Lei nº 12.858 de 09 de setembro de 2013.

Vamos deixar a meta em aberto, se não bater a gente corta

Esse parece ser o lema defendido por Moses Rodrigues que alegou em seu relatório que encontrou “um número adequado em percentual e a gente não podia deixar de ter um compromisso com a educação brasileira e repetir um número que vem sendo repetido há muito tempo que é de 10% [do PIB]. Lá atrás, considerada a questão demográfica, talvez se precisasse de 10%, mas com a redução da estimativa de população chegamos a esse percentual”.

A meta 20 do PNE vigente entre 2014 e 2024 visava ampliar o investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do PIB do país no 5º (quinto) ano de vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio. O percentual foi pensado considerando a necessidade do país em sanar problemas históricos, estabelecidos nas outras 19 metas, como a universalização da educação infantil, sua primeira meta, que não foi alcançada.

De acordo com Balança do PNE da Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE) entre os anos de 2015 e 2024, período correspondente à vigência do atual Plano Nacional de Educação, houve uma estagnação do percentual gasto com educação em torno de 5% do PIB. Isso pois, a Emenda Constitucional (EC) 95/2016, o chamado Teto de Gastos do governo Temer, que vigorou por 7 dos 10 anos do Plano, determinou que nenhum investimento nas áreas sociais poderia ser superior ao reajuste inflacionário até 2023. 

Em 2023 o Teto de gastos foi substituído por um Novo Arcabouço Fiscal de Fernando Haddad que, embora menos deletério às políticas sociais, congelou a possibilidade de investimento social e 2,5% acima da inflação, mantendo com o paradigma de austeridade do Teto de Gastos anterior.

“Com a facilidade que o debate sobre finanças públicas tem de tomar estas como um fim em si mesmo, sai de cena o outro lado da moeda, dados da realidade como o de que apenas 27% das escolas possuem salas de recursos multifuncionais; apenas 48% das escolas possuem biblioteca ou sala de leitura; até as salas de professores, da secretaria e da direção são ausentes em parcela considerável das escolas. Os cálculos financeiros baseados no provimento deste e outros insumos básicos existem e dão a chave para que se conheça o custo da austeridade, que se manifesta especialmente em termos de desigualdade social”, disse a Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, em seu balanço .

Enquanto isso, de acordo com levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 28,6% dos jovens de 15 a 17 anos estavam fora da escola em 2024. Inclusive, essa era uma das metas do PNE anterior: Universalizar, até 2016, o atendimento escolar para toda a população de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos e elevar, até o final do período de vigência deste PNE, a taxa líquida de matrículas no ensino médio para 85% (oitenta e cinco por cento).

Meta essa que não foi cumprida no prazo, também não foi cumprida até 2024.

RODRIGO LUCAS

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